Comboios e aeroporto: quanto, quando, como?

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Um bilhete do Alfa entre Porto e Lisboa custa 31,90 euros em segunda classe e 44,60 em primeira. Um bilhete na TAP entre as duas cidades custa 44,64 (se comprado com alguma antecedência). Não é coincidência que os custos sejam tão parecidos, mas o que faz toda a diferença é perceber-se que o bilhete da CP tem por dentro apenas 6% de IVA, enquanto a TAP cobra apenas 10 euros pela viagem e tem de adicionar 34,64 de impostos. Ou seja, é quase inacreditável que a viagem mais barata, livre de impostos, entre as duas cidades, seja de avião - mais barata até que o autocarro.

Porque existem taxas de 34,64 euros numa viagem de 10 euros? Convém relembrarmos que na terça-feira o Conselho Económico e Social reúne todos os especialistas para falar do novo aeroporto. As conversas sobre o tema normalmente não chegam ao ponto decisivo: o custo final dos bilhetes de avião. Um novo aeroporto impacta quanto mais? E o problema acarreta um outro: como se pode rentabilizar a TAP nesse contexto?

Ainda temos pela frente décadas de concessão à ANA-Vinci e surge a hipótese estratosférica "Alcochete". A Confederação do Turismo está muito focada nos que chegam cá, e isso é importante. Mas temos de defender os portugueses que viajam em trabalho, os emigrantes que tentam cá vir ou até os que preferem fazer férias lá fora. Não podemos ficar subjugados a aeroportos-monopólio tão caros que o tráfego aéreo não seja acessível. Ao contrário dos turistas, não aterramos cá de vez em quando.

2. As 71 páginas do Plano Ferroviário Nacional, agora em discussão pública, são a maior revolução de transportes públicos dos últimos 100 anos. Encurta Portugal, permite habitá-lo de forma menos litoralizada e transforma-nos num dos países mais interessantes do mundo para viver. Tem um senão: não coloca um único preço-alvo dos bilhetes nas diferentes linhas.

Entretanto, a realidade é outra. Na Europa, a oferta de comboios entre as duas principais cidades é a base da mobilidade. Por cá é apenas sofrível. Exemplo: compreende-se que o último alfa pendular Lisboa-Porto-Braga seja às 19h00? Até à pandemia, o último Alfa partia de Lisboa às 20h00, com várias paragens - Santarém, Entroncamento, Pombal, Coimbra, Aveiro, Espinho e Gaia. Acabou. Quem quiser regressar de Lisboa, após um dia minimamente rentável, ou consegue o das 19h (encurtando imenso a tarde de trabalho) ou tem de voltar no Intercidades das 22h. Chegará ao Porto à 1h30 - e este comboio já não segue para Braga. Entretanto, o contrário não é verdade: o último Alfa para Lisboa parte de Braga às 19h54, e do Porto às 20h32. Porque não uma equiparação? A CP não está a tratar de forma igual os clientes.

3. O maior trunfo do Plano Ferroviário Nacional (PFN) é a capacidade de melhorar conexões regionais e criar zonas metropolitanas ferroviárias eficazes. Lisboa é a única verdadeira rede urbana de transportes e melhorará radicalmente. No Porto, as linhas adjacentes são atualmente um colossal falhanço, mas neste plano passam a conectar-se. Entretanto, há coisas novas nos eixos de Coimbra, Oeste, extensão a Trás-os-Montes e finalmente a via Algarve-Sul de Espanha.

A outra revolução passa pelas composições de mercadorias transportarem camiões (e não apenas os seus contentores). Qualquer passagem pelas fronteiras entre Espanha e França evidencia quanto milhares de camiões continuam a poluir, sem alternativa à vista. Porém, se a ferrovia funcionar, teremos mais hipóteses de cumprir metas ambientais. Nessa medida, o PFN está sintonizado com o rumo do mundo. Veremos se é desta.

Jornalista

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