Centeno defende a venda do Novo Banco. "Foi preciso fazer um bom banco"
A história da venda do Novo Banco ao fundo norte-americano Lone Star tem estado envolta em polémicas pelos custos envolvidos para os contribuintes. Mas Mário Centeno, governador do Banco de Portugal e que era ministro das Finanças quando a venda foi fechada, e Luís Máximo dos Santos, presidente do Fundo de Resolução, não têm dúvidas de que foi uma medida necessária e indispensável para salvaguardar a estabilidade financeira.
Mário Centeno considerou que a solução encontrada deu "futuro à banca nacional". Já Máximo dos Santos assegurou que o custo de não prosseguir com a venda "seria incomparavelmente maior". De acordo com as estimativas apresentadas pelos responsáveis ouvidos na terça-feira na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) às perdas do Novo Banco imputadas ao Fundo de Resolução, só as perdas diretas de uma liquidação do banco poderiam ascender a cerca de 14 mil milhões de euros.
Na sua intervenção inicial, Mário Centeno relembrou que ao contrário das histórias de encantar, a "história do sistema bancário a nível global durante a crise financeira e das dívidas soberanas, não tem esse encanto". E o Novo Banco está incluído neste enredo, assemelhando-se ao conto do Patinho Feio. Segundo a história contada nas palavras do antigo ministro das Finanças, "o Novo Banco era novo, mas herdeiro de velhos problemas e com muitos e complexos desafios pela sua frente". "Foi preciso fazer dele um bom banco". Razão pela qual ao longo da sua audição repetiu diversas vezes que "a esmagadora maioria das questões levantadas nesta CPI tiveram a sua origem no BES e não no NB. Devemos ter isso sempre presente", apontou.
Ao longo das mais de cinco horas de audição, e apesar de dizer que não gosta de metáforas, Mário Centeno não resistiu a mencionar por várias vezes a "cesta de fruta apodrecida" em alusão aos ativos do Novo Banco. Uma comparação utilizada pelo seu antecessor, Carlos Costa, na segunda-feira no Parlamento, e partilhada também pelo atual governador do BdP: "O Novo Banco tinha, de facto, ativos problemáticos". O banco que ficou com os ativos alegadamente "bons" do BES, foi vendido à Lone Star em 2017, tendo este fundo ficado com 75% do capital e o Fundo de Resolução com os restantes 25%. O acordo de venda contemplou um mecanismo de capital contingente, no montante de até 3,89 mil milhões de euros, à luz do qual o Fundo de Resolução faz injeções anuais no banco para cobrir perdas de ativos "herdados" do BES.
Mário Centeno admitiu que todo o processo desde a resolução do BES, em 2014, tem vindo a ser "penoso socialmente, politicamente e financeiramente". E não teve problemas em apontar o dedo aos gestores do BES. "Se a sorte é o que acontece quando a preparação encontra a oportunidade, o azar acontece quando a incompetência encontra o dolo e a prática de atos de gestão ruinosa. E deve, por isso, ter responsáveis, como aliás já está judicialmente comprovado", acrescentou, relembrando que estão a decorrer centenas de processos judiciais nos tribunais portugueses.
Antes de Mário Centeno ser ouvido pelos Deputados, Máximo dos Santos já tinha revelado no Parlamento que o Fundo de Resolução vai decidir "nos próximos dias" qual o valor que considera que deve ser pago ao Novo Banco para o compensar por perdas registadas em 2020 relativas a ativos "herdados" do BES.
O também vice-governador do Banco de Portugal garantiu que vai haver "deduções significativas ao valor da "chamada" (de capital)". De acordo com as contas apresentadas por Máximo dos Santos, o valor da injecção será, garantidamente, abaixo dos 598 milhões pedidos pela instituição financeira liderada por António Ramalho.
Ao valor pedido pelo Novo Banco serão subtraídos os quase 4 milhões de prémios atribuídos à gestão do banco, 166 milhões de euros relacionados com uma divergência derivada da descontinuação da atividade em Espanha e será ainda retirada outra parcela relativa a valorização de um ativo cujos detalhes Máximo dos Santos preferiu não adiantar para já. Lembrou que o Fundo de Resolução tem atuado para impedir que haja um aproveitamento do Novo Banco ao nível do recurso ao mecanismo de capital contingente ao travar a realização de diversas operações. Recordou que, das 240 operações que o Novo Banco pretendia efetuar, apenas 35 foram aprovadas nos termos em que foram propostas, enquanto 85 foram aprovadas com a exigência de alterações e 38 com recomendações.
Além disso, relembrou que qualquer injeção de capital no Novo Banco tem de ter autorização. "Nem que saia o Euromilhões ao Fundo de Resolução, para gastar tem que sempre estar coberto para uma autorização para esse efeito".
O Fundo de Resolução injectou 4,9 mil milhões de euros, aquando da resolução do BES em 2014. Desde a venda a Lone Star, e ao abrigo do mecanismo de capital contingente, já avançou com 2,98 mil milhões de euros do máximo de 3,89 mil milhões previstos.
Com Elisabete Tavares