Costinha, o alfaiate holandês e o Porsche sacrificado aos buracos

O director desportivo do Sporting já vestia muito bem quando o empresário Jorge Mendes o recomendou ao Mónaco, mas foi no principado que refinou a elegância, o gosto por filmes, bons vinhos e grandes amizades.
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Costinha veste de forma excêntrica, mas nos antípodas de Abel Xavier, um outro moderninho do futebol português. De onde lhe vem o gosto é talvez difícil de explicar, mas sabe-se que o apego aos clássicos da alfaiataria é antigo. O que torna ainda mais inexplicável o gosto por fatos completos e de excelente corte do novo director desportivo do Sporting.

As origens de Costinha, nascido no bairro de Chelas, em Lisboa, são humildes mas não há registos de pobreza, apenas do remedeio comum a muitas famílias portuguesas. O início da carreira deste filho de taxista em clubes como o Oriental, o Machico ou o Nacional, ao tempo emblemas da II Divisão B, não rendeu mundos e fundos, mas o antigo médio gostava mais de conforto e de sinais interiores de riqueza do que de carros de alta cilindrada e vistosos, pelo que costumava dizer aos amigos que «ganhava muito bem», para os gastos: sobretudo em roupa e peças de decoração para a casa.

Deixando de lado os porquês, fiquemo-nos pelos contornos do que se poderia chamar um gosto globalmente elegante. Costinha gosta de fatos completos – manda-os fazer num alfaiate holandês, que conheceu no Mónaco e de quem ficou cliente fiel; gosta de bons vinhos – chegou a frequentar um curso de enologia mas gosta de aconselhar-se nas compras com um amigo portuense; gosta de cinema – subscreve um programa de fidelização que lhe permite receber as produções norte-americanas em simultâneo com as antestreias nos EUA; gosta de música – assume automaticamente a função de DJ em todas as deslocações e estágios das equipas por onde passou como médio de excelência; e gosta de carros performantes.

Comece-se pelos carros: quando chegou ao Mónaco, aos 22 anos, saído de Portugal sem nunca ter jogado num grande emblema e depois de ter recusado contrato com um Valência onde o então treinador Jorge Valdano tivera a franqueza de lhe dizer que não o queria (porque era apenas uma contratação do presidente), Costinha demorou seis meses a comprar carro.

Quando chegou ao Porto, depois de se ter sagrado campeão francês e ter encontrado no principado o ambiente e os meios para refinar os seus gostos, Costinha andou com o seu Porsche Carrera pouco mais de um mês. O percurso entre Leça, onde morava, e as instalações do FC Porto na Invicta era um tapete de buracos onde a saia da frente da máquina passava a vida a quebrar-se. Sem piso adequado à bomba, trocou de marca e comprou um Lamborghini amarelo, para juntar à carrinha familiar que guardava na garagem.

Os vinhos, bebe-os mais à francesa do que à grande, diz quem o conhece. Apreciador de boas colheitas, confessa que a sua bebida de eleição é mesmo o champanhe e em ocasiões especiais não hesitava – mesmo no tempo do escudo – em encomendar as suas marcas preferidas na terra de origem. Para os tintos e brancos socorre-se dos conhecimentos próprios e de conselhos de amigos enólogos.

Os tempos livres do actual director desportivo do Sporting são investidos a enriquecer os apurados conhecimentos cinéfilos. Costinha devora tudo o que é filme, gosta de estar up to date com os grandes lançamentos mundiais e, como pode, dá-se a pequenos luxos como receber em casa as cópias das antestreias dos grandes estúdios e produtoras. Cópias legais, sublinhe-se, que Costinha detesta pirataria.


Regressa-se então aos fatos. São a indumentária preferida de Costinha, que mesmo nas raras fotos na casa de família – a mulher, com quem casou já estava no Mónaco, é a discrição em figura de gente – aparece de calças e camisa, embora sem gravata. Reza a lenda que os dirigentes do Mónaco que ficaram de ir buscar Costinha ao aeroporto, para levar o reforço ao novo clube, ligaram ao empresário Jorge Mendes – que o descobriu meio incógnito na Madeira – a queixar-se de que o pupilo não aparecera. Claro que Costinha estava lá, estava era impecavelmente vestido de fato e gravata, enquanto os funcionários do clube esperavam mais um futebolista de jeans-sapatilhas-e-boné, que ainda hoje é a farda oficial dos atletas em viagem.

O gosto pela elegância clássica de Costinha valeu-lhe a alcunha de «Ministro», dada pelo colega de equipa Henry, craque que hoje joga no Barcelona, para sublinhar a excentricidade do português que se apresentava nos treinos com pinta de executivo da alta-finança ou político, o que vem a dar quase no mesmo.

O Mónaco, aliás, não é a origem, mas é claramente um divisor de águas na vida profissional – de mais um jogador da II B transformou-se em campeão francês e internacional português – e na vida pessoal de Costinha. Ao fim de poucos meses no principado, avisou a então namorada de que o melhor era ela emigrar também e casarem, porque amor à distância não ia dar certo, com tanta mulher bonita tão próxima.

Encontrou no Mónaco as lojas, as amizades, as festas que lhe permitiram refinar e alimentar os seus gostos e conheceu – hélas! – o seu alfaiate de eleição. Costinha gosta de Gucci, gosta de Yves Saint Laurent, gosta dessas coisas que o dinheiro sabe comprar. Mas gosta sobretudo do alfaiate holandês cuja identidade preserva, mas a quem encomenda os fatos de três peças que moram nos seus closets e lhe dão o ar distinto que se conhece.

Lisboa e Mónaco na rota

Ao longo da carreira que o trouxe de volta a Portugal (para o FC Porto), que o levou para  Moscovo (Dínamo), Madrid (Atlético) e Bérgamo (Atalanta), Costinha viajou muito mas nunca se esqueceu de incluir na rota duas cidades: Lisboa, onde se mantém a família e onde estão as suas raízes, e o Mónaco, onde estão muitos amigos, um estilo de vida que o cativa e onde o seu nome deixou saudades. Uma prova tiveram-na dois jornalistas que acompanharam uma passagem do FC Porto pelo principado. A desoras, apresentaram-se à porta de um famoso restaurante, cruzaram-se com um dirigente portista e alguns empresários que se espremiam num almoço na esplanada e entraram na conceituada sala – onde até à família real monegasca se aconselha a fazer reserva –, para ocuparem dois lugares bem situados. Costinha, amigo de ambos, ligara para o restaurante a avisar que eles iam...

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