Como nos habituámos a que aconteça no último episódio da temporada de uma série, no último plenário, antes de fazer as malas, Costa prometeu anunciar um grande pacote de apoios quando regressasse das férias. A realidade, porém, não depende dos tempos do governo. E o emagrecimento que os portugueses têm visto chegar às suas carteiras exige ação imediata..Num momento em que as famílias perdem diariamente capacidade de fazer face ao que têm de pagar e as empresas se veem sem chão para continuar a produzir riqueza para o país, adiar respostas urgentes para quando dá mais jeito ao calendário político não é muito avisado. A conjuntura, torturada pela inflação - que se tem sentido com mais força por estas bandas -, tem obrigado a libertar medidas "às pinguinhas", como lamentou a oposição. E o próprio Presidente já pressiona no sentido de se conhecer rapidamente o tal pacote global: "Setembro talvez seja o tempo para a visão de conjunto para mitigar aquilo que está a pesar mais na vida dos portugueses", disse Marcelo há um par de dias, deixando o recado quanto à sua expectativa temporal..Mas agora o primeiro-ministro tem um problema acrescido. É que a margem que tinha para embrulhar ajudas em papel brilhante está a derreter mais depressa do que um cubo de gelo sob o sol de agosto. E isso já é bem visível nas contas do Estado, com o excedente orçamental que tanto orgulhava Medina a perder em julho uns significativos 681 milhões de euros, mais de metade do valor acumulado nos cofres públicos nos primeiros seis meses do ano..Num primeiro momento, a inflação ajudou a que as Finanças pudessem apregoar a sua fantástica performance. À boleia dos aumentos de preços que vão deixando os portugueses mais pobres, Fernando Medina arrecadou até junho quase 30% mais do que Leão conseguira um ano antes, que se traduzem nuns expressivos 5,3 mil milhões de euros a mais. Repito, 5 mil milhões a mais à boleia dos impostos cobrados aos contribuintes. Mas esse fulgor começou a dissipar-se com o poder de compra a desaparecer. E o governo tende a ficar, ainda antes de libertar o Orçamento para o próximo ano, sem almofada para combater os pesadelos das famílias e das empresas. Até porque vai ter de desembolsar parte do que amealhou para financiar as medidas que não poderiam esperar pela rentrée política..Por outro lado, entre a necessidade de subir juros - com mais força e mais depressa do que se contava ser necessário - para conter a inflação galopante e uma recessão europeia que é uma ameaça crescente, vai-se a pouca margem que resta, eventualmente forçando a que as ajudas que aí possam vir sejam financiadas por dinheiro alheio. Mais dívida, portanto, num país que não consegue pagar o que deve, nem viver sem pedir, porque rejeita decisões estruturas, abomina reformas e vira a cara às medidas que poderiam garantir a produtividade necessária para gerar riqueza..As famílias precisam de ajuda, as empresas precisam de pagar menos impostos e o Estado não tem como responder à crise senão indo buscar mais dinheiro aos contribuintes ou aumentando o buraco das contas públicas. Resta saber se Costa terá coragem para pôr de lado as suas ambições e começar a tomar as decisões difíceis. Ou se vai fazer caridade com dinheiro dos outros - e assim correr com quem pode tirar o país do buraco.