Chile e Peru a fronteira da discórdia

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São cerca de 35 mil quilómetros quadrados de águas no oceano Pacífico que dividem actualmente Chile e Peru. Na origem do recente diferendo entre os dois vizinhos sul-americanos está a fronteira marítima que os primeiros dizem já ter sido estabelecida em tratados na década de 1950, mas que os segundos defendem regulamentar apenas o sector da pesca.

No início de Novembro, o Congresso peruano promulgou uma lei que estabelece os novos limites marítimos do país - em vez de uma linha paralela à do Equador, a partir da fronteira entre ambas as nações, é usada a equidistância, que estabelece uma projecção de 200 milhas a partir da costa (ver infografia).

Na prática, a diferença é um triângulo com cerca de 35 mil quilómetros quadrados rico em recursos marinhos, que poderá marcar a diferença na liderança do mercado mundial de farinhas de peixe. A região é fundamental na pesca de anchoveta, uma espécie de sardinha usada no fabrico destas farinhas - o principal alimento do salmão de viveiro. O Chile é o segundo maior produtor mundial (detendo 20% da quota de mercado), sendo apenas ultrapassado pelo Peru (40%).

incidentes. A promulgação da lei veio apenas dar mais um argumento aos constantes diferendos entre os dois países. O primeiro incidente, só este ano, ocorreu com a descoberta de que o Chile teria vendido armas ao Equador durante um breve conflito com o Peru, em 1995. Em Maio, Lima anunciou a suspensão dos "gestos de boa vontade", bem como das negociações para um acordo de livre comércio. Também não apoiou a nomeação do chileno José Miguel Insulza para secretário-geral da Organização dos Estados Americanos.

O Governo chileno reagiu à decisão peruana dizendo que continuará "a exercer os direitos que lhe são devidos nos espaços da sua soberania e jurisdição" e que o Parlamento do Peru não reconheceu "os acordos em vigor que dizem respeito à delimitação com o Chile". Para o Ministério dos Negócios Estrangeiros peruano, "não existe um tratado de delimitação marítima com o Chile", já que os acordos apenas se aplicam à questão da pesca.

O Equador, que juntamente com Peru e Chile assinou, em 1954, o Convénio sobre a Zona Especial Fronteiriça Marítima, aprovou entretanto uma resolução no Congresso na qual reafirma a vigência desses acordos - oferecendo assim o seu apoio a Santiago. O objectivo foi afastar qualquer "intenção expansionista" de Lima. Equador e Peru assinaram em 1998 um tratado de paz, após o conflito de 1995 na fronteira amazónica, que estabelece os limites de ambos os países.

Quem também tem seguido de perto o diferendo é a Bolívia. O país perdeu a ligação marítima quando foi derrotado, juntamente com o Peru, na Guerra do Pacífico (1879- -1883). Parte do território de ambos os países foi anexada pelo Chile. O isolamento da Bolívia no coração da América do Sul tem sido, segundo La Paz, um dos entraves ao de-senvolvimento económico e social. Hoje, beneficia de isenção de impostos no transporte de mercadorias até ao porto a norte de Arica, mas espera vir a deter a soberania num corredor de dez quilómetros.

presidenciais. O tema ganha ainda maior relevância quando surge em vésperas de eleições presidenciais nos dois países o Chile vai a votos a 11 de Dezembro e o Peru a 9 de Abril de 2006. Se de um lado a imprensa chilena vê na situação uma manobra do Governo de Alejandro Toledo para aumentar o apoio à sua gestão no Peru, a congénere peruana refere que o Executivo de Ricardo Lagos está a usá-lo para relançar a candidatura de Michelle Bachelet - a quem as sondagens davam a vitória à primeira volta no Chile, mas que tem vindo a perder força.

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