Cinema francês, das novidades aos clássicos

A já tradicional Festa do Cinema Francês regressa com muitas ante-estreias e uma retrospetiva de Jean-Pierre Melville - o programa reparte-se por 11 cidades.
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É verdade que a presença do cinema francês no mercado português há muito perdeu a dimensão que teve em tempos mais heroicos, pelo menos até meados da década de 1980. Mas não é menos verdade que, apesar de tudo, em anos recentes alguma da sua visibilidade tem vindo a ser recuperada. Para nos ficarmos pelos exemplos mais próximos, lembremos que neste verão assistimos às reposições, em cópias restauradas, de dois musicais clássicos de Jacques Demy (Os Chapéus-de-Chuva de Cherburgo e As Donzelas de Rochefort).

Com a já tradicional Festa do Cinema Francês, voltamos a ter uma janela para a pluralidade da atual produção francesa, em vários casos através da apresentação de títulos já adquiridos para o mercado português. Neste ano, a abertura ocorreu em Lisboa, com um filme sobre os trabalhos pioneiros dos irmãos Lumière, cujo valor simbólico não será necessário sublinhar: Lumière!, de Thierry Frémaux, terá a sua estreia comercial já na próxima quinta-feira, dia 12.

Em Lisboa, o evento continua até ao dia 15, em paralelo com a presença da Festa em nada mais nada menos do que uma dezena de cidades (por ordem de abertura da respetiva programação): Almada, Cascais, Coimbra, Leiria, Porto, Aveiro, Faro, Beja, Seixal e Viana do Castelo. O calendário prolonga-se até 11 de novembro [festadocinemafrances.com] e deixamos alguns títulos a não perder.

Como sempre, há uma personalidade a "apadrinhar" o acontecimento: Arnaud Desplechin assume neste ano essas funções, sendo exibida parte da sua obra, incluindo o título mais recente, Os Fantasmas de Ismael, com Mathieu Amalric e Marion Cotillard (também nas salas a partir do dia 12). Como sempre também, a Festa propõe um ciclo de memórias, suscetível de permitir o conhecimento de um capítulo menos conhecido do património cinematográfico. Desta vez, na Cinemateca, teremos uma retrospetiva de Jean-Pierre Melville (1917-1973), autor não exatamente esquecido, mas sempre algo secundarizado quando se evocam as atribulações criativas dos tempos da nova vaga: a passagem de clássicos como Bob le Flambeur (1956) ou Le Samouraï (1967) constituirá, por certo, uma revelação para os espectadores mais jovens.

Além da programação simultânea de alguns filmes franceses no espaço televisivo (na RTP2 e no canal Cinemundo), registe-se ainda um sugestivo complemento fotográfico. Assim, será possível descobrir uma exposição de Renaud Monfourny, fotógrafo e fundador da revista Les Inrockuptibles, detentor de um extraordinário portfólio de personalidades do cinema de França (Marguerite Duras, Jean-Luc Godard, Catherine Deneuve, etc.) e muitos outros países, incluindo Portugal (Quentin Tarantino, Isabella Rossellini, Pedro Costa, etc.) - a exposição estará disponível no espaço da Plataforma Revólver (Lisboa), até 4 de novembro.

Destaques

GAUGUIN, de Edouard Deluc

Porventura à procura de um novo fôlego na sua carreira, Vincent Cassel (50 anos) aposta aqui numa evidente e elaborada transfiguração física para representar o pintor Paul Gauguin - o filme concentra-se no período vivido no Taiti, decisivo no relançamento e reinvenção do seu trabalho.

O IMPERADOR - A MARCHA DOS PINGUINS 2, de Luc Jacquet

Depois da A Marcha dos Pinguins (consagrado com o Óscar de melhor documentário em 2006), Luc Jacquet volta ao mesmo universo gelado de novo em registo documental. Anuncia-se como uma continuação tecnicamente ainda mais sofisticada, utilizando imagens 4K.

LOUISE EN HIVER, de Jean-François Laguionie

Com assinatura de um veterano dos desenhos animados franceses (e dos seus métodos mais tradicionais), esta é a história de uma velha senhora solitária a viver numa estação balnear: um conto sobre a passagem do tempo e a procura da felicidade.

ROCK"N" ROLL, de Guillaume Canet

Por certo um dos mais populares atores franceses, Guillaume Canet volta a repartir-se pelas tarefas de argumento, interpretação e realização para, em tom de comédia, encenar as atribulações de um "jovem" que lida mal com a chegada dos 40 anos... Com Marion Cotillard.

O SEGUNDO FÔLEGO, de Jean-Pierre Melville

Produzido em 1966, é um dos títulos mais emblemáticos da retrospetiva Melville: um policial de geometria contemplativa e intimista, dominado pela presença austera de Lino Ventura e Paul Meurisse - fotografado num admirável preto e branco, essencial neste universo.

LA SENTINELLE, de Arnaud Desplechin

Nunca lançado no circuito comercial português, a segunda longa-metragem de Desplechin (datada de 1992) condensa de forma radical e perturbante a pulsão de morte dos seus "heróis". No papel central está o enigmático e fascinante Emmanuel Salinger.

12 JOURS, de Raymond Depardon

Retrato íntimo dos circuitos legais dos pacientes colocados em unidades hospitalares de psiquiatria: um mundo de implacável frieza humana que Raymond Depardon regista com a mesma depuração que sempre distinguiu o seu trabalho como fotógrafo.

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