Parece sintoma da era da televisão (e das redes sociais), que se confunda o destino de determinados produtos culturais. No caso, a fronteira entre o que é do domínio da televisão, e o que é objeto cinematográfico está praticamente vulgarizada..O documentário Vontade de Vencer, sobre o músico Anselmo Ralph, que chega às salas esta semana, representa um exemplo evidente dessa transferência que se tem vindo a fazer entre os meios..Vale a pena analisar. Ao assistir ao filme - que, sem espanto, é realizado por um profissional da televisão, André Banza - percebe-se que nada aqui é particularmente repreensível, nos aspetos técnicos ou formais: é um documentário que apresenta todos os requisitos, desde entrevistas diversificadas a uma cuidadosa montagem..E mesmo o biografado, enquanto fenómeno musical de massas, tem a sua singularidade. A questão problemática coloca-se apenas no facto de se transferir um modelo competente na televisão para a sala de cinema. Isto é, usar o cinema como arma de promoção e arena do espetáculo mediático (na senda de um Justin Bieber: Neve rSay Never?)..Além disso, que idade tem Anselmo Ralph? 34 anos. Não será demasiado cedo para se montar uma aparatosa estrutura de abordagem biográfica, em torno da sua imagem artística e pessoal? Naturalmente, e simpatizando com a personalidade em causa, interessa conhecer parte do seu percurso - um angolano, filho de diplomata, que acaba por fazer os seus estudos superiores em Nova Iorque -, ou a doença neuromuscular que lhe afeta as pálpebras (daí o uso permanente de óculos de sol)....Mas será sempre, e univocamente, papel da televisão partilhar este tipo de conteúdos, como respeitável peça de reportagem, caso contrário, toma-se o cinema como refém de modas - que já o é -, desvalorizando a sua premissa básica.