Contestação social em França

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A França está a viver mais um movimento de contestação so- cial. Ontem, contra o CPE (contrato primeiro emprego, 2006), hoje, por causa do novo sistema de reformas, que aumenta a idade mínima de reforma de 60 para 62 anos e a idade para a reforma integral de 65 para 67 anos.

Para muitos, trata-se de mais uma luta contra a diminuição do Estado-Providência, num decénio durante o qual o serviço público sofreu de um reequacionamento dos seus meios e objectivos. Assim, a França, dos últimos países na Europa a defender ainda com tanta força um sistema de forte assistência social, dá o sentimento de não querer enfrentar a realidade dos factos, dos números, quando a Alemanha reforma e a Grã-Bretanha anuncia um corte radical nas despesas e prestações.

Este reflexo francês, esta "excepção sociocultural" deve, no entanto, no caso deste movimento social, ser compreendido como o resultado de uma evidente falta de comunicação por parte do Presidente Sarkozy e do Governo de François Fillon. Uma vontade de "passar em força" confirmando um hábito, uma forma de governação bem particular ao actual Presidente francês.

Assim, segundo as últimas sondagens, uma maioria de franceses aprova a mobilização e considere a reforma inevitável. E os sindicatos apontam sobretudo as "injustiças" desta lei apelando a uma verdadeira concertação que devia ter ocorrido no início do processo legislativo. Dai manterem uma pressão com acções nacionais e mobilizações recordes, apelando a dois novos dias de luta. A forma de lidar com esta importante modificação está a ser mais criticada que o fundo da lei agora votada também pelo Senado francês.

Opõem-se assim duas realidades. Por um lado, a obrigação que o Governo tem em não recuar, essencialmente por razões políticas a pensar já nas próximas eleições presidenciais de 2012, e a pressão dos mercados que querem ver uma redução dos défices públicos. Do outro, a obrigação dos sindicatos de lutar com firmeza pela modificação de certos aspectos desta lei (penibilidade, maternidade...) que temem ficarem ultrapassados, com uma radicalização do movimento, sobretudo depois da entrada dos jovens e de certas corporações.

Mais dos que os bloqueios das refinarias ou a perturbação nos transportes, sobressai o sentimento de uma fractura entre o Governo e a sociedade civil, de uma arrogância no tratamento de uma medida que afecta todas as camadas da população na sua dimensão social mas também ideológica tratando-se de um símbolo das conquistas sociais do século XX. É esse também o sentimento dos portugueses radicados em França, dos quais mais de 200 000 chegam à idade da reforma nos próximos dez anos.

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