Crise económica vai intensificar conflitos no campo
João Pedro Stedile salientou, numa conferência de imprensa, em São Paulo, que o aumento dos despedimentos e a quebra do poder de compra dos trabalhadores vão aumentar a pressão social pela distribuição de terras por parte do governo.
"As ocupações vão aumentar com a crise, podem escrever", afirmou, ao salientar que o "inimigo principal" do MST passaram a ser as "grandes empresas multinacionais" do sector agrícola que actuam no Brasil.
Stedile avançou que o MST modificou recentemente a sua estratégia, passando a actuar contra as multinacionais do sector, em vez de ocupar grandes propriedades agrícolas improdutivas.
"Ocupar um latifúndio é muito fácil, o problema é mudar o modelo agrícola representado por essas empresas que plantam uma única cultura em grandes extensões de terra", disse.
O líder do MST afirmou que a monocultura para fins de exportação, como a soja, por exemplo, utiliza grandes áreas, destrói a biodiversidade, faz uso de defensivos tóxicos e não cria empregos.
"Esse modelo depende do mercado externo, é predador do meio ambiente. Queremos um modelo que mantenha a diversidade de cultivos, use tecnologias ecológicas e que fixe as pessoas no campo", disse.
Stedile acusou o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, de ter feito um "pacto com as elites" e de ter abandonado a defesa da reforma agrária dos tempos em que era líder da oposição.
"Achávamos que a eleição do Lula (em 2002) e o seu compromisso histórico, a reforma agrária seria levada adiante. Mas as forças maioritárias deste governo estão prioritariamente apoiando as grandes multinacionais", disse.
"O Governo de Lula não é de esquerda nem de direita, é de composição. Ele se elegeu compondo com parte das elites, fez uma espécie de pacto para não mudar a política económica do governo anterior", disse.
Stedile sublinhou que a crise económica diminuiu os investimentos estrangeiros no sector agrícola brasileiro, nomeadamente na produção de biocombustíveis a partir de cana-de-açúcar.
"O acordo diabólico assinado por Lula e Bush, em Março de 2007, previa a construção de 130 fábricas de etanol. Isso tudo está paralisado", afirmou, referindo-se ao programa de cooperação assinado na visita do presidente dos EUA ao Brasil.
"Com a crise, vai haver um freio na expansão das plantações de cana-de-açúcar, o que abre espaço para a implantação de um projecto voltado para a população, não para abastecer automóveis nos EUA, Japão e China", salientou.
Stedile disse ainda que o MST realizará uma série de manifestações esta semana para assinalar o chamado "Massacre de Eldorado de Carajás", um dos mais violentos da história recente do país.
A 17 de Abril de 1996, foram assassinados 19 sem-terra pela polícia, na cidade de Eldorado de Carajás, no Estado do Pará, na região Norte do Brasil.
Depois de 13 anos, o processo judicial ainda continua parado e ninguém está preso.
Criado em 1984 por um grupo de trabalhadores rurais, o MST controla actualmente cerca de 100.000 famílias à espera de um lote de terra do Governo brasileiro.
Em 2007, último dado disponível pelo MST, foram realizadas 183 ocupações de propriedades rurais, em todo o país, número inferior à média de 238 ocupações anuais registadas entre 2003 e 2006.