Calçado prepara plano estratégico para 2020

Sustentabilidade, qualificação dos recursos humanos e economia digital são as três grandes áreas pelas quais "passará a competitividade" do setor.
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A associação portuguesa de calçado, a APICCAPS, apresenta no próximo ano o seu novo plano estratégico para o setor. A iniciativa não é nova - desde 1978 que a indústria apresenta, regularmente, planos estratégicos -, mas a forma de o conseguir é.

A APICCAPS, liderada por Luís Onofre, decidiu recolher os contributos de mais de três dezenas de especialistas nacionais e internacionais para dar corpo ao novo documento, criando grupos de trabalhado específicos. Sustentabilidade, qualificação dos recursos humanos e economia digital são as três grandes áreas "críticas" pelas quais "passará muita da competitividade futura" do setor.

Com seis meses de trabalho já no terreno, o grupo que se dedica às questões da sustentabilidade é o que está mais adiantado. Paulo Gonçalves, diretor de comunicação da APICCAPS, não entra em grandes pormenores sobre quem participa e o que está já feito, sublinhando, apenas, que foram convidadas personalidades diversas, que incluem cientistas e professores universitários, além de especialistas de moda no plano internacional, para que procurem perspetivar o que será o futuro e incorporem os seus conhecimentos no novo plano estratégico do calçado. Eficiência energética, desenvolvimento de novos materiais e otimização das empresas são, apenas, algumas das temáticas que estão a ser analisadas. "Estamos a trabalhar num documento muito exaustivo, que terá um programa de ação muito bem definido e que será apresentado nos primeiros dias de dezembro", refere Paulo Gonçalves.

O documento conta, ainda, com a colaboração de outros setores da moda, como o vestuário e a joalharia. O mês de outubro será decisivo. Todo o trabalhado desenvolvido desde o início do ano será validado junto de cerca de uma centena de empresários da indústria do calçado. "Desde 1978 que apresentamos planos estratégicos. É uma fortíssima tradição de um setor que, desde sempre, define a sua orientação estratégica em função de uma visão alargada do que serão os desafios do futuro e que fala a uma só voz", diz o porta-voz da APICCAPS.

Miguel Cadilhe, Carlos Costa, Daniel Bessa ou Alberto de Castro são, apenas, alguns dos economistas ligados aos sucessivos planos estratégicos apresentados nos últimos 40 anos. O de 2020, que pretende ser o "plano mais ambicioso alguma vez apresentado na história da APICCAPS", voltará a contar com o contributo especial de Alberto de Castro e da equipa que lidera na Universidade Católica do Porto. Mas Luís Onofre desafiou Manuel Carlos, atual chairman da associação, e que conta com quatro décadas de experiência na liderança associativa, além da passagem pelo ICEP e pelo IAPMEI, para liderar este processo, ficando encarregado de "colar todo este puzzle de propostas" e de o transformar no novo plano estratégico de uma indústria que ambiciona "colocar Portugal na vanguarda" do comércio internacional. "Todos sentimos que a indústria da moda e o retalho estão a sofrer profundas alterações e estamos a recolher contributos de sociólogos e de players internacionais, designadamente italianos, franceses e ingleses, para tentar perceber as megatendências demográficas e de consumo para os próximos 15 ou 20 anos e ver como podemos adaptar-nos a estas novas realidades", frisa Paulo Gonçalves.

Exportações de calçado encolheram em 94 milhões de euros

As empresas portuguesas de calçado exportaram, nos primeiros sete meses do ano, quase 50 milhões de pares de sapatos no valor de 1090 milhões de euros. São menos 94 milhões de euros do que em igual período de 2018, uma quebra de 7,7% em volume e de 7,9% em valor, tendo já, no total do ano transato, as vendas ao exterior caído 3% face a 2017. Números que a APICCAPS desdramatiza.

"Não há nenhum país, nenhuma economia nem nenhum setor de atividade que cresça de forma ininterrupta. Depois de uma década de forte crescimento - as exportações aumentaram praticamente 50% -, é natural este abrandamento", refere Paulo Gonçalves, que aponta os "modestos desempenhos económicos" dos principais mercados de destino dos sapatos portugueses, a par da "profunda alteração" do comércio tradicional, com o "desaparecimento de centenas de lojas de retalho" no centro da Europa. "Estamos, por isso, a fazer o nosso trabalho e a preparar um novo ciclo de crescimento, que esperamos que se inicie já no próximo ano", frisa.

Com uma quebra de 1,1% em quantidade e de 5,1% em valor, a França mantém-se como o grande comprador de calçado made in Portugal, com 9,7 milhões de pares num total de 236 milhões de euros.Mas, em quantidade, são os nossos vizinhos espanhóis que mais compram: 10,3 milhões de pares, mas pelos quais pagaram apenas 94,8 milhões de euros, menos 8,2% e 7,9%, respetivamente. Alemanha e Países Baixos surgem em segundo e terceiro lugar no ranking, com compras de 197 milhões e de 160 milhões de euros cada, montantes que correspondem a quebras de 13% no caso alemão e de quase 11% no holandês. O Reino Unido cai 9,2%, para 63,7 milhões de euros.

É dos mercados extracomunitários que vêm as boas notícias: as vendas para os Estados Unidos crescem 17,6%, para 47,2 milhões de euros, e aumentam 45% para a China, que comprou, neste ano, mais de 17 milhões de euros em calçado português.

Nelson de Souza visita empresas na Micam

Apesar do ambiente económico adverso, 81 empresas de calçado marcam presença na 88.ª edição da Micam, a maior feira de calçado do mundo, que neste domingo arranca em Milão. O ministro do Planeamento, Nelson de Souza, e o secretário de Estado da Economia, João Neves, aproveitam o primeiro dia do certame para visitar as empresas nacionais.

"A promoção comercial externa é a primeira das prioridades para a indústria portuguesa, que coloca no exterior mais de 95% da sua produção. A presença na maior e mais prestigiada feira de calçado do mundo será, uma vez mais, da maior importância", destaca a APICCAPS.

Com mais de 1400 expositores, oriundos de aproximadamente 50 países, a feira de Milão recebe mais de 40 mil visitantes profissionais. Portugal volta a ser a segunda maior delegação estrangeira na feira, a seguir a Espanha.

Foi na última edição da Micam, em fevereiro, que a Universidade Católica realizou os testes cegos a 80 profissionais do setor de 26 nacionalidades distintas, escolhidos aleatoriamente entre os visitantes do certame, e que mostraram que, pela primeira vez na história, a etiqueta made in Portugal valoriza o calçado nacional em 28%.

Indústria investe mais de 140 milhões

Apesar das dificuldades nos mercados internacionais, as empresas portuguesas não param de investir. Só no atual quadro comunitário de apoio e em candidaturas coordenadas pela APICCAPS e pelo Centro Tecnológico do Calçado, foram submetidos projetos que representam um investimento total de 140 milhões de euros, dos quais mais de 95 milhões estão já executados. O restante tem de ficar concluído no próximo ano e meio

"Ser a grande referência internacional da indústria de calçado pela sofisticação e pela criatividade, reforçando as exportações portuguesas alicerçadas numa base produtiva nacional, sustentável e altamente competitiva, fundada no conhecimento e na inovação" é o grande objetivo e que está consagrado no FOOTure, o plano estratégico do setor apresentado em 2013.

A maior fatia do investimento - 52 milhões - vai para a promoção comercial externa. Os projetos individuais englobam quase 50 milhões, investindo as empresas maioritariamente em novos equipamentos (14 milhões estão já executados), em ações de promoção e de marketing internacional e no desenvolvimento de coleções e registo de marcas. Aqui estão já executados projetos no valor de 13 milhões e de 4,5 milhões de euros, respetivamente.

Quanto à digitalização e à indústria 4.0, o calçado propõe-se investir 36,8 milhões de euros até ao final do Portugal 2020, com especial enfoque na "criação de novas formas de interação com o cliente num contexto digital e em rede", na "melhoria da flexibilidade, tempo de resposta, inteligência do negócio e sustentabilidade", bem como na "qualificação do cluster".

Ao todo, estão envolvidas 278 empresas, que representam 14 mil postos de trabalho e geram um volume de negócios anual de 1100 milhões de euros.

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