Caso Skripal leva à maior expulsão de diplomatas russos da história
A situação foi bem resumida esta segunda-feira pela primeira-ministra britânica, Theresa May: "Se o objetivo do Kremlin é dividir e intimidar a aliança ocidental, então os seus esforços tiveram um impacto espetacular". Ontem, os Estados Unidos anunciaram a expulsão de 60 diplomatas russos em resposta ao envenenamento com um gás neurotóxico do ex-espião russo Sergei Skripal no Reino Unido. Uma decisão que, até ao fecho desta edição, já tinha sido seguida por outros 21 países (16 deles da União Europeia), num total de mais de 130 diplomatas expulsos, naquela que se diz ser a maior onda de expulsões de representantes russos da história. Moscovo garantiu que a resposta será "recíproca" e decidida por presidente Vladimir Putin.
Esta onda começou no passado dia 14, quando o Reino Unido anunciou a "suspensão de contactos bilaterais" com Moscovo e a expulsão de 23 diplomatas russos (quase metade dos 59 acreditados no país). Três dias depois, a Rússia, que nega o seu envolvimento, respondeu em igual medida, suspendendo ainda a atividade do British Council no país.
O Kremlin classificou ainda como "chocante" e "imperdoável" que o ministro dos Negócios Estrangeiros do Reino Unido, Boris Johnson, tenha apontado diretamente Vladimir Putin como responsável pelo ataque contra o ex-espião russo em território britânico.
Ontem, esta crise diplomática tomou proporções mundiais. Os Estados Unidos anunciaram a expulsão de 60 diplomatas russos e o encerramento do consulado em Seattle, naquela que é a mais dura ação tomada pelo presidente Donald Trump contra a Rússia desde que foi eleito. Numa conversa telefónica mantida com Vladimir Putin na semana passada, Donald Trump não abordou o ataque a Skripal, preferindo dar os parabéns ao presidente russo pela sua reeleição.
Um responsável do Departamento de Estado explicou que 48 dos diplomatas são "agentes de informação conhecidos" a trabalhar na embaixada em Washington e os outros 12 na representação da Rússia nas Nações Unidas, sublinhando que os EUA tomaram esta medida "numa solidariedade inquebrável com o Reino Unido".
Um porta-voz da ONU confirmou que a organização recebeu a notificação de Washington mas que, "dada a sensibilidade" da matéria, só podia confirmar que o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, estava "a seguir atentamente" o assunto.
Enquanto não chega uma retaliação oficial vinda de Moscovo, a embaixada russa nos Estados Unidos colocou no Twitter, pouco depois do anúncio do Departamento de Estado, uma sondagem na qual pedia aos seus seguidores para votarem no consulado norte-americano na Rússia que deveria ser encerrado, dando como hipóteses Vladivostoque, São Petersburgo e Ecaterimburgo. Quatro horas depois do início da votação, já tinham participado mais de 16 mil pessoas e São Petersburgo seguia na frente com 44% dos votos.
Ao final do dia, a Casa Branca quebrou o silêncio sobre este assunto, dizendo que os Estados Unidos gostariam de ter uma relação de cooperação com a Rússia, mas ações como o ataque "descarado" de Moscovo contra um ex-espião russo no Reino Unido impediram isso, disse um porta-voz de Donald Trump, que, ao contrário do habitual, ainda não se tinha pronunciado no Twitter.
Da parte da Europa, nomeadamente da União Europeia, o primeiro passo foi dado ontem pelo presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, que, ao início da tarde, anunciou que 14 Estados membros tinham decidido expulsar diplomatas russos na sequência do caso do envenenamento do ex-espião Sergei Skripal. "Não se excluem medidas adicionais, incluindo mais expulsões, nos próximos dias ou semanas, no quadro de ação coordenada da União Europeia", acrescentou o polaco.
Pouco depois, em declarações ao DN, fonte do Conselho Europeu adiantava que "este número deve crescer nos próximos dias, provavelmente já". O que de facto veio a acontecer: à hora de fecho desta edição 16 países da UE (fora o Reino Unido) tinham anunciado a expulsão de um total de 33 diplomatas russos.
Mas hoje poderão haver mais novidades. O governo belga marcou para esta terça-feira um Conselho de Ministros "restrito" para avaliar se expulsa ou não algum diplomata russo. Segundo o jornal Le Soir, a situação do país é "especial" porque os diplomatas russos estão acreditados em Bruxelas de forma bilateral com a Bélgica, mas também junto da UE e da NATO.
Entre os Estados comunitários (mais uma vez, excetuando o Reino Unido), Alemanha, Polónia e França foram os que tiveram mão mais pesada, expulsando quatro diplomatas russos cada. "É claro que deve haver consequências. Nós, na União Europeia, adotámos, portanto, uma posição inequívoca e estamos lado a lado com o Reino Unido", declarou o ministro dos Negócios Estrangeiros alemão, Heiko Maas, em comunicado.
No total, e aqui contando com o Reino Unido, foi dada ordem de expulsão a 137 russos por parte de 23 países. Além dos Estados Unidos e de 16 países da UE, Ucrânia (13), Canadá (4), Albânia (2), Noruega (1) e Macedónia (1) também participaram nesta retaliação diplomática.
"Juntos enviámos a mensagem de que não vamos tolerar as contínuas tentativas da Rússia de ignorar o Direito internacional e de comprometer os nossos valores", disse ontem Theresa May aos deputados britânicos, congratulando-se com "a grande solidariedade" de aliados e parceiros na União Europeia, na NATO, e nos Estados Unidos.
Solidariedade que também já tinha sido saudada pelo líder da diplomacia britânica, Boris Johnson: "A resposta internacional extraordinária dos nossos aliados é a maior expulsão coletiva de agentes dos serviços de informações russos de sempre e vai contribuir para defender a nossa segurança comum. A Rússia não pode violar as regras internacionais impunemente", escreveu no Twitter.
De Moscovo, a primeira reação veio do Kremlin, com o seu porta-voz a garantir que irão responder de forma "recíproca" às expulsões agora anunciadas. "Temos de analisar a situação. O Ministério dos Negócios Estrangeiros fará a sua análise e vão ser apresentadas propostas ao Presidente sobre as medidas de resposta. A decisão definitiva será adotada pelo chefe de Estado", disse Dmitri Peskov, sublinhando que irão aplicar "como sempre, o princípio da reciprocidade".
Depois, foi o Ministério dos Negócios Estrangeiros russo a defender que Londres colocou uma bomba com efeito retardador nas relações entre UE e Rússia. "Theresa May foi à cimeira da UE pedir solidariedade, mas todos esqueceram que o Reino Unido vai deixar a União Europeia, porque votou o brexit. Quer dizer, o Reino Unido exigiu solidariedade aos países que ficam na UE, mas coloca uma mina nas ações a longo prazo de todos os países que comecem a adotar políticas antirrussas", assinalou Maria Zakharova, a porta-voz da diplomacia de Moscovo.