"Caso Sócrates podia ter começado quando era primeiro-ministro"
Júlio Castro Caldas recebeu na passada quinta-feira, em Madrid, o Prémio Iustitia. Um galardão que distingue a trajetória profissional dos advogados no âmbito das relações ibéricas. Deputado na década dos 80, antigo bastonário da Ordem dos Advogados, presidiu o conselho de administração de várias empresas, entre elas o BBVA, em Portugal, durante os primeiros anos de atividade.
Que representa este prémio na sua trajetória profissional?
É um prémio que distingue e que não é dado a qualquer um. Fomos poucos advogados que o recebemos, todos colegas que desempenharam funções na profissão muito importantes. O prémio também está a homenagear o advogado que, quando desempenhou funções na Ordem dos Advogados, estabeleceu ligações com os colégios de advogados espanhóis, facilitando o relacionamento profissional.
Como analisa atualmente a investigação judicial em Portugal?
Quer Espanha quer Portugal estão neste momento confrontados com situações de mudança política e casos gravíssimos de corrupção vieram à superfície. As responsabilidades dos inqué-ritos, muito complicados, muito complexos, desabaram sobretudo sobre o Ministério Público e o poder judicial vive com algumas dificuldades.
Em Portugal surgiram nos últimos tempos casos como os vistos gold, BES, Sócrates. Visto de fora, que consideração lhe merece, uma vez que todos eles envolvem figuras da classe política?
Eu uma vez escrevi um parecer no Conselho Superior do Ministério Público, como representante da Assembleia, em que disse que gostaria de viver num país em que o Ministério Público pudesse deduzir uma acusação contra o primeiro-ministro em exercício. Isso significa que na arquitetura constitucional o verdadeiro poder judicial possa fazer o seu papel, qualquer que seja a personalidade. Isso hoje está a acontecer e reforça o poder judicial.
Sente que há agora mais "atrevimento" para se investigar políticos?
Não tenho dúvida. Atrevimento e meios, que antes não existiam. A abolição do segredo bancário permitiu à investigação criminal progredir.
Como viu o caso Sócrates?
Acho que o caso Sócrates podia ter começado ainda quando ele era primeiro-ministro. Estaria o poder judicial a atuar como devia ter sido. Podemos hoje, passado este tempo, e em relação aos dados discutidos, considerar que o inquérito podia ter começado mais cedo. O inquérito devia porventura ter começado por dizer claramente que se estava a investigar o primeiro-ministro em vez de deixá-lo para o fim. Críticas que hoje são fácies de fazer, mas quem tinha de resolver o problema nessa altura lidava com dificuldades ao nível da investigação. Penso que não há interesse em ter um megaprocesso, não temos interesse nenhum em manipular milhares de páginas e dificuldades acusatórias e provatórias. Quanto mais depressa fosse deduzida a acusação, melhor.
Pela sua experiência como ministro, como se lida com as pressões e pedidos de favor?
Posso dizer que alguns desses episódios me aconteceram e é preciso ser o mais formalista possível. O escrupuloso cumprimento das regras formais e processuais é uma barreira de proteção em relação aos pedidos de favor.
Em Madrid