Comerciantes de Albufeira ameaçam avançar para tribunal
Ao segundo dia de limpezas, a história das cheias de Albufeira começa a contar-se também em números. Já foram contabilizados 150 automóveis danificados e meio milhar de imóveis sofreu graves prejuízos. Já o número de pessoas que podem ter perdido o emprego é ainda uma incógnita, pois há muitos empresários que não tinham seguro e temem não conseguir voltar a erguer os negócios. Prejuízos que já levaram a câmara a pedir ao governo que fosse decretado o estado de calamidade pública. Mas do lado dos comerciantes, também há ameaças de avançar para tribunal contra quem fez as obras de requalificação na cidade.
Há moradores e empresários dispostos a começar uma luta para apurar responsabilidades. "Vamos dar estes dias para limpezas e ouvir o que os governantes têm a dizer. No início da próxima semana esperamos reunir com vários representantes e garanto que desta vez a culpa não vai morrer solteira", garante Luís Alexandre, um lojista que, em 15 anos, está a viver pela terceira vez um problema de inundações.
Não são poupadas críticas às obras da Sociedade Polis feitas no âmbito da requalificação de Albufeira, com a criação do Parque Verde, inaugurado em 2011. A ribeira local ficou reduzida a uma vala partilhando terreno com uma zona de relva e mobiliário de jardim, num quadro paralelo à estrada que conduz à entrada da cidade. "A câmara já fez um estudo depois das últimas grandes inundações, em 2008, mas nada foi feito." O empresário explica que desta vez a água também voltou a descer por onde era a ribeira, mas que, "ao passar por baixo da Avenida dos Descobrimentos, como a manilha é muito pequena, o caudal ganhou mais força e arrastou tudo o que apanhou, incluindo automóveis".
Em visita a Albufeira, o secretário de Estado do Ambiente, Paulo Lemos, reconheceu ontem erros de ordenamento do território, e promete um estudo tendo em vista a introdução de medidas corretivas.
Críticas à gestão das comportas
Na zona do Parque Verde há mais moradores que se insurgem contra o que consideram ser desmazelo da autarquia ao não limpar a ribeira. "É só lixo e canavial", protestava ontem Joaquim Henrique, e apontava para as três comportas que se sucedem ao longo da zona de leito. "Estavam todas fechadas no dia em que tanto choveu... Porquê? Como é possível mantê-las fechadas quando se sabe que vai chover tanto?"
A primeira comporta é gradeada e apresenta-se dobrada pela força das águas, a segunda foi arrancada "por uma máquina da câmara, já depois das cheias", garante Diamantino Sequeira, que mostra imagens de uma retroescavadora, gravadas através de telemóvel. A terceira comporta é inteira, compacta e está apenas ligeiramente subida. "Eles tentaram levantá-la mas como é elétrica não conseguiram porque o sistema está avariado", garante o morador na zona. E descreve como, no domingo, viu a água acumular-se e finalmente passar para o outro lado da estrada através dos túneis reservados a quem faz passeios pedonais. "A água foi depois entrar na Avenida da Liberdade, correu em direção ao Largo Engenheiro Duarte Pacheco e daí seguiu pelas ruas da baixa até à Praia dos Pescadores", descreve.
Em relação ao assunto, o presidente da autarquia diz que a gestão das comportas foi feita como devia e recusa que algo tenha corrido mal a não ser uma precipitação intensa, apenas descrita há cerca de 60 anos.
Limpeza ainda continua
Ontem, quem olhava para a avenida, ainda ficava com a imagem de o asfalto como se fora sacudido por um violento sismo, parecia uma folha de papel amarrotada e havia máquinas a resgatar o alcatrão aos pedaços. Mais abaixo, ainda permaneciam carros soterrados pelas pedras arrastadas, garagens inundadas e, em cada loja, gente de mangueiras e pás na mão, a tentar resgatar da lama os negócios que levaram uma vida a construir.
No largo Duarte Pacheco e nas ruas da baixa, novamente o mesmo quadro. Já muito foi feito, mas há ainda muito por fazer. Muitos voluntários, orientados pela autarquia, juntaram-se à luta dos lojistas e têm vindo a colaborar com as limpezas. Na Praia dos Pescadores está a ser resposta areia para se reconstruir o parque de estacionamento.