A cozinha pedia obras, a casa de banho uma atualização e as paredes tinta fresca, mas nem o peso da idade travou um negócio supersónico. A casa dos irmãos Ferreira, no coração de Lisboa, encontrou novo dono em três dias. "O agente ligou a dizer que ia ativar o anúncio e que através da rede da agência, e dos pedidos de clientes que procuravam uma casa com aquelas características, conseguia antecipar mais de cem visitas." Não foi preciso tanto. O primeiro casal a conhecer o espaço aceitou o valor proposto e ficou com o imóvel. "Não posso dizer que não foi uma surpresa, especialmente porque em 2013 ou 2014 já se tinha tentado pôr a casa à venda e não apareceram mais de duas ou três pessoas interessadas, mas dispostas a pagar muito menos", conta Mário Ferreira ao DN/Dinheiro Vivo..Ainda eram os efeitos da crise, mas a realidade mudou. No ano passado, o tempo médio para vender um imóvel voltou a cair. Em Lisboa, foram precisos, em média, apenas seis meses, contra os nove meses de 2013, mostram dados cedidos ao DN/Dinheiro Vivo pela Confidencial Imobiliário. Esta realidade alastrou a todo o país e reflete não só a maior confiança dos consumidores como um maior poder de compra.."Nos tempos de maior crise, o tempo de absorção de um imóvel aumentou. Esta variável nunca tem variações muito drásticas, mas reflete a falta ou o aumento de liquidez da economia", lembra Ricardo Guimarães, da Confidencial Imobiliário, admitindo que "era esperado que o aumento de liquidez, após a crise, reduzisse o tempo de venda, e isso observou-se"..A redução do tempo que uma casa demora a ser vendida é transversal a várias zonas do país. Em Lisboa, entre 2013 e 2018 registou-se uma redução média de três meses. No Porto, no mesmo período, houve uma redução de cinco meses no tempo médio para venda - eram precisos 11 meses, agora são seis. No Algarve, em 2016, os imóveis para venda chegaram a esperar, em média, 15 meses, e agora são precisos apenas nove.."Refugo que ninguém quer".Mas quem conhece o mercado antecipa novas dificuldades. Não é que o setor volte ao que era nos tempos da crise, mas "há menos casas para transacionar e as que vão estar disponíveis vão ser o refugo que ninguém quer", lembra Luís Lima, presidente da APEMIP, a associação que representa os mediadores imobiliários..O setor da promoção, a par da construção, estima que o mercado precise de 70 mil novas casas para que haja um equilíbrio entre a oferta e a procura. "No próximo ano e meio devem nascer à volta de 30 mil imóveis, mas dentro disso, uma grande percentagem é de segmento médio alto e alto, o que não serve para equilibrar as necessidades", adianta o especialista, que não poupa nas críticas: "Não se incentivou o mercado, criou-se um receio nos construtores e nos promotores que os limitou a investir e o mercado está a parar. Há muito tempo que lançámos o alerta: todos têm de fazer alguma coisa, especialmente as autarquias de Lisboa e Porto", referiu ao DN/Dinheiro Vivo..Não é só. A par da escassez de imóveis que vai começar a abrandar o mercado de compra e venda, Luís Lima admite que os preços altos também terão um papel no abrandamento do tempo de venda de imóveis.."Espero que os proprietários procurem vender os seus imóveis por um valor o mais justo possível para que possam continuar a vender", alerta o presidente da APEMIP..Ricardo Guimarães admite que esta limitação dos valores já está a acontecer de forma natural. "Há um indicador que nós apuramos que diz respeito à revisão de tabelas. Isto é, como acompanhamos a oferta ao longo do tempo, conseguimos perceber o que acontece ao valor e vemos que hoje há uma maior percentagem de proprietários que já estão a rever o valor para baixo", admite o responsável da Confidencial Imobiliário. "Houve um período em que a revisão era para cima, porque viam que havia muita procura e, por isso, subiam o preço pedido. Agora, em Lisboa, 17% dos proprietários tinham revisto o valor em 5% ou 6%, salvo erro", admite..Luís Lima completa: "As notícias que davam conta do aumento dos preços levaram muitas pessoas a achar que tudo o que tinham valia ouro. E, ao contrário do que acontecia há dois anos, até mesmo no ano passado, em que os compradores aceitavam imediatamente o valor proposto, voltou a haver negociação, está-se a voltar à normalidade. E à medida que o tempo vai passar, haverá maior negociação."