Corrupção aumentou na pandemia. Empresários e políticos em xeque

Instituto de Ciências Sociais quis conhecer a perceção dos portugueses sobre a corrupção. E ficou a saber, por exemplo, que as pessoas não estão disponíveis para denunciar casos.
Publicado a
Atualizado a

Os portugueses estão pouco ou nada disponíveis para denunciar casos de corrupção de que tomem conhecimento, porque "não compensa o tempo e os custos" e "as denúncias nunca resultam em nada". Ao mesmo tempo acham que a pandemia potenciou as hipóteses de existir corrupção e que os mundos empresarial e político são aqueles onde prevalecem os maiores índices de situações menos claras. E quando se fala neste tema as três palavras que rapidamente dizem são: política, roubar e dinheiro.

Estas foram algumas das conclusões a que os investigadores do Instituto de Ciências Sociais (ICS) chegaram após analisarem as respostas ao estudo de opinião "O que pensam os portugueses sobre a corrupção: perceções, atitudes, práticas".

As conclusões do trabalho, a que o DN teve acesso, permitem perceber que 53% dos inquiridos consideram que a corrupção aumentou em Portugal, opinião que mereceu mais destaque entre as mulheres e pessoas que se declararam politicamente de esquerda e com níveis de rendimento e instrução intermédios.

Por outro lado, a maior parte das respostas ao inquérito foram no sentido de achar que a pandemia fez aumentar a oportunidade para a corrupção. Neste particular, são os homens, e com afinidade política mais à direita e com instrução e rendimentos elevados, a defender esta ideia.

Neste trabalho, coordenado pelos investigadores Luís de Sousa e Pedro Magalhães, foi perguntado qual a explicação para que as pessoas votem em políticos envolvidos em casos de corrupção. E as respostas foram seis: "mesma cor política", "descrença na justiça", "rouba mas faz", "gratidão", "todos corruptos" e "integridade não é prioridade".

Ainda em relação aos políticos, esta é a palavra mais citada em resposta à pergunta: "Pensando no nosso país, quando ouve falar de corrupção, que palavras associa a esse assunto?"

A situação de exceção que Portugal enfrentou na resposta à pandemia provocada pelo SARS-CoV-2 que levou ao agilizar de muitas das práticas de controlo e fiscalização na aquisição de bens e serviços para responder a essa crise sanitária é encarada com muitas cautelas por parte dos inquiridos neste trabalho. E poderá ser esse um dos motivos para o aumento da perceção de que a corrupção aumentou no último ano. Neste ponto, 53% dos inquiridos mostraram essa opinião enquanto 33% acham que se manteve na mesma. As mulheres posicionadas na esquerda política, com nível de instrução obrigatório e com um rendimento familiar na ordem dos 1560 euros foram as que mais expressaram essa ideia, de acordo com o estudo.

Outra das conclusões deste trabalho do ICS - inserido no projeto EPOCA: corrupção e crise económica, financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia - é o facto de as pessoas reconhecerem que a oferta de subornos, presentes e troca de favores a funcionários públicos ajudou a resolver um problema ou a desbloquear uma decisão a uma pessoa conhecida (18%).

Por outro lado, só um pequeno grupo (7%) reconheceu que um funcionário público lhe pediu ou deu a entender que queria presentes ou favores em troca de serviço ou pediu um suborno.

Para a grande maioria das pessoas ouvidas (73%) a sua vida não foi "nem mais nem menos" afetada pela corrupção. Há, todavia, 22% dos inquiridos que responderam ter a sua vida sido mais afetada.

Uma certeza deixada por este inquérito é que a decisão de apresentar uma queixa envolvendo um caso de corrupção é muito difícil de acontecer. De acordo com o documento consultado pelo DN, apenas 1% dos 1020 inquiridos reconheceu que "denunciaria sempre um caso de corrupção". Uma larga parte, 33%, disse que não faria denúncia, pois "nunca resultam em nada", já 17% acham que "não compensa o tempo e os custos". Em termos regionais, as pessoas do Norte do país foram aquelas que mais razões apresentaram para não reportar casos que conhecessem.

Este estudo de opinião foi constituído pelos indivíduos, de ambos os sexos, dos 18 aos 75 anos e residentes em Portugal continental e Regiões Autónomas. A amostra foi estratificada por região (NUTSII) e habitat (cinco estratos), proporcional à população residente em cada estrato. A amostra é representativa da população portuguesa para as variáveis de género, idade, instru- ção, região e habitat. A fonte do universo para o estabelecimento de quotas para a amostra foi o Censos 2011 do INE. Os respondentes foram selecionados através do método de quotas, com base numa matriz que cruzou as variáveis sexo, idade, instrução, região e habitat/ dimensão dos agregados populacionais. A amostra foi constituída por 1020 entrevistas, com a seguinte distribuição proporcional por região NUTS II: Norte, 353; Centro, 220; Lisboa, 282; Alentejo, 72; Algarve, 43; Açores, 25, e Madeira, 25. A informação foi recolhida através de entrevista direta e pessoal na residência dos inquiridos, em total privacidade, em sistema CAPI, com base em questionário elaborado pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS-ULisboa). Os trabalhos de campo decorreram entre os dias 19 de dezembro de 2020 e 21 de abril de 2021 e foram realizados por 36 entrevistadores, que receberam formação adequada às especificidades do estudo.

cferro@dn.pt

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt