Criação de emprego cada vez mais fraca limita efeitos de aumentos salariais

Comissário da Economia avisou que, na Europa, setores como "indústria, turismo e viagens" estão especialmente vulneráveis à crise do coronavírus. Problemas podem chegar rapidamente a Portugal.
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A criação de emprego está a enfraquecer e isso "limita" o efeito dos aumentos salariais na evolução dos custos da economia portuguesa, alerta um novo estudo da Comissão Europeia. Nas previsões de inverno, divulgadas na quinta-feira, Bruxelas manteve (em relação ao outono, há três meses) o crescimento previsto para este ano em Portugal em 1,7%. No entanto, este ritmo fica duas décimas abaixo da hipótese de expansão económica na qual assenta o Orçamento do Estado deste ano. Em dezembro, o ministro das Finanças, Mário Centeno, inscreveu uma previsão na ordem de 1,9% em 2020 para o crescimento do produto interno bruto (PIB).

O crescimento em 2019, que nesta sexta-feira o Instituto Nacional de Estatística confirmará na sua primeira estimativa, deverá ter ficado em 2%. Portanto, segundo reitera agora Bruxelas, Portugal deve desacelerar 0,3 pontos percentuais neste ano. Estas previsões intercalares não trazem atualizações para o saldo orçamental nem para o desemprego, mas Bruxelas traça um quadro de uma economia com várias fragilidades a ganhar terreno. Isso nota-se na inflação, que em 2019 terá virtualmente estagnado nos 0,3%.

A inflação baixa ajuda o poder de compra dos salários e das pensões, mas também reflete uma compressão nas margens das empresas.

"A inflação caiu de 1,2% em 2018 para 0,3% em 2019, ficando significativamente abaixo da média da zona euro", começa por referir o executivo comunitário. "Isso refletiu a queda nos preços da energia, incluindo flutuações nos preços do petróleo, mas também várias mudanças regulatórias que afetaram as contas da energia elétrica."

Além disso, diz a Comissão, "a inflação foi atenuada pelos preços das atividades relacionadas com o turismo, principalmente o alojamento", e também por "outras restrições regulatórias ao nível dos preços de transportes públicos, educação e telecomunicações".

E mais. Em 2019, "os preços das casas continuaram a crescer a um ritmo elevado, de cerca de 10%", quatro vezes mais do que o crescimento dos salários nominais por trabalhador, que Bruxelas estima ter sido na ordem dos "3% em 2019".

O impacto deste aumento salariais na inflação, no nível de custos da economia como um todo, "permaneceu limitado devido à desaceleração do emprego". De facto, no ano passado, o emprego cresceu apenas 1%, o registo mais fraco desde a grave crise de 2013, altura em que caiu 2,6%, segundo as estimativas oficiais recentes do INE.

Comissário da Economia teme pela saúde da indústria e do turismo

Na quinta-feira, o comissário europeu da Economia, na apresentação das novas previsões, avisou que teremos pela frente anos de "crescimento ténue" e que no caso do coronavírus "é demasiado cedo para avaliar em que medida terá um impacto económico negativo". Mas deixou um aviso sério à navegação: setores como "indústria transformadora, turismo e viagens" são os mais vulneráveis, dependendo do tempo que durar este problema.

Este perfil de contaminação à economia real afetará diretamente uma economia como Portugal, tendo em conta a importância crescente do turismo no emprego e na atividade em geral, designadamente na dinâmica de construção e no valor do imobiliário. Que, diz a Comissão Europeia, até já estará a corrigir dos picos dos últimos anos.

FMI. Novo vírus ameaça mais: China vale o dobro em relação a 2003

Kristalina Georgieva, a nova diretora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), referiu-se ao problema com outro prisma. Em 2003, quando houve a outra gripe asiática (SARS), a China, que é o epicentro no novo coronavírus, pesava apenas 8% na economia mundial. Hoje vale mais do dobro, cerca de 19%, por isso o problema ou a ameaça são bem mais graves.

Além disso, a China também se tornou um parceiro económico de proa de Portugal, com fortes participações em várias grandes empresas-chave e como fonte de receitas, caso do turismo, por exemplo. "A China era diferente", tinha menos na economia mundial, e com isso "o mundo era diferente", disse Georgieva.

Por isso, o novo vírus "afeta claramente e de forma mais dura a atividade económica" e isto é amplificado pelo facto de "a economia mundial estar hoje mais fraca" do que em 2003, avisou a chefe do FMI.

jornalista do Dinheiro Vivo

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