Conflitos étnicos em Portugal

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Há meio século, a sociedade portuguesa era quase homogénea sob o ponto de vista étnico. É claro que esta situação era produto de uma longa história pontuada por conflitos étnicos. Em meados do século 20, porém, tudo isso pertencia ao passado, apenas recordado nalguns ditos populares sobre mouros e judeus, que, entretanto, não apontavam discriminatoriamente para ninguém em particular.

Tudo mudou a partir dos anos 70 do século 20. A fraca natalidade e o desenvolvimento económico tornaram Portugal uma terra atractiva para imigrantes. E isso gerou três fluxos significativos de imigração. Um deles correspondeu ao retorno, mais ou menos espontâneo, de emigrantes portugueses de diferentes gerações. Outro correspondeu à imigração oriunda de países não europeus de língua portuguesa (sobretudo Angola, Brasil e Cabo Verde). Um último correspondeu à imigração oriunda da Europa oriental (sobretudo Roménia, Moldávia e Ucrânia). A sociedade portuguesa tornou-se, assim, multiétnica e multicultural num grau desconhecido há muitos séculos.

Vários factores têm permitido que este processo não tenha até agora suscitado problemas sociais particularmente graves. Um deles é a sua indubitável vantagem económica para o País. Outro é a aculturação relativamente facilitada pela semelhança frequente da língua e cultura dos imigrantes em relação aos padrões dominantes na sociedade portuguesa.

Nada garante, porém, que o futuro não possa reservar situações menos favoráveis. Isso poderá resultar de três factores. Um puramente quantitativo. Os imigrantes ainda são apenas cerca de um vigésimo da população portuguesa e um pouco mais de um décimo das regiões onde a sua concentração é maior. Números muito maiores poderão suscitar problemas simplesmente por um efeito de dimensão. Outro resultante do grau de heterogeneidade. Extensão dos fluxos imigratórios para origens com características culturais menos parecidas com as dominantes na sociedade portuguesa pode tornar bem menos fácil a integração de novos imigrantes. Finalmente, um ligado à situação económica. Apesar de todas as dificuldades existentes, o desemprego em Portugal mantém-se em níveis abaixo da média europeia e suportáveis pela sociedade. Um eventual agravamento pode complicar as coisas, suscitando, por exemplo, reacções xenófobas mais radicais.

Só será possível evitar estes riscos com uma difícil combinação de controlo dos movimentos migratórios e difusão de uma atitude de abertura cultural na sociedade portuguesa. Combinação difícil, mas necessária para que não venha a agravar-se mais um problema dos que existem na nossa sociedade. C

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