Crianças cabo-verdianas pedem soluções para problemas como prostituição ou trabalho infantil

A prostituição na ilha da Boavista ou o trabalho infantil e o abandono escolar no interior da ilha de Santiago são preocupações das crianças cabo-verdianas, que hoje se reuniram em plenário para pedir soluções aos adultos.
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Cerca de meia centena de crianças dos 22 municípios de Cabo Verde estiveram reunidas hoje, na capital cabo-verdiana, no Parlamento Infantil, evento que assinala o 28.º aniversário da Convenção dos Direitos das Crianças.

Numa iniciativa da agência das Nações Unidas para a infância a(UNICEF), Instituto Cabo-Verdiano de Apoio à Criança, Aldeias Infantis SOS e Presidência da República de Cabo Verde, a sessão debateu a situação atual e a importância de investir nas crianças para cumprir os objetivos da Agenda 2030 em Cabo Verde.

Suilo Tavares, 17 anos, trouxe da ilha da Boavista as preocupações com as crianças que vivem no bairro da Boa Esperança, também conhecido por Barraca, onde moram cerca de 60% dos habitantes da ilha.

"Ali há todos os tipos de problemas. Prostituição infantil, muito trabalho infantil. Falta de urbanização, criminalidade, uso de drogas e álcool por parte dos adolescentes e crianças. As crianças não estudam e vão para a venda ambulante", disse.

Acrescentou que esta é uma realidade que se estende a outras localidades daquela que é uma das ilhas mais turísticas de Cabo Verde e é conhecida de todos, mas para a qual não tem havido solução.

A estes problemas, acrescentou Suilo Tavares, junta-se a falta de iluminação, más condições de habitação e estradas degradadas.

Por isso, o jovem deixou um apelo para que seja encontrada uma "solução urgente" para os "problemas mais relevantes".

Delany Vaz, 13 anos, veio de São Salvador do Mundo, interior da ilha de Santiago, onde, segundo disse, os principais problemas das crianças são o trabalho infantil e o abandono escolar.

"Os deputados e o governo não se importam em resolver os problemas, só fazem promessas. Há muito trabalho infantil, muito abandono escolar e muitas crianças vivem em casas precárias", disse.

Ilária Carnevali, representante da UNICEF em Cabo Verde, sublinhou a importância do "princípio de ouvir" as crianças e jovens nas questões que lhes dizem respeito e a utilidade do parlamento infantil na "criação de espaços que amplifiquem" a sua voz.

A responsável da UNICEF assinalou o "importante caminho" trilhado por Cabo Verde na promoção dos direitos das crianças "e o nível muito bom de proteção legal" atingido nesta matéria.

Reconheceu, contudo, que na aplicação dessa proteção "há ainda um caminho a percorrer".

"A proteção dos direitos das crianças é um caminho que deve continuar a ser percorrido e com força. Temos compromissos muito importantes da parte das autoridades e da sociedade sobre assuntos que dizem respeito à proteção da criança que claramente ainda estão em processo", disse.

Como exemplo, apontou o plano contra o abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes, aprovado no início do ano, considerando tratar-se de um "passo muito importante", mas que requer trabalho de todas as instituições, sociedade civil e comunidades "para a sua implementação completa".

Disse ainda que, sobretudo no âmbito do abuso sexual, existem instrumentos legais que "têm que ser afinados".

"Ainda há caminho para percorrer, mas é um caminho que está a ser percorrido", disse.

A presidente do ICCA, Maria José Alfama, considerou, por seu lado, que Cabo Verde enfrenta vários desafios em matéria de proteção das crianças, apontando a inclusão escolar e o atendimento especializado de saúde às crianças com deficiência, a morosidade da justiça no tratamento de casos relacionados com crianças ou a participação das crianças na família e na escola.

Relativamente à questão dos abusos sexuais a crianças e adolescentes, Maria José Alfama admite que as denúncias têm "aumentado ligeiramente", mas ressalva que é preciso tempo para analisar se corresponde a aumento de casos.

"Há muito essa perceção do aumento de casos e há um reforço de articulação entre as diferentes instituições", disse.

Sobre a implementação do plano de ação contra o abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes, de que fazem parte 17 instituições, Maria José Alfama adiantou que este primeiro ano está a ser "essencialmente de divulgação e de sensibilização".

Da reunião plenária do parlamento infantil, no qual participou apenas uma minoria de deputados à Assembleia Nacional - na maioria deputadas - e não contou com qualquer representante do Governo, saíram cerca de três dezenas de recomendações que espelham as preocupações das crianças.

Pobreza e trabalho infantil, ambiente, educação, modernização tecnológica, igualdade de género, inclusão social de pessoas com deficiência, habitação e participação política das mulheres foram algumas das áreas em que as crianças e adolescentes cabo-verdianos fizeram recomendações.

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