"Continuo a ser crítico de Passos. Não mudei de opinião em nada"
Foi crítico da governação de Passos Coelho...
Continuo a ser! E não mudei de opinião em nada [riso].
Prefere Vítor Gaspar ou Mário Centeno?
Prefiro Gaspar, claro. Estão os dois em circunstâncias muito diferentes, mas Mário Centeno tem muito pouca liberdade em relação ao calendário eleitoral do PS e isso faz dele, obviamente, um ministro das Finanças menos livre e menos útil.
E é refém do PCP e do BE?
Olho para Mário Centeno com alguma condescendência, lembra-me sempre um discurso caridoso do atual Presidente, quando era professor da Universidade de Direito de Lisboa, e dizia de um reitor que o seu mandato se tinha caracterizado pelo desejo de acertar.
Concorda então com Passos quando diz que a estratégia do governo está toda errada?
O primeiro-ministro deu esta semana uma entrevista a dizer que o que juntava o governo era o pragmatismo. Este governo quer iludir-nos fazendo crer que fez na Europa a síntese que ninguém conseguiu entre a social-democracia e o marxismo para salvar esta democracia. Não fez nada disso, o que os junta, como diz o Sérgio Sousa Pinto, é impedir Passos Coelho, que ganhou as eleições, de governar. Se não há ideologia e há pragmatismo tem de haver resultado. Quando Mário Centeno à frente dos economistas do PS apresentou um programa que previa 2, 4% mínimos de crescimento e hoje se passarmos 1% já não vai ser mau... Agora quando se anuncia que o BCE pode iniciar um programa de desmame de compra de dívida pública, eu pergunto: como vamos fazer a seguir com uma taxa de crescimento de 1%? Temos todos os dias a discussão sobre um imposto novo porque isto está a falhar.
Mas não é dos que pensa que podemos voltar a cair numa situação de incumprimento?
Nós não vamos ter um segundo resgate porque a Europa se pode neste momento permitir um segundo resgate.
Essa análise parece dar razão total ao que Passos fez no governo...
Há uma coisa neste governo que mudou e que acho positiva. Não aceitamos tudo o que vem de Bruxelas sem discussão.
Concorda com o imposto sobre os imóveis chamados de "luxo"?
A haver proposta justa de tributação de patrimónios elevados tinha de ser a do PCP, incluir tanto património imobiliário como mobiliário. Claro que este último é mais difícil de tributar e o governo diz que quer atrair investimento estrangeiro e não quer taxar o capital. Manifestamente não vive neste país porque boa parte do investimento estrangeiro tem sido no imobiliário.
Sente-se irritado como discurso de Mariana Mortágua?
Vivemos num país difícil, com muitas pessoas pobres, e portanto é fácil fazer discursos demagógicos. Quando vi aquela declaração do "temos de perder a vergonha de ir buscar a quem está a acumular" percebi a facilidade com que esse discurso responde ao que quem está a sofrer precisa.
A dita classe média não se sente mais confortável com este modo de governar do PS?
Os funcionários públicos tiveram os seus rendimentos repostos. Não vão ter aumento salarial e esse objetivo do governo até se reflete nas sondagens. Acho que as pessoas têm consciência que estamos a saltitar à beira do precipício.
Criticou o facto de o PSD não ter apresentado propostas para debate do OE de 2016. Para o de 2017 parece que a situação se vai repetir...
Acho o mesmo que achava no congresso.
É um erro?
Em geral a alternativa tem de se perceber.
E está a perceber-se?
Ainda não se percebe muito bem.
Em que é que Passos está a falhar?
Estarei com certeza no próximo congresso a dar a minha opinião.
Ficou desiludido com Durão Barroso quando abandonado o governo em 2004. Sente-se agora ainda mais desiludido com a passagem da Comissão Europeia para a Goldman Sachs?
Quando a gente se desilude perde as ilusões, não é? O dr. Durão Barroso fez mal, mas agora toda a gente aproveita para fazer dele um diabo que ele também não é. Fez mal em ter escolhido em particular uma instituição financeira, que não sendo um cartel da droga, também não é propriamente uma associação de benfeitores e tem um histórico na Europa ao qual ele não se devia ter associado.
A eleição de Guterres para a ONU mostra que somos mais sucedidos lá fora do que cá dentro?
Boa parte do insucesso de António Guterres como primeiro-ministro estão diretamente ligadas ao sucesso nesta candidatura. A capacidade de ouvir todos e não decidir antes disso pode ser má para primeiro-ministro, mas é boa para secretário-geral das Nações Unidas.
Marcelo tem sido um fator de união ou um seguro de vida para Costa?
É um fator de união e tem sabido subliminarmente dar todos os recados que são precisos. O Presidente quis que este governo de maioria parlamentar, manta de retalhos, não tivesse desculpas para não apresentar resultados.