Centeno. Política monetária deve "procurar uma posição mais neutra"

O governador do Banco de Portugal (BdP) alertou ainda para o desafio de um crescimento da economia muito baixo num cenário de inflação elevada, mas diz que não assistiremos a estagflação, no conceito estrito da palavra.
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O governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, vincou esta sexta-feira que a política monetária está a mudar de ciclo, devendo procurar uma posição mais neutra.

"A política monetária está a mudar de ciclo. Tem de mudar de ciclo. De forma gradual e ponderada, como a decisão de ontem [quinta-feira] com todas as suas vicissitudes, que compromissos de política envolvem tem", disse esta sexta-feira durante uma intervenção na conferência "Portugal: objetivo crescimento", organizada pela Ordem dos Economistas, na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.

Mário Centeno sublinhou que a política monetária "acompanhou e vai continuar a acompanhar aquilo que são os desafios económicos e financeiros da área do euro", mas considerou que deve "procurar uma posição mais neutra".

"É isso que a normalização da política monetária significa. Menos acomodatícia, mas para que isso seja conseguido a dimensão orçamental europeia deve acompanhar", frisou.

Recordou ainda uma mensagem que tem defendido nos últimos discursos de que a política monetária nos próximos tempos se deve reger pela proporcionalidade, pela opcionalidade e pela flexibilidade.

Neste sentido, vincou que a decisão desta quinta-feira do Banco Central Europeu "não alterou a perspetiva de médio prazo da política monetária", sublinhando que desde 2015 interveio com cinco biliões de euros em compras de ativos.

"Boa parte deste montante está agora disponível para ser gerido entre jurisdição com objetivo de acautelar a não fragmentação da área euro", realçou.

O governador do BdP salientou ainda que "a inflação é uma preocupação", uma vez que "afeta o crescimento económico e este crescimento económico ainda está a recuperar face ao período pré-pandemia".

"A área do euro atingiu valores de atividade pré-pandémicos no quarto trimestre de 2021, mas a composição, a base da economia é muito diferente, porque há muitos setores que ainda não o fizeram", disse.

O ex-ministro das Finanças assinalou que tal ainda "é mais claro na economia portuguesa", que acredita "deverá no primeiro trimestre deste ano ter atingido os valores do quarto trimestre de 2019 em termos de atividade".

"Mas todos reconhecemos que a base da nossa economia é hoje muito diferente da que era em 2019. Isso deve preocupar-nos, porque ainda há caminho a fazer e deve alegrar-nos porque conseguimos criar alternativas em termos económicos", acrescentou.

O governador do Banco de Portugal (BdP), Mário Centeno, alertou ainda para o desafio de um crescimento da economia muito baixo num cenário de inflação elevada, mas diz que não assistiremos a estagflação, no conceito estrito da palavra.

"Os cenários de estagflação que nos dicionários de economia têm três componentes: crescimento nulo ou mesmo negativo, inflação elevada e em aceleração e um mercado de trabalho com desemprego elevado. Nós não temos esta terceira condição na Europa", disse esta sexta-feira o responsável do BdP durante uma intervenção na conferência "Portugal: objetivo crescimento", organizada pela Ordem dos Economistas, na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.

Mário Centeno disse não prever que um mercado de trabalho com desemprego elevado "se venha a concretizar".

"Portanto, puristas das definições podem ficar confortados de que os três pilares da definição de estagflação, na minha visão podem não ser cumpridos. Mas a verdade é que enfrentamos momentos de desafio com crescimento muito baixo e inflação elevada", acrescentou.

Em entrevista à Bloomberg, em 28 de fevereiro, o governador do BdP alertou que um "cenário próximo da estagflação não está fora das possibilidades que podemos enfrentar", devido ao conflito na Ucrânia.

O Banco Central Europeu (BCE) baixou esta quinta-feira a sua previsão de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) da zona euro em 2022 e subiu acentuadamente a de inflação devido ao impacto da guerra na Ucrânia.

A instituição prevê uma expansão do PIB de 3,7% este ano, quando previa 4,2% nas últimas projeções, e quanto à inflação aponta agora para 5,1% quando há três meses antecipava 3,2%. Já em 2023, o crescimento deve ser de 2,8% (2,9% em dezembro) e em 2024 será de 1,6% (inalterado).

Quanto à inflação deve atingir 2,1% em 2023 (1,8% em dezembro) e 1,9% em 2024 (1,8% na anterior previsão).

A guerra "terá um impacto importante na atividade económica e na inflação, pelo aumento dos preços da energia e das matérias-primas e também pela perturbação do comércio internacional e da confiança", declarou a presidente do BCE, Christine Lagarde, em conferência de imprensa.

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