Castro Almeida: "Está ao alcance do PSD ganhar as eleições legislativas"

Um dos homens que é mais próximo de Rui Rio diz que o partido deve aceitar a estratégia delineada pelo líder de estabelecer diálogo com outros partidos, nomeadamente o PS. Elege os fundos europeus, a descentralização e as grandes obras públicas como temas passíveis de entendimento. Não equaciona um voto positivo do partido ao Orçamento do Estado para 2019. Garante que Rui Rio vai renovar o PSD, abri-lo à sociedade e que aceitará os críticos "construtivos". O que seria intolerável - diz em jeito de recado interno - "era se alguém estivesse no PSD e no seu íntimo desejasse a derrota do seu partido".
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Com Rui Rio vamos ter um partido mais fechado? Temos de nos habituar a isso?

Pelo contrário. Rui Rio, durante a campanha para as diretas, foi muito enfático na necessidade de o partido se abrir cada vez mais à sociedade. Em cada estrutura partidária, em cada secção, em cada núcleo, em cada sede, cada uma destas estruturas tem de estar aberta a receber e a chamar pessoas, os melhores de cada especialidade, de cada ramo, em cada localidade, para discutir as questões locais, as questões regionais, as questões nacionais...

O novo líder terá de fazer uma limpeza no partido para que não seja um "clube de amigos", como ele próprio disse?

Um líder tem de garantir e trabalhar pela unidade do partido. Mas a unidade partidária pode muito bem conviver com pluralidade e com diversidade de opiniões. O que seria intolerável era se alguém estivesse no PSD e no seu íntimo desejasse a derrota do seu partido. Esse é o limite do intolerável. Quem está por bem e discorda para encontrar melhores soluções é bem-vindo. A sabedoria do líder estará em saber distinguir quem o critica porque lhe quer bem daqueles que o criticam porque lhe querem mal.

Mas há críticos das duas maneiras...

Posso dizer que sim. Não encontra ninguém que não diga que tem de se respeitar o resultado das eleições. Aceitar o resultado das eleições significa aceitar que prevaleçam as ideias expressas pelo candidato que ganhou as eleições. Por exemplo, ficou claro na campanha eleitoral interna a disponibilidade ou a predisposição manifestada por Rui Rio para estabelecer diálogo com outros partidos com vista a entendimentos estruturais. Aceitar o resultado das eleições significa aceitar que esta linha política vai prevalecer no partido. Não falei de diálogo com o PS, falei de diálogo com os demais partidos, e não falei de acordos de governo nem falei do Bloco Central, falei de acordos, ou da tentativa de chegar a acordo em matérias estruturantes para o regime. Estes entendimentos podem vir a ser atingidos ou não, mas que há disponibilidade sincera do líder isso há, e isso decorre diretamente da sua moção e de todas as intervenções públicas que Rui Rio fez durante a campanha interna.

Rui Rio ganhou o partido com 52% dos votos, terá mesmo de integrar figuras que estiveram do outro lado da barricada a apoiar Santana Lopes?

Não tenho dúvida de que o vai fazer.

O primeiro desafio eleitoral serão as europeias. O líder deve dizer já quem deverá protagonizar esse combate. Santana Lopes é uma boa opção?

Essa é uma matéria que cabe em exclusivo ao líder resolver.

Houve críticas na bancada à decisão de Rui Rio em não querer a continuidade de Hugo Soares como líder parlamentar...

Eu penso que todos os deputados do grupo parlamentar do PSD compreendem que, não estando o líder do partido sentado na bancada, na liderança do grupo parlamentar deve estar alguém da total confiança e em total sintonia com o líder e ter a confiança dos seus pares.

Que papel estará reservado a Passos Coelho no PSD?

O PSD no seu conjunto tem uma dívida de gratidão muito grande para com Pedro Passos Coelho, que continua a ser muitíssimo estimado no partido. E a história e o distanciamento histórico encarregar-se-ão de pôr ainda mais em relevo a importância decisiva que ele teve. É um ativo valioso do PSD.

No congresso vão exigir a Rui Rio que clarifique que compromissos estará disposto a fazer com o PS. O líder deve dizer, por exemplo, como votará o Orçamento do Estado para 2019?

O PSD é, por força das realidades, um partido na oposição. Será uma oposição construtiva. Vai ser uma oposição mais ambiciosa que não se vai contentar com o poucochinho que parece contentar o governo socialista. É um governo que se limita a cumprir serviços mínimos. E a oposição do PSD tem de mostrar ao país que é possível e que é necessário fazer muito melhor. Se perguntar à maior parte dos portugueses, está instalada a ideia de que Portugal é um país pequeno na Europa e não é verdade. Portugal em termos de população está na primeira metade da média europeia. Portugal está um país pobre mas não estamos condenados à pobreza vitalícia.

Mas o governo tem estado a apresentar resultados, nomeadamente a nível do crescimento económico...

O governo tem feito muito boa propaganda. Vou dar-lhe dados objetivos e indesmentíveis: nos últimos dez anos, Portugal divergiu da média europeia em termos de rendimento dos portugueses, da riqueza produzida. Divergimos seis pontos. Portanto, não convergimos, divergimos. E as perspetivas para agora, para 2018 e para 2019, continuam a ser de divergir da Europa, ou seja, nós vamos crescer menos do que a média europeia, este é que é o ponto! Como é que o país pode estar feliz, bem-disposto, acomodado, pintado de cor-de-rosa, se estamos a divergir da média europeia?

Mas acha que os portugueses também têm noção disso quando sentem que têm mais rendimento disponível?

Temos de mostrar ao país que já houve tempo - e foi no governo do PSD - em que nos aproximámos da média europeia. Nos primeiros dez anos da adesão à União Europeia, aproximámo--nos 12 pontos percentuais. Nos últimos dez anos, afastámo-nos seis pontos. A grande missão que o PSD tem agora é convencer o país de que não temos de liderar a Europa, mas temos que nos colocar na primeira metade dos países da Europa. O Dr. António Costa, aparentemente, está resignado a uma situação em que vê o país a crescer menos do que a média.

Mas isso tem de ser feito com propostas concretas para convencer as pessoas, não pode ser uma coisa etérea...

Certo, certo. Mas para fazer as propostas é preciso, em primeiro lugar, estabelecer metas, objetivos, ter ambição, e depois é preciso construir as medidas que vão convencer as pessoas de que vamos atingir essas metas. Temos um ano e meio para isso.

A reversão das leis laborais, que o governo parece querer fazer, não coloca o governo socialista ainda mais do lado dos trabalhadores e da classe média?

Estar do lado dos trabalhadores e da classe média é ajudar a pôr dinheiro no seus bolsos. E para isso é preciso criar riqueza. Ora, o Presidente da República sublinhou há dias que o governo anterior - como é que ele disse? abriu um trilho, foi a expressão - abriu um trilho de desenvolvimento e é verdade, lançou as bases, com várias reformas que foram feitas, uma delas a reforma da legislação laboral. O que não podemos permitir é que o trilho se transforme num beco sem saída, como seria regredir na legislação laboral, porque foi justamente com esta legislação que o desemprego tem vindo a cair. Esta legislação laboral deu boas provas. Se pelos frutos se veem as árvores, esta legislação laboral é boa, a avaliar pelos frutos que deu.

O facto de Rui Rio ter admitido apoiar um governo minoritário do PS não fragiliza o PSD e não é o reconhecimento de uma derrota antecipada?

A minha convicção profunda é a de que está ao alcance do PSD ganhar as próximas eleições legislativas. Rui Rio tem um grande potencial eleitoral, como se demonstrou no Porto. Ele ganhou três eleições cada vez com mais votos e com muitas adversidades e muitas críticas internas, e ganhou contra adversários que não eram adversários quaisquer.

Não era mais lógico então só admitir a hipótese de uma vitória do PSD?

Eu acho que ele quis sinalizar que está, acima de tudo, ao serviço do país e que o referencial das decisões dele é o interesse do país. Ninguém pode ter dúvida de que Rui Rio vai trabalhar para ganhar as eleições. Ele não é homem para se contentar com [pausa]...

Ser uma muleta de outro partido, é isso?

Sim, sim. Ele disse-o na apresentação da candidatura.

Acha razoável o PSD equacionar dar o voto favorável ao OE 2019?

Mas o PSD equaciona isso? Não ouvi ninguém do PSD dizer que equacionava isso. Para mim é um não assunto.

As eleições europeias serão o primeiro teste à liderança do Rui Rio?

As eleições europeias são para ganhar.

Como vê o facto de o CDS já ter dito que concorre sozinho às europeias?

Parece-me normal e previsível essa opção.

Natural?

A situação que se viveu há cinco ou há quatro anos era anómala, porque os dois partidos estavam juntos no governo e nesse quadro justificava-se completamente fazer a eleição em listas conjuntas.

Mas a abertura a negociações com o PS não deixa margem a Assunção Cristas para crescer ao centro e à direita?

O PSD tem de se preocupar com o afirmar do seu próprio campo, o seu próprio espaço, as suas próprias ideias, e tem de ambicionar convencer eleitores que já votaram no PSD e desistiram de votar. Temos de ir buscar eleitores que já votaram [no PSD] e faço notar que no PSD já votaram mais de 50% de eleitores.

Em que áreas é que o PSD pode marcar mais a diferença em relação ao PS?

Lendo a moção de estratégia de Rui Rio fica claro que há uma grande prioridade à criação de riqueza, e para isso as nossas empresas têm de ser cada vez mais competitivas, essa é uma grande prioridade. O segundo grande pilar tem que ver com a coesão social, a criação de condições de vida digna para todos os portugueses. O Estado justifica-se sobretudo para ajudar, para apoiar os mais fracos. Essa é uma grande preocupação, digamos, do PSD de Sá Carneiro.

Quais são as áreas em que acha que é possível existir consenso com o governo?

Parece-me que o país tem tudo a ganhar em que se tente um consenso sobre as grandes linhas, as grandes orientações, em matéria de fundos europeus. Como penso que o país tem tudo a ganhar em que se tentem acordos ou orientações sobre as grandes obras públicas, as prioritárias. O PSD é, há muitos anos, um ferrenho combatente pela descentralização. O governo atual diz-se também interessado nisso, mas há um problema que está por resolver e que é essencial: a descentralização não pode servir para atirar para fora do governo responsabilidades que o governo não queira cumprir. Tem de haver um critério de serviço às populações, quem melhor pode prestar o serviço às populações. Em segundo lugar, tem de se garantir que, havendo transferência de responsabilidades, tem que haver uma equivalente transferência de recursos financeiros. E tanto quanto sei, o governo não avançou nada nessa matéria, portanto não é possível haver um entendimento sobre descentralização enquanto não se materializar este princípio de equivalência financeira dos encargos que são transferidos. Resolvido que seja esse ponto, digamos, dos envelopes financeiros, creio que há um caminho a percorrer.

Os fundos europeus devem manter-se ao serviço das empresas?

É preciso aprofundar ainda mais a prioridade que é dirigida à competitividade das nossas empresas, a qual passa por as dotar de bons equipamentos mas também de excelentes recursos humanos altamente qualificados, e aí, digamos, os recursos dirigidos à inovação, à investigação e ao desenvolvimento devem ter um papel crescente.

Como tem avaliado o mandato do Presidente da República, antigo líder do PSD?

O atual Presidente da República prestou um serviço notável à classe política porque veio demonstrar que é possível ser-se político, pertencer à classe política e ser-se amado pelo povo. Os portugueses têm uma relação muito difícil com a sua classe política. A classe política não é normalmente amada pelo povo e Marcelo conseguiu fazer uma exceção.

E na relação com o governo tem sido um apoio?

O Presidente da República está a cumprir o seu mandato com grande equilíbrio na relação com o governo e com a oposição.

E acha que vai manter-se assim com o PSD de Rui Rio?

É o que desejo, o que espero e desejo.

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