Crianças contratadas para testar produtos com menos açúcar

Colocar produtos mais saudáveis no mercado tem sido um desafio para as empresas, que não querem afastar os consumidores
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É costume dizer-se que as crianças não mentem. E as que fizeram uma prova cega a iogurtes da cadeia de supermercados Albert Heijn, na Holanda, não tiveram dúvidas: a versão com menos açúcar era a melhor.

O teste é apenas um exemplo das medidas que as empresas europeias estão a adotar para vender produtos mais saudáveis. Portugal, Espanha, França, Reino Unido e Holanda são países que têm introduzido impostos como o fat tax, aplicado sobre alimentos nocivos à saúde.

"Se dissermos aos consumidores que um produto tem menos açúcar, eles vão parar de comprar porque acham que o sabor é pior", refere, à Bloomberg, Kate Ewart, responsável de desenvolvimento da maior retalhista britânica, a Tesco. A comunicação das mudanças tem, por isso, de ser feita com todo o cuidado. "Temos de reeducar, lentamente, os gostos dos consumidores. É um desafio constante." Atualmente, os molhos de cozinha já têm menos 18% de açúcar e os cereais de pequeno-almoço uma redução de 9,5%.

Também no Reino Unido, a cadeia de supermercados Sainsbury está a tentar remover o açúcar "em segredo", segundo a nutricionista Julie Dean. A redução foi de 13% na grande maioria dos cereais, 70% na limonada e 30% na bebida de cola. Na Sainsbury, a estratégia tem passado, primeiro, por retirar o máximo de açúcar sem prejudicar gravemente o sabor; depois, experimentam-se vários tipos de ado- çantes para haver um equilíbrio. Ainda assim, podem surgir algumas falhas: "Há sempre um pouco de alterações no início, porque as pessoas são mesmo muito sensíveis, especialmente se consomem os produtos no longo prazo", indica a especialista.

As grandes multinacionais também têm apostado na saúde: a Nestlé recorre à tecnologia para alterar a estrutura do açúcar e torná-lo doce em quantidades mais pequenas; a Coca-Cola e a Pepsi estão a preferir as bebidas menos açucaradas; a Unilever vende gelados Magnum mais pequenos, logo, menos nocivos. Os efeitos das medidas já são visíveis: o crescimento do consumo de açúcar no Reino Unido deverá ficar abaixo da média dos últimos 10 anos (2%). Nos EUA, estima-se a primeira quebra de procura de açúcar em 25 anos.

Na Holanda, as crianças fazem parte do conselho dos provadores de iogurtes, que foi criado pela Albert Heijn para garantir que a reformulação da oferta de produtos não se afasta dos objetivos desta faixa de consumidores. No ano passado, 25 crianças digiram-se aos escritórios da empresa, em Amesterdão, para fazer provas cegas com os tais iogurtes, que foram avaliados, numa escala de um a dez, pelo sabor, cor e textura. "Foi uma espécie de focus group, mas com crianças", referiu a vice-presidente do departamento de sustentabilidade do dono da cadeia, o grupo Ahold Delhaize. "O principal desafio para nós é: será que as pessoas vão continuar a gostar dos produtos?"

Por cá, apenas a Coca-Cola respondeu às questões do DN/DV sobre o assunto, referindo que "não faz qualquer tipo de testes de sabor e que não faz comunicação para menores de 12 anos". A empresa reafirma a sua aposta "na reformulação dos produtos e na introdução de variedades sem adição de açúcar". "Nos últimos 16 anos reduzimos em 23% o aporte de açúcar e calorias por litro do total das nossas vendas", referem.

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