Concorrência e Apetro contra fixação de margens máximas nos combustíveis
A Autoridade da Concorrência (AdC) e a Associação Portuguesa de Empresas Petrolíferas (Apetro) alertaram na quarta-feira o parlamento para os riscos de distorção da concorrência que a fixação de tetos máximos de margens para os combustíveis suscitam.
Numa audição na Comissão de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território (CAEOT), que contou também com a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) e a Entidade Nacional para o Setor Energético (ENSE), a AdC e a Apetro foram as entidades mais críticas à proposta de lei n.º 109/XIV/2.º, que cria a possibilidade de fixação de margens máximas de comercialização para os combustíveis simples. A Apetro defendeu a "inutilidade" e "incoerência" da proposta e a AdC reiterou que a medida gera incertezas e "parece excluir gamas de combustíveis de aditivação suplementar".
Sem afirmar claramente se se opõe à proposta de lei, Ana Sofia Rodrigues, diretora do Gabinete de Estudos e Acompanhamento de Mercados da AdC, apontou que os operadores, sobretudo as empresas mais pequenas, podem vir a enfrentar dificuldades em recuperar custos operacionais, o que comprometeria a capilaridade do abastecimento de serviços. "A Autoridade da Concorrência destacou - desde há muito tempo tem vindo a destacar - os problemas de concorrência que identifica neste mercado: uma concentração ao nível da refinação e uma concentração ao nível do armazenamento", disse.
Para a AdC, a resolução desse problema passa não pela imposição de limites nas margens, mas por "medidas alternativas para promover a concorrência, nos referidos mercados, em particular, promovendo o acesso às estruturas logísticas - conclusões reforçadas pela ERSE no relatório de 2020 - e o acesso a essas infraestruturas". Aliás, esta é uma recomendação antiga da Concorrência que, hoje, relembrou que embora tal tenha sido implementada do ponto de vista legislativo, "não está a acorrer nas condições que a AdC recomendou".
A Apetro, por sua vez, destacou mesmo que da proposta em causa "ressalta a inutilidade da lei e a incoerência de tentar controlar os preços atuando no menor dos seus componentes". O secretário-geral da Apetro, António Comprido, alegou que a análise que serviu de base para a proposta em causa "incidiu sobre um período atípico de quebras de consumo que, obviamente, levaram ao incremento de custos fixos". "É uma análise estatística pura, sem ter em conta a especificidade do período em análise, transmite uma imagem errada do funcionamento do setor", afirmou.
António Comprido criticou a medida argumentando, ainda, que a AdC "nunca propôs soluções de intervenção pública que se sobrepusessem aos princípios da livre economia de mercado". "Não temos uma opinião favorável sobre esta medida, considerando-a negativa e absolutamente desnecessária", sublinhou.
Reiterando que a "potencial intervenção administrativa no mercado livre e concorrencial pode ter efeitos negativos em termos de diferenciação e oferta dos operadores, prejudicando os consumidores que veem a sua escolha limitada [posição idêntica foi tida pela AdC]", António Cumprido insistiu que a medida em debate poderá "afetar a já de si baixa rentabilidade do setor a nível grossista e retalhista, podendo pôr em causa a sobrevivência dos mais frágeis".
O presidente do conselho de administração da ENSE, Filipe Meirinho, lembrou que a proposta de lei nasceu num cenário de crise pandémica, admitindo que "importa balizar opções em cenários de crise". Por isso, defendeu a limitação das margens para as gasolineiras e petrolíferas, para que se evitem "aumentos injustificados" nos preços dos combustíveis em "situações excecionais".
A ERSE, por sua vez, apelou a que "as políticas públicas e a fiscalidade devem ser calibradas num contexto de transição energética", não devendo "ser tomadas decisões que contribuam para dar passos atrás neste caminho". Para Pedro Verdelho, recentemente nomeado presidente da entidade, o problema da estrutura dos preços dos combustíveis está na carga fiscal, desvalorizando a necessidade de uma intervenção a nível de preços administrativos.
A proposta de lei em causa foi apresentada pelo governo, tendo sido aprovada, na generalidade, no parlamento, com os votos contra de CDS-PP, Chega e Iniciativa Liberal e a abstenção de PSD, em 17 de setembro. O diploma baixou à CAEOT, que ouviu ontem os pareceres pedidos. Está prevista uma reunião nesta quinta-feira, às 13h30, para a votação do texto final do diploma.