Crónica feminina que viaja ao passado e nos faz sorrir

Nuno Rocha tornou a encomenda num projeto pessoal e o resultado pode ser a maior surpresa do cinema português comercial do ano.
Publicado a
Atualizado a

Assim à primeira vista, toda a ideia do projeto desta comédia do fantástico pode remeter para uma aproximação oportunista à série Conta-me como Foi, em que se descrevia como era uma família portuguesa nos anos 1970. Pois bem, puro engano. A Mãe é Que Sabe tem uma alma própria e consegue sem espinhas condensar um retrato de família em três décadas diferentes, os anos 1980, 90 e década presente.

Nuno Rocha tornou uma encomenda da produção num projeto pessoal e o resultado é bem capaz de ser a maior surpresa do cinema português comercial do ano. A prova de que para fazer cinema de comédia mainstream não é preciso imbecilizar o espectador ou inundar o guião de gags com boçalidade ou truques rasteiros de piadola ordinária.

O filme conta a história de uma família lisboeta igual a tantas outras, em que a matriarca, Ana Luísa, regressa ao passado num almoço de família e começa a mudar algumas coisas. Mudanças que trazem consequências para o presente. Uma história sobre os conselhos que as mães dão às filhas e sobre os costumes da classe média portuguesa. Tem um lado Peggy Sue Casou-se (filme de viagens no tempo onde Kathleen Turner voltava ao liceu), de Francis Ford Coppola, mas Rocha está mais interessado na crónica de costumes e na descrição (nada caricatural) de um certo carisma português pintado com alguma candura. Os portugueses de ontem têm uma nostalgia que dá bom entretenimento.

[youtube:zt6BxWIcV-g]

Depois, é terrivelmente engenhosa a forma como se acolhe de peito aberto a proposta de homenagem a uma ideia de cinema americano, neste caso a comédia de género do fantástico (não faltam personagens com avatares...) muito popular nos anos 80. Vê-se que o argumento de Rocha e Roberto Pereira tem aquele carinho da geração de 70 com as marcas cinéfilas (quem cresceu a ver Regresso ao Futuro ou A Mosca vai sorrir com carinho).

A simpatia deste objeto não é imposta nem resultante da sua lógica de leitura acessível. É genuína e acelerada pela direção de atores, em que Manuela Maria, Joana Pais de Brito, Maria João Abreu e Filipa Areosa brilham muito. Crónica feminina de um tipo de mulher portuguesa? Porque não? A certeza é que há sempre uma sobriedade que soa a alívio nos tempos que correm e um bom gosto estético que certos cinéfilos de má-fé vão acusar de "influência publicitária".

O filme estreia-se na quinta-feira e em certos cinemas passa com legendas para espectadores com problemas auditivos.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt