Crise da dívida ameaça futuro do euro e provoca queda de governos

A crise da dívida soberana atingiu com particular violência a zona euro em 2011, questionando o futuro da moeda única, além de levar à queda de diversos governos, perante as respostas hesitantes e confusas da União Europeia.
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Com 10 anos de vida, o euro, constantemente apontado como uma das grandes conquistas do projeto europeu, viveu em 2011 o ano mais difícil da sua curta existência, fez várias 'vítimas' e expôs diferenças no seio da União, com o eixo Berlim-Paris a insistir em impor a sua vontade e a colocar em causa o "método comunitário" e a autoridade de Bruxelas.

O ano assinala também um evidente 'choque' entre as agências de notação financeira e a zona euro, com as primeiras a castigarem constantemente o que apontam como as fragilidades das economias da 'eurolândia', e Bruxelas a responder já perto do final do ano com uma proposta de regulação destas instituições, para exigir maior transparência.

Foram diversas as cimeiras realizadas durante o ano entre os chefes de Estado e de Governo da União Europeia, ou da zona euro, para alcançar uma resposta convincente, que todavia nunca chegou, levando a que durante 2011 diversos países ficassem sob a mira dos mercados, além de Grécia e Irlanda, que em 2010 tinham recorrido à ajuda externa.

Portugal foi a vítima em 2011, tendo desistido de lutar contra o há muito anunciado pedido de ajuda externa, consumado em maio e acompanhado de eleições antecipadas que viriam a ditar a queda do governo socialista de José Sócrates e a sua substituição por uma coligação PSD/CDS-PP encabeçada por Pedro Passos Coelho.

O pedido de resgate de Portugal, sugerido por muitos parceiros europeus por considerarem que tal travaria a crise e o efeito de contágio a economias de maior dimensão, não teve todavia esse efeito. Logo a seguir os mercados financeiros apontaram as baterias a Itália e Espanha.

A 21 de julho, os líderes da zona euro celebraram uma cimeira na qual acordaram o que classificaram como a resposta abrangente que faltava para travar a crise, e que consistia num reforço e flexibilização do fundo de resgate e de um segundo plano de ajuda à Grécia, partindo de férias com a sensação de que o pior estava ultrapassado.

No entanto, em agosto, os mercados não pouparam a Espanha e, sobretudo, a Itália, que foi anunciando sucessivos planos de austeridades mas sem o efeito tranquilizador desejado, e na 'rentrée' política, em setembro, os líderes europeus encontraram um cenário em nada mais animador, até porque nem uma das decisões acordadas a 21 de julho viu a luz do dia nos meses que seguiram.

Em outubro, Bruxelas assistiu a uma 'maratona' de reuniões e cimeiras, tanto a 17 e a 27, que culminariam numa 'decisiva' -- mais uma -- cimeira da zona euro, concluída já na manhã de dia 27, com um acordo que previa uma recapitalização dos bancos, a chamada alavancagem do fundo europeu de estabilização financeira e de um abandono pelos bancos privados de 50 por cento da dívida pública que detinham sobre a Grécia.

Atenas decidiu, no entanto, reservar uma surpresa aos seus parceiros, com o primeiro-ministro George Papandreou a anunciar a realização de um referendo ao plano de ajuda à Grécia, provocando uma crise política no país com evidentes efeitos no resto da zona euro.

Em novembro, assistiu-se à queda tanto de Papandreou -- substituído por Lucas Papademos à frente de um governo de salvação nacional, mesmo já depois de ter renunciado à ideia de uma consulta popular -- como do primeiro-ministro italiano Sílvio Berlusconi (que renunciou, dando o lugar a Mario Monti) e ainda do chefe de governo espanhol José Luís Rodriguez Zapatero, que já nem se apresentou às eleições antecipadas em Espanha, ganhas pelo PP de Mariano Rajoy.

O ano termina com uma cimeira - mais uma apresentada como a "última oportunidade" para salvar o euro - numa altura em que até os 'rating' de triplo A se encontram ameaçados.

A 09 de dezembro, os líderes europeus chegara a acordo, também aparentemente pouco convincente, sobre o reforço da disciplina orçamental, já que o Reino Unido, isolado, inviabilizou uma revisão dos Tratados, forçando um tratado intergovernamental que dificilmente é a resposta pela qual há tanto os mercados financeiros aguardam.

Falhada mais uma resposta verdadeiramente comunitária, a União e o euro enfrentam, além da crise da dívida soberana, uma crise de identidade e liderança, entre as tentativas da Comissão Europeia liderada por Durão Barroso de dirigir a resposta à crise e a imposição das vontades de Alemanha e França, com dúvidas e diferenças pelo meio sobre que papel deve ser reservado ao Banco Central Europeu e ao Fundo Monetário Internacional, que 2011 não desfez e apenas acentuou.

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