Clínica prometia bebés 'à la carte' mas recuou

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Saúde. Uma clínica norte-americana anunciou uma técnica que permite aos pais escolher características físicas dos filhos, como olhos azuis e pele clara. A novidade gerou polémica e o processo foi suspenso. Em Portugal, onde só é permitida a selecção de embriões por motivos de doença, as opiniões dividem-se

Casais portugueses pedem para escolher cor dos olhos

Escolher a cor dos olhos e do cabelo de um filho, garantindo ao mesmo tempo que ele não sofre de nenhuma doença genética. A promessa de um "bebé à la carte" foi feita há pouco mais de dois meses por uma clínica de fertilidade norte-americana. Mas no início da semana o serviço foi cancelado, por ter chocado a opinião pública e dividido a comunidade científica.

Em Portugal, a selecção de embriões é feita apenas para evitar doenças graves, como a doença dos pezinhos, mas há pais que também pedem para escolher a cor dos olhos.

"Talvez uma dezena de casais já me tenha pedido para escolher a cor dos olhos do filho", diz o geneticista Mário de Sousa, especialista do Instituto de Ciências Médicas Abel Salazar, no Porto. "Nem cheguei a saber qual era a cor que pretendiam porque a lei em Portugal apenas permite a selecção de embriões para tratamento de doenças graves ou evitar o risco da sua transmissão", acrescenta.

Já o norte-americano Fertility Institute - com centros em Los Angeles, Nova Iorque e México - prometia aos casais que fossem fazer uma selecção de embriões sem determinadas doenças herediátrias ou genéticas, que escolhessem também algumas características físicas do bebé, como a cor dos olhos e cabelo. Mas a clínica não garantia um resultado "perfeito" quanto aos traços físicos pretendidos. A técnica usada é o diagnóstico genético pré-implantação, há muito utilizada para combater doenças graves como a hemofilia . Só que além de embriões livres de problemas, seleccionaria aqueles com maior probabilidade de corresponderem às características físicas escolhidas.

A clínica até já tinha candidatos aos testes, mas na segunda-feira, num lacónico comunicado na sua página na Internet, cancelava o programa, reconhecendo que "qualquer benefício destes estudos de diagnóstico, são claramente suplantados pelo aparente impacto social negativo".

A possibilidade de os pais poderem evitar doenças e ao mesmo tempo seleccionar as características físicas dos filhos não incomoda Mário de Sousa. "Esses embriões já são um paciente, portanto não me choca a selecção de algumas características físicas. Mas oponho-me a que a selecção seja feita apenas por motivos cosméticos."

Já para o geneticista e professor da Faculdade de Medicina do Porto Alberto Barros este diagnóstico "é lamentável e não passa de "uma acção de folclore" publicitário. O especialista condena "que se introduzam critérios não médicos na selecção de embriões", e questiona a sua eficácia.

"No estado de arte actual não é possível assegurar, com um grau de certeza elevado, a selecção de crianças de olhos azuis ou cabelo louro. São questões que a genética não domina, pelo que um teste terá uma taxa de sucesso muito baixa", assegura Alberto barros. O perito está preocupado com o efeito perverso deste tipo de anúncios na investigação. "O diagnóstico genético por motivos fúteis pode criar uma onda de descontentamento na opinião pública, que pode prejudicar o uso desta técnica para prevenir problemas que são realmente importantes".

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