Cada cabeça sua pátria no Dia de Portugal e de Camões

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A pátria é só uma, mas a ideia dela é de cada um

Oiça-se Odete Santos, comunista, quando se lhe pede uma ideia de Pátria: "Ai, é melhor não dizer!" Depois, sem que na verdade seja preciso insistir, lá explica o que "é melhor não dizer": "Lembra-me aquela coisa fascista do "Deus, Pátria, Família." E portanto, quando se insiste, a ex-depu- tada comunista e presidente da Assembleia Municipal de Setúbal, que ontem acompanhou durante todo o dia o Presidente da República nas celebrações do Dia de Portugal, diz que a ideia de pátria a remete para o hino. E começa a cantarolá-lo, numa versão antiga. "Família? Não!"

Depois oiça-se João Bénard da Costa, cineasta, figura de proa, durante a ditadura, da esquerda católica que combateu Salazar. "Pátria é uma ideia de família. De lar, da nossa casa, com os nossos pais, com a nossa história. É uma ideia de passado mas também uma ideia de futuro - as famílias também se renovam".

E aqui onde entram dias como o 10 de Junho? "São rituais, são símbolos importantes, nas famílias também existem rituais, como os almoços de Natal."

Razão tem Viriato Soromenho Marques, filósofo, ex-presidente da Quercus. "As pátrias implicam uma construção. São uma obra de arte e não uma obra da natureza. E sempre em permanente renovação: para uma pátria não há idade de reforma."

Perante a actualidade, o filósofo reconhece "uma certa apatia cívica" porque "há muito que Portugal tem mais de memória do que de futuro".

O que, acrescenta, de certa forma até é natural: "Não há nenhum país tão pequeno que consiga ter a sua língua espalhada pelo mundo como Portugal tem. Nenhum país imperial de dimensões semelhantes à nossa conseguiu isso. Veja a Holanda, por exemplo, esteve pelo mundo todo mas a língua não se espalhou. Só quem conseguiu isso foram grandes nações, como a Espanha ou a Inglaterra. O caso português é absolutamente único."

Por isso "falta um projecto". E depois diz qual é o "projecto": "Discutir a Pátria é discutir a Europa, Portugal na Europa." Portanto, mais uma vez Portugal é um país que parece só conseguir imaginar-se fora das suas fronteiras.

Ora pela Europa anda José Mourinho, há muito anos. Nado e criado em Setúbal, o treinador de futebol que os ingleses conhecem por the special one compareceu ontem num almoço convocado pelo Presidente da República (ele e vários outros VIP dos distrito, como Dulce Pontes, o cantor e compositor Toy, os motards Ruben Faria e Hélder Rodrigues, entre outros, todos exemplos de portugueses bem sucedidos no estrangeiro).

Falando ao DN, explicitou como a ideia de pátria se cria de fora para dentro: "Estar aqui [em Portugal] faz- -me diluir a ideia de pátria. É lá fora que penso mais nisso." E depois foi submerso por jornalistas que o queriam a comentar o "deserto" do ministro Mário Lino.

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