Cinema em alemão diz-se KINO
Mulheres atrás da câmara. O programa da 14.ª edição da KINO - Mostra de Cinema de Expressão Alemã revela-nos uma forte assinatura feminina. Sublinhe-se: é uma tendência que se reflete, mas não foi gerada pela lógica da programação.
O festival organizado pelo Goethe-Institut Portugal, em colaboração com as embaixadas dos países participantes, tem início hoje, no Cinema São Jorge, em Lisboa, com a projeção de Fukushima, Meu Amor, da realizadora Doris Dörrie, que estará presente.
Logo neste filme, rodado a preto e branco no Japão - com um título que evoca o de Alain Resnais, Hiroshima, Meu Amor (1959) -, assinalam-se as características que atravessam toda a mostra. Além da realização no feminino, referimo-nos igualmente aos temas da fuga e do refúgio, e à supressão das barreiras linguísticas. Precisamente, Fukushima, Meu Amor, ao expor a viagem de uma jovem alemã para essa cidade japonesa, na sequência do acidente nuclear (2011), e a sua amizade com uma idosa, estabelece a universalidade como paradigma da KINO.
E porque a mostra parte de Lisboa - para depois rumar ao Porto (dia 26) e a Coimbra (dia 1 de fevereiro) -, nenhum outro filme terá maior ligação à cidade senão Fado, uma coprodução alemã e portuguesa (Alfama Films) assinada por Jonas Rothlaender, que inscreve na capital uma narrativa de obsessão amorosa.
Por sua vez, embora não se trate de uma coprodução, também o filme de encerramento, Stefan Zweig - Adeus Europa, tem uma costela portuguesa. Com sotaque brasileiro, Virgílio Castelo, Nicolau Breyner, João Lagarto, João Didelet, Maria Vieira, entre outros, enriquecem o elenco que se junta para retratar a última década de vida do escritor austríaco, no exílio. Foi do outro lado do oceano, no Brasil, que se despediu de uma Europa descaracterizada pelos fascismos. A realizadora, Maria Schrader, marca presença na sessão, dia 24.
Reforçando a diversidade da oferta, a par com estes e outros títulos da mostra principal, a KINO organiza ainda um ciclo especial para escolas (com duas aventuras juvenis criadas por Arend Agthe: Salvem o Raffi! e Viagem no Rio com Galinha, secções de curtas-metragens e documentários. Homo Sapiens, de Nikolaus Geyrhalter, conta-se entre essas não-ficções, mas salta à vista como uma autêntica ficção científica. Sem vivalma no enquadramento, a câmara do documentarista austríaco percorre lugares carregados de vestígios da humanidade.
Justamente, é também a humanidade e o seu rumo que se questionam noutros filmes, como Friedland, de Frauke Sandig, sobre o campo de refugiados situado nessa localidade da Baixa Saxónia, ou Democracia - Na Onda dos Dados, de David Bernet, um mergulho nas gigantescas implicações da sociedade digital. Numa altura em que a democracia corre riscos, eis uma proposta para refletir sobre ela.