Caso amoroso entre padre e hacker gera desvio de 500 mil euros

Polícia começou por investigar fraude milionária na Associação dos Filhos do Pai Eterno, da cidade de Trindade, centrados na figura do pároco Robson. Afinal, parte do dinheiro foi gasto a cumprir exigências de uma chantagista que conhecia segredos do religioso.
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Na sexta-feira, dia 21, foi noticiado que o Ministério Público deflagrou uma operação para apurar desvios milionários na Associação dos Filhos do Pai Eterno, a Afipe, instituição ligada à Basílica de Trindade, cidade nos arredores de Goiânia, capital do estado de Goiás, e administrada pelo padre Robson Oliveira.

Os números da ação, chamada Operação Vendilhões, impressionavam: estavam envolvidos 20 promotores de justiça, quatro delegados, 50 funcionários e 68 agentes da polícia em 16 mandados de busca e apreensão em imóveis, alguns de luxo, ligados ao religioso. Mais impressionantes ainda eram os valores envolvidos: 120 milhões de reais, cerca de 20 milhões de euros, desviados.

O último desenvolvimento do caso, entretanto, é ainda mais surpreendente: parte do dinheiro que saiu sem justificação dos cofres da Afipe, que movimentou dois mil milhões de reais (aproximadamente 330 milhões de euros) numa década, foi gasto a pagar três milhões de reais (perto de 500 mil euros) a hackers chantagistas, entre os quais Welton Nunes Júnior, com quem o pároco Robson, de 46 anos, teve um caso amoroso.

Essa chantagem, aliás, foi o princípio da investigação. "Observa-se que os acusados [hackers] foram responsáveis por transmitir as ameaças à vítima [padre], por meio de mensagens em aplicativos e emails. Nessas, disseram os acusados que a vítima possuiria relacionamento amoroso com diversas pessoas, inclusive com o próprio Welton", diz o magistrado Ricardo Prata na decisão em que decide condenar a quadrilha de hackers.

Segundo os investigadores, dois hackers conseguiram invadir o telemóvel e o computador pessoal do padre. As extorsões começaram no dia 24 de março de 2017 quando um deles, sob o nome de guerra Detetive Miami, enviou um email ao religioso a pedir dois milhões de reais (em torno de 330 mil euros) para não revelar informações pessoais dele, entre elas, um suposto caso amoroso. Os hackers diziam que se não recebessem o dinheiro entregariam os registos e a sua posse à imprensa e ao Vaticano.

O padre passou a dialogar com o suspeito mas, em simultâneo, contactou a polícia e acordou, "dissimuladamente", a entrega de parte do dinheiro. A polícia prendeu os chantagistas mas acabou por libertá-los, levando ao agravamento das chantagens. "A vítima sucumbiu às extorsões recebidas e passou a realizar diversos pagamentos aos denunciados, ora sem e ora com o conhecimento da polícia", continua o juiz.

Foi a partir daí que os cofres milionários da Afipe passaram a estar sob o olhar das autoridades. O padre Robson, acusa o Ministério Público, usou parte das doações, que supostamente seriam para construir nova basílica em Trindade, chamada de "capital da fé" na região, para investir noutros negócios, como a compra de imóveis, de propriedades rurais, de cabeças de gado e de emissoras de rádio.

O padre Robson vai responder pelos crimes de apropriação indevida, lavagem de dinheiro, falsificação de documentos, sonegação fiscal e associação criminosa.

O departamento jurídico da Afipe afirma que está a colaborar com as investigações. O padre Robson negou "atividade criminosa", em declarações ao programa Fantástico, da TV Globo.

Sobre a chantagem, a defesa do sacerdote, que está afastado das atividades religiosas, disse ao portal G1 que "o padre Robson foi vítima de extorsão, tendo buscado suporte da Polícia Civil, que monitorizou as transações, culminando na prisão dos extorsionários. Já houve sentença, e os criminosos foram punidos pelo Judiciário com severidade. Não havia qualquer conteúdo verídico como objeto das ameaças".

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