Com a terceira maior economia mundial construída sobre uma indústria alimentada por petróleo, gás e carvão importados, com a energia nuclear em suspenso desde o desastre de Fukushima em 2011 e com espaço e recursos próprios limitados, a meta de uma neutralidade carbónica até 2050 apresenta enormes desafios acrescidos para o Japão. A solução, esperam os japoneses, pode estar no hidrogénio, elemento central de uma estratégia de diversificação de risco na transição energética do país para cumprir com as metas climáticas.."O hidrogénio pode ser armazenado, pode ser transportado e pode ser usado para veículos mais facilmente do que o gás natural. E é produzido a partir de energia renovável, bem como de gás natural", argumenta Takayuki Nogami, economista-chefe da Corporação Nacional de Petróleo, Gás e Metais do Japão (JOGMEC) desde 2004 e um dos oradores da Conferência "Gerar Energia para o Mundo Preservando o Planeta", organizada pelo Clube de Lisboa, ontem e hoje..O Japão quer ser a primeira grande potência mundial a hidrogenizar a sua economia e avançou em 2017 com um ambicioso plano nacional, que inclui setores de energia, de transporte, residencial e indústria pesada. O país é já líder na tecnologia de células de combustível, especialmente veículos com células de combustível, que procura exportar para o resto do mundo..Embora já tenha em marcha grandes projetos para produção de hidrogénio verde - que se obtém da água utilizando energias renováveis -, como a central de Namie, onde inicialmente estava projetada uma central nuclear, a realidade é que o hidrogénio verde é ainda muito dispendioso e obriga a grandes infraestruturas de renováveis..Em vez disso, o Japão obtém hoje a maior parte do seu hidrogénio a partir de gás natural, ou mesmo carvão - uma solução mais barata, mas que produz gases de efeito estufa. No entanto, se esses gases forem capturados na fonte e enterrados no solo, temos a solução de hidrogénio azul, que contribui para a redução de emissão de carbono. Os japoneses fazem isso através de parceiros tradicionais como Austrália e países de Médio Oriente.."Uma vez que no Japão podemos ter disponibilidade limitada, do ponto de vista geológico, para a captura e armazenamento de carvão, embora estejamos atualmente a executar estudos de viabilidade nas ilhas do norte, se conseguirmos encontrar locais adequados para essa captura em países produtores de gás, transformamos lá o gás natural em hidrogénio. Assim, podemos usar este hidrogénio importado para ajudar a atingir as metas de neutralidade carbónica e ajudar a enfrentar as questões climáticas globais", refere Nogami em respostas enviadas ao DN..O hidrogénio é, diz o economista-chefe da JOGMEC e professor associado da Universidade de Teikyo, uma parte da estratégia de "diversificação de risco" adotada pelo Japão na necessária transição energética, que vai da "extensa conservação de energia à importação de hidrogénio azul, bem como a introdução e implementação ativa de fontes de energia renovável, ativação de programas de pequisa e desenvolvimento, e apoio político para reduzir o custo de fornecimento", acrescenta..Descartar o uso dos hidrocarbonetos ainda não é fácil, admite Takayuki Nogami, porque "há uma enorme base de recursos de hidrocarbonetos globalmente, com suprimentos relativamente estáveis para anos, e estão estabelecidas uma série de cadeias confiáveis a nível global, a custos relativamente baixos com tecnologia e engenharia não complicadas", o que "nenhum dos novos tipos de energia, incluindo hidrogénio ou renováveis como solar e eólica, consegue ainda oferecer". Além disso, o envelhecimento da população japonesa e a prevista redução do crescimento económico "deixam muitas empresas hesitantes em fazer investimentos avultados em novas fontes de energia"..Fora dessas equações, pelo menos nos próximos tempos, continuará a energia nuclear. O acidente de Fukushima em 2011, admite o economista, trouxe "obstáculos de aceitação pública" difíceis de ultrapassar. "Do ponto de vista da solução dos problemas climáticos globais, a energia nuclear é vista como uma das energias importantes. O Japão usará o nuclear onde estiver disponível, mas temos que superar os obstáculos da aceitação pública antes disso. Muitos japoneses têm preocupações sobre a segurança das centrais nucleares e tendem a opor-se ao reinício de funcionamento dessas centrais, que têm estado paradas desde então. Ainda levará muito tempo até que possamos voltar a usar essa fonte para suavizar a transição energética", conclui Takayuki Nogami..rui.frias@dn.pt