Calçado português quer conquistar os 9% mais ricos em todo o mundo 

Plano estratégico fixa o mercado potencial em 690 milhões de pessoas, as que têm rendimento anual per capita de 38.500 dólares ou mais. 30% estão nos Estados Unidos.
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A indústria portuguesa do calçado está apostada em "retomar rapidamente, e manter, uma trajetória ascendente nas exportações", através de uma "abordagem cirúrgica" aos mercados, já que os meios ao dispor "não são ilimitados". O novo plano estratégico do setor, que hoje é apresentado, estabelece por isso como "mercado potencial" para os sapatos portugueses os 690 milhões de pessoas em todo o mundo com um rendimento anual per capital igual ou superior a 38 500 dólares. Correspondem a 9,1% da população mundial, sendo que 30% destes consumidores estão nos Estados Unidos e 21,6% na União Europeia. China e Japão só têm 11% e 7%, respetivamente, deste público-alvo.

Os 38 500 dólares, aproximadamente 37 mil euros, correspondem à média do PIB per capita dos países da OCDE em 2020. Definido o alvo potencial, e que é constituído pelos "clientes de classe alta" em cada país, a associação do setor, a APICCAPS, procurou apertar ainda mais a malha do que deve ser o esforço de promoção internacional do setor, identificando 145 cidades com mais de 500 mil habitantes de elevado poder de compra e que devem ser consideradas "janelas de oportunidade prioritárias" para um setor que exporta 95% da sua produção.

Quase dois terços estão concentradas na Europa e América do Norte, e vão desde Montreal e Otava, no Canadá, a Helsínquia, Estocolmo, Copenhaga ou Oslo, na Escandinávia. Nova Iorque, Los Angeles, Dallas, Chicago ou Atlanta são alguns dos exemplos de cidades prioritárias a considerar nos EUA, sendo que na Europa há que contemplar, Madrid, Barcelona, Paris, Lyon e Mónaco, bem como Londres, Manchester, Liverpool, Dublin ou Edimburgo. Há que não esquecer Berlim, Munique, Frankfurt e Hamburgo, além de Milão, Roma e Viena, entre muitas outras.

Da responsabilidade do Centro de Estudos de Gestão e Economia Aplicada da Católica Porto Business School, o novo Plano Estratégico do Cluster do Calçado 2030 é o sétimo documento deste tipo produzido pela APICCAPS. O primeiro foi em 1978, este deveria ter sido lançado em 2020, não fosse a pandemia. Com quatro prioridades claras, ao nível da qualificação, sustentabilidade, flexibilidade e presença ativa nos mercados, a nova visão estratégica para a próxima década decompõe-se em 24 medidas e 113 ações que visam "reposicionar o setor na cena competitiva internacional". Prevê investimentos totais de 600 milhões de euros, dos quais 140 milhões estão já em curso, na área da sustentabilidade, e com o apoio do Plano de Recuperação e Resiliência.

No documento, a que o DN/Dinheiro Vivo teve acesso, o setor assume que pretende reforçar a sua posição como uma das referências do mercado internacional de calçado. "Não queremos que o calçado português se compare com os melhores, queremos que seja um dos melhores. Não queremos tentar fazer tão bem como os outros, queremos que os outros ambicionem fazer tão bem como nós. Para isso, teremos que nos distinguir pela sofisticação e criatividade", pode ler-se.

"Este plano é mais do que uma visão, é um compromisso do setor para aprofundar a sua competitividade no plano internacional e continuar a gerar valor para o nosso país", defende o presidente da APICCAPS, Luís Onofre. O documento apresenta, ainda, cinco projetos âncora - Academia Digital, Inclusão & Responsabilidade Social, Compromisso Verde, Centros de Demonstração e Empreendedorismo de Marca -, áreas de intervenção consideradas "fundamentais no progresso" da indústria.

Constituída por 1500 empresas, responsáveis por 40 mil postos de trabalho, o calçado destina a sua produção a 172 países e pretende, com este "choque estratégico", preparar uma "nova década de crescimento". Este ano, e até setembro, vendeu ao exterior 61 milhões de pares no valor de 1537 milhões, um aumento de 22,5% face ao período homólogo.

E se é verdade que o objetivo é que as exportações "continuem alicerçadas numa base produtiva nacional", que, além de tudo o mais, "favorece a reputação" da indústria junto dos consumidores e "apresenta benefícios em termos de sustentabilidade", não é menos certo que a "escassez de mão de obra" é um problema que agrava os custos de produção. E, por isso, o plano admite que há que "explorar as possibilidades de obter ganhos de eficiência nas cadeias de abastecimento recorrendo à subcontratação internacional, total ou parcial, de produtores que possam garantir menores custos [de produção]".

"É importante que as empresas portuguesas e calçado não se circunscrevam à mera atividade fabril, ganhando competências de gestão das cadeias internacionais de valor", lê-se no documento, que sublinha tratar-se de um caminho "em que a maioria dos nossos principais concorrentes europeus vai bastante mais adiantado".

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