Combustíveis querem ajudar na descarbonização da economia
É verdade que a Comissão Europeia definiu 2035 como data para o fim da venda dos veículos a combustão. Mas também é verdade que países como a Alemanha já demonstraram estar contra essa decisão. Questionado sobre esta discrepância de opiniões, Alessandro Bartelloni, diretor da FuelsEurope, entidade que representa a indústria petrolífera na União Europeia, lembra que, daqui a um ano, haverá eleições nas instituições e que, nessa altura, a instituição que representa irá, novamente, abordar os membros da Comissão por forma a mostrar toda a inovação e evolução feita nos combustíveis - nomeadamente nos combustíveis líquidos com baixo teor de carbono (low-carbon liquid fuels em inglês, ou LCLF).
Para o diretor da FuelsEurope o setor confronta-se com alguns problemas, sendo o principal a falta de informação da sociedade sobre o papel que os LCLF podem ter na descarbonização da economia. E considera que o setor tem um problema de imagem, dado que é difícil combater as mensagens das instituições ambientais que, normalmente apelam à emoção.
Para Alessandro Bartelloni, o setor tem um papel importante a desempenhar, como solução alternativa e complementar à descarbonização. Para o diretor da FuelsEurope, o processo mais lógico passa por definir um objetivo e depois criar as condições para que o mercado escolha as melhores soluções. Não foi o que aconteceu, com o legislador a escolher a eletrificação como a solução e chegando ao ponto de "banir a venda de veículos a combustão". Existem soluções que podem ajudar a cumprir as metas definidas e a aliviar a pressão associada à necessidade massiva (e apressada) de eletrificar a economia, defende. Uma dessas soluções, aponta Alessandro Bartelloni, são os novos combustíveis - os chamados clean fuel, ou combustíveis neutros em carbono.
Sim, é verdade que contêm carbono. Mas, explica o diretor da FuelsEurope, o importante é a origem do mesmo. Tradicionalmente o carbono vem do petróleo, que depois de extraído se transforma em combustível e vai para a atmosfera e aumenta a concentração de CO2. "A grande transformação que ocorreu na nossa indústria é que, de forma gradual, substituímos o petróleo por outros materiais", aponta, dando como exemplo a biomassa sustentável ou desperdício, para fazer combustível sintético. Desta forma, e sem ser necessário fazer alterações aos motores existentes, é possível utilizar um combustível num motor a combustão emitindo CO2 que é apenas biogénico ou reciclado. isto significa que "não se aumenta a concentração de CO2 na atmosfera".
Mas a questão de ser "amigo" do ambiente não é a única vantagem deste tipo de combustível. Como lembra o diretor da FuelsEurope, hoje há uma grande pressão para a eletrificação. Com as devidas consequências, defende. Por um lado, isso criou alguns entraves, dado que há muitas entidades (e países) a avançar ao mesmo tempo. Desde logo a questão das baterias, não só na sua capacidade e fim de vida, mas, e principalmente, nas matérias-primas necessárias para o seu fabrico. Assunto que inclusive, alerta Alessandro Bartelloni, põe em causa a independência europeia em termos de fornecimento. Sem esquecer que o preço dos veículos elétricos ainda é muito elevado e que há dúvidas sobre se a capacidade atual da rede é suficiente para abastecer o número que se espera de viaturas elétricas. A solução mais lógica, para o diretor da FuelsEurope, passa por ter uma combinação de tecnologias.
Por outro lado, não nos podemos esquecer das viaturas já existentes. Alessandro Bartelloni acredita que a vida útil das mesmas se irá prolongar e que o mercado em segunda mão pode ganhar uma nova vida - algo que já está a acontecer. Mesmo porque há uma parte da população que não terá possibilidades de adquirir uma viatura elétrica.
O executivo, que foi um dos oradores do Lisbon Energy Summit, lembra igualmente os postos de trabalho que estão em causa com o encerramento das refinarias. E refere o caso que aconteceu numa refinaria perto de Veneza, Itália, que, ao passar a ser uma refinaria de biocombustíveis, conseguiu manter os postos de trabalho, enquanto abandonou por completo o petróleo e passou a fazer jetfuel. Estas são as situações que Alessandro Bartelloni considera que a Comissão deveria valorizar. Porque ajudam na descarbonização. Mas isto exige investimento. Muitos milhões de euros de investimento. Que, logicamente, os investidores têm algum receio de fazer dado que, hoje, não há certezas sobre o seu retorno.
Alessandro Bartelloni considera que este tipo de combustível - que é amigo do ambiente - pode ser a solução para o transporte marítimo, de mercadorias de longo curso, aviação ou indústria, como a cimenteira, por exemplo, que terá dificuldade em ser 100% de eletrificada.
Nos últimos anos muito mudou no setor dos combustíveis. Acontece que a maioria das pessoas desconhece por completo estes avanços. E essa é, na opinião de Alessandro Bartelloni, uma das maiores dificuldades do setor. Porque é difícil passar uma mensagem quando a carga negativa - transmitida por anos e anos de utilização do petróleo e das mensagens das instituições ambientalistas - é tão pesada. Acontece, aponta, que hoje o setor está completamente diferente. E essa é uma das mensagens que tentou transmitir no Lisbon Energy Summit: que hoje é possível utilizar combustíveis amigos do ambiente e que estes podem (e devem) ser uma solução complementar e alternativa à eletrificação. Que optar por uma combinação de diferentes tecnologias não só alivia a pressão associada à eletrificação, como permite cumprir - mais facilmente - os objetivos definidos pela Comissão Europeia. Os dados dão-lhe razão, mas Alessandro Bartelloni sabe que tem uma longa batalha pela frente.