Conhecer riscos dos 'piercings' dá responsabilidade
Na sexta-feira dia 14, o PS apresentou uma proposta de lei que proibia a realização de piercings, tatuagens e maquilhagem permanente a menores de 18 anos, vedando ainda a qualquer indivíduo a colocação de piercings na língua. Esta semana, porém, os socialistas admitiram a possibilidade de amenizar algumas restrições, como a redução da fasquia para os 16 anos. Osvaldo Correia, secretário-geral da Associação Portuguesa de Cancro Cutâneo e membro da Associação Portuguesa de Dermatologia e Venereologia explica o risco destes actos e porque concorda com a proposta de lei.
O PS avançou com uma proposta que visa limitar e regular a realização de 'piercings' e tatuagens, especialmente a menores. Qual a importância destas medidas?
Saúde. Proteger a saúde dos cidadãos e sobretudo dos jovens. Estas práticas podem estar associadas a doenças e alergias. A utilização de agulhas, por exemplo, pode estar associada à transmissão de doenças como a hepatite B, C ou HIV, transmissíveis através do sangue, mas também várias doenças de pele. Osvaldo Correia concorda com a generalidade das propostas feitas pelo grupo parlamentar do PS, visto que esta actividade era ainda pouco regulada no País. A maior parte dos problemas, admite, está na falta de fiscalização dos locais que as realizam. "Estas práticas têm grandes riscos. E são maiores sobretudo entre adolescentes. Não temos de os expor a riscos desnecessários".
Quais as áreas do corpo mais visadas por esta proposta?
O documento poderá ser alterado, havendo já essa intenção. No entanto, fica proibida a realização de piercings na língua (boca) e em zonas do corpo na proximidade de músculos, vasos sanguíneos e nervos. Quer isto dizer, à partida, que os genitais, sobrancelhas, umbigo e nariz ficam de fora do leque de possibilidades. Dias depois de ter apresentado a proposta inicial, os socialistas admitiram que era possível haver um recuo quanto à colocação de piercings na língua e quanto à idade, apesar de os adolescentes necessitarem de autorização dos pais. Quando forem realizados piercings ou tatuagens que não estejam previstos na lei, os estabelecimentos podem incorrer em sanções, mas nunca os visados.
Mesmo que a prática continue, é importante que as pessoas conheçam os riscos destas alterações estéticas. A obrigatoriedade de ser informado e de assumir a responsabilidade destes actos poderá corrigir esta lacuna?
Osvaldo Correia acredita que esta medida é fundamental na informação e responsabilização. "Os jovens , por exemplo, têm de ficar a saber que há zonas do corpo onde o risco é maior, nomeadamente cartilagens, estruturas novas, nariz, língua ou mucosas", avança o dermatologista. Caso a proibição nestas zonas do corpo não avance, o PS sugere que os estabelecimentos vão ter de informar os utilizadores de todas as consequências deste acto e, no caso de manterem a sua intenção, vão ter de assumir a responsabilidade. Os estabelecimentos têm de cumprir alguns procedimentos técnicos e utilizar material previsto por lei na realização de piercings. Quanto às tatuagens, apenas podem ser utilizadas agulhas descartáveis, esterilizadas e de uso único.
Quais os principais riscos comuns às tatuagens e 'piercings'?
Os problemas associados a estas práticas são de ordem alérgica e infecciosa, de acordo com Osvaldo Correia. Uma infecção depende sobretudo dos cuidados com a higiene pessoal de quem é tatuado ou perfurado e de quem executa, sendo essencial a esterilização do material usado. As hemorragias podem ocorrer em ambos os casos se se atingir um vaso sanguíneo. Nos genitais podem surgir lesões
vasculares, bem como noutras regiões mais sensíveis.
Os 'piercings' têm consequências diferentes relacionadas com a introdução de metais?
O dermatologista avança que grande percentagem da população é ou virá a ser alérgica aos metais. Perto de 20% dos portugueses já teve alergias a metais. Por isso, quanto mais cedo for feito um piercing e quanto mais vezes o fizerem, maior o risco de desenvolver uma alergia. A alimentação poderá, a par da colocação de acessórios de metal, potenciar o agravamento do problema, porque há muitos alimentos que contêm níquel ou crómio, como o milho, espinafres, tomate ou chocolate, esclarece o especialista. Na boca ou no nariz, exemplifica Osvaldo Correia, é possível que surja um quadro de alergia respiratória. Existe ainda o risco de aparecimento de quelóides, que não são mais do que cicatrizes grossas semelhantes às que ficam após uma cirurgia. O tratamento é difícil e demorado.
Nas tatuagens há risco de infecção. Mas qual é exactamente o papel das tintas e corantes utilizados?
As tintas persistem no organismo "e não é de excluir a sua persistência durante muito tempo, o que significa que podem ter potencial oncogénico", ou seja, cancerígeno. Estão a ser realizados estudos a nível internacional para tentar provar esta associação. As tintas podem ser drenadas e ir para os gânglios, por isso a utilização de algumas já foi banida em alguns países. Os corantes surgem frequentemente associados a alergias. As cores escuras e os vermelhos podem acarretar mais problemas por terem uma substância - a parafenilenodiamina - ligada a eczemas.
As tintas também devem ser objecto de lei?
O dermatologista é da opinião que se devia regular a utilização de algumas tintas, prejudiciais sobretudo quando cobrem extensões cada vez maiores de pele e quando são combinadas com colorações de cabelo. "Tem de haver um quadro legislativo para isso e esperemos que a investigação traga tintas com menos risco de alergia e menor potencial oncogénico", conclui. |