Cascais já aplicou multas de 291 mil euros nas cantinas escolares
A Câmara Municipal de Cascais aplicou, entre 17 de outubro e 31 de janeiro, um total de 291 820 euros em multas à Uniself, a empresa concessionária do fornecimento de refeições escolares (almoços e lanches) nas escolas do 1.º ciclo do concelho. Os valores, que se referem a um total de 1273 infrações registadas, foram avançados ao DN pelo vereador com a pasta da Educação, Frederico Almeida, que revelou ainda que a autarquia já decidiu "obviamente" não renovar o contrato com a empresa no próximo ano letivo, estando já a preparar um novo concurso público que contemplará valores mínimos de pelo menos dois euros por refeição, para "evitar o esmagamento dos preços". Para já, e por conta destes valores, a autarquia "não deverá pagar" à empresa a prestação de fevereiro relativa ao contrato entre as partes, cuja fatura mensal "oscila entre os 180 e os 200 mil euros".
"São infrações muito variadas", conta, "desde o não cumprimento de rácios de pessoal, quantidade de alimentos, [violação de] normas de higiene e segurança, atrasos na disponibilização das refeições aos alunos", ilustrou, acrescentando que o grosso destas ocorrências se registou até ao final de novembro. "Desde dezembro/janeiro tem havido uma diminuição significativa das penalizações e dos incumprimentos por parte da Uniself. Mas continuam a existir alguns, que têm que ver sobretudo com o incumprimento do rácio de pessoal."
A falta de pessoal nas cantinas - existe um número de trabalhadores contratualizado em função das refeições servidas em cada escola - tem sido uma das queixas mais frequentes nas denúncias que têm vindo a público, não só em Cascais como noutros pontos do país, sendo apontada como uma das explicações para o facto de, em várias situações, os alunos se terem deparado com pratos mal cozinhados e com longas filas de espera até lhes ser servida a refeição. Mas Cascais tem estado praticamente sozinha na concretização das falhas reportadas por alunos e encarregados de educação em sanções às empresas de catering.
Em novembro, Palmela foi a exceção a esta regra, ao decidir aplicar, também à Uniself, uma coima cujo valor não foi tornado público, na sequência do que essa autarquia descreveu como "um incidente" em que foi servida comida mal cozinhada em 15 escolas, afetando um total de 800 crianças. Um caso que, como tem vindo a ser habitual, foi denunciado pelas associações de pais.
Já o Ministério da Educação, que em 2017 celebrou o maior contrato público do Estado com esta empresa, num total de cerca de 150 milhões de euros destinados a cobrir três anos de almoços em perto de metade das escolas do 2.º e do 3.º ciclos e secundário do país, continua sem revelar quaisquer dados sobre irregularidades detetadas e sanções aplicadas.
Questionado pelo DN a este respeito, o gabinete do ministro Tiago Brandão Rodrigues limitou-se a recordar que, desde o início do ano, estão em marcha algumas medidas no sentido de promover boas práticas nesta matéria, nomeadamente o reforço das visitas às escolas por equipas de técnicas da Inspeção--Geral da Educação e da Ciência (IGEC). Consequências dessas medidas, situações detetadas, parecem continuar a ser um assunto tabu para o Ministério da Educação.
O DN contactou por telefone a Uniself na sexta-feira à tarde, tendo também enviado várias questões por e-mail ao cuidado da administração da empresa, mas foi informado de que já não seria viável a obtenção de respostas antes da publicação deste artigo.
Francisco Almeida não tem dúvidas de que os problemas que deram origem às multas não aconteceram apenas nas 52 escolas primárias de Cascais. E atribui a ausência de notícias de outras sanções a uma certa tradição de complacência nesta matéria. "Até ao ano passado, o Ministério da Educação não aplicava multas. Se o fazia era em situações muito excecionais. E as câmaras também não. No caso de Cascais, até ao ano passado tínhamos contrato com outro fornecedor e as coisas, não sendo perfeitas, estavam estáveis. Coma entrada da Uniself foi um caos, principalmente nos primeiros meses."
O vereador não pretende "crucificar" esta empresa, considerando que na origem do problema está um "sistema perverso" que, ao basear a contratualização nas ofertas pelo menor preço possível, convida os operadores, "responsáveis por 80% a 90% de refeições servidas no país", a assumirem compromissos "que sabem que não vão conseguir cumprir". No entanto, acrescenta, "existe uma boa parte de culpa por parte das empresas, que esmagam os preços para ganhar os concursos".