Cogumelos: colheita segura exige conhecer as espécies

Durante saída de campo para observar cogumelos participantes identificaram 50 espécies,  15 das quais comestíveis. A diversidade é muita e só conhecer características evita que se comam cogumelos venenosos que podem levar à morte. Em caso de dúvida não se devem colher.
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O pé branco com anel descaído suporta o chapéu vermelho intenso com pintas brancas, que se assemelham a pedaços de esferovite colados em desenhos infantis. E na verdade, nas florestas das histórias do maravilhoso, estas estruturas são até a casa dos gnomos. No entanto, na Zona da Cabeceira do Mondego, na serra da Estrela, um chapéu vermelho coberto com resto da penugem do véu branco e o pé, também branco, com uma volva na base indicava um cogumelo tóxico do grupo das Amanitas.

Apesar do aspecto atraente, o mata-moscas, ou Amanita muscaria (nome científico), é tóxico. Esta espécie venenosa, mas não letal, foi apenas uma das cerca de 50 identificadas durante uma saída de campo para observação de cogumelos. Daquelas, ao contrário do mata-moscas, pelo menos 15 são comestíveis.

"Para identificação dos cogumelos é preciso um conhecimento aprofundado das características das diferentes espécies" daquele fruto do bosque, explicava José Conde, biólogo do Centro de Interpretação da Serra da Estrela (CISE), em Seia, que organizou a iniciativa.

A morfologia, as cores, o cheiro, o sabor e o habitat são elementos essenciais a ter em conta. Assim, após a colheita e ainda no campo deve ser feita uma descrição detalhada do cogumelo, devendo ser consumidas exclusivamente as espécies identificadas com segurança, reiterou. É necessário ainda ter em conta que as características das espécies podem mudar consoante o estádio de desenvolvimento.

"Este também é comestível?" perguntava surpreendido Joaquim Gomes, um dos cerca de 20 participantes na actividade. Aos seus pés tinha um Sarcodon imbricatus. E de facto apesar do aspecto "feio", esta espécie com chapéu coberto por uma cutícula seca de cor acinzentada a castanha, com escamas grossas dispostas em forma de círculos pode servir-se à mesa. No entanto, o Sarcodon imbricatus tem um sabor picante-amargo que pode não agradar a todos. Participantes que em anos anteriores, também o encontraram na zona do Alto Mondego, disseram gostar.

Mas os mais procurados foram os boletos. Assim que viram o primeiro, vários participantes esforçaram-se por encontrar espécies daquele género. No fim foram identificadas pelo menos duas excelentes comestíveis: Boletus edulis e Boletus pinophilus. As frutificações robustas, a textura carnuda e a superfície fértil composta por tubos caracterizam este grupo. Do mesmo grupo, a ordem boletales, foram encontrados ainda os comestíveis: Suillus luteus, ao qual deve ser retirada a película do chapéu por possuir um efeito laxante, o Leccinum scabrum, que nasce associado às bétulas e adquire uma cor preta ao ser cozinhado e ainda o Xerocomus badius. Mas a Sancha (Lactarius deliciosus), também era apontada por Victor Gomes, outro participante, como uma espécie para fazer bons pratos. Dizendo, ainda, que para quem conhece é um cogumelo "fácil de se identificar". "É assim cor de laranja, e depois tens algumas nuances verdes", explicou, adiantando que contudo é preciso ter muito cuidado. A Sancha, tal como o grupo das Russulas, possui o pé sem anel e lâminas no himenóforo (parte inferior do chapéu).

À lista das espécies que se podem comer juntaram-se ainda o Pleurotus ostreatus, que se encontra disponível no mercado, e o Macrolepiota procera, que apresenta no pé um reticulado característico e um anel duplo e móvel.

De facto as espécies multiplicam-se e surpreendem os participantes. Perante a diversidade o trabalho de identificação torna-se difícil. "Há grupos que até são fáceis de identificar, como, por exemplo, "os venenosos Amanitas que exibem na base do pé uma estrutura bolbosa, designada de volva". Mas as diferentes espécies que compõem estes grupos já se torna mais difícil. "Algumas só são possíveis de distinguir ao microscópio", explicou José Conde, adiantando que tal se deve pelo facto de "haver espécies em que as diferenças visíveis a olho nu são escassas". Por isso durante a saída de campo a mensagem repetia-se: para consumir só se devem apanhar espécies quando se tem a certeza que não são tóxicas.

No entanto, os conhecimentos para colher espécies que vão além dos tradicionais míscaros - o branco (Tricholoma portentosum) e o amarelo (Tricholoma equestre), muito procuradas e por isso cada vez mais raras, podem ser uma mais-valia para os apreciadores e para o ambiente, lembrava José Conde. "Se soubermos identificar uma diversidade elevada de cogumelos comestíveis podemos consumi-las durante um período largo - de Outubro a Março", informou o biólogo, adiantando que colher cogumelos diferentes permite ainda preservar as espécies.

No final da caminhada em busca dos cogumelos silvestres, a uma altitude, de cerca de 1400 metros, os cestos de vime estavam cheios. Dos mais novos aos graúdos a motivação foi uma constante para partir à descoberta do "espectacular dos cogumelos", como lhe chamou Joaquim, quando passo a passo ia descobrindo uma nova espécie. E durante a caminhada o convívio com a natureza foi uma aposta. As espécies eram identificadas com cuidado e todos os participantes se certificaram, junto dos entendidos, que as que levavam para casa não representavam riscos para a saúde quando consumidas.

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