Cabelos 'vintage', barbas e navalhas em tempos de festival
Rich veio de Manchester, Inglaterra, para visitar Portugal e aproveitou para vir até ao passeio marítimo de Algés. Queria ouvir Interpol, Artic Monkeys, Black Keys e The Libertines. Foi entre concertos que cortou o cabelo e aparou a barba na Figaro's Barbershop Lisboa. O antes e depois? "Bastante diferente", revela ao DN. Porquê cortar o cabelo num festival de música? "Precisava de um corte e pensei, já que aqui estou...", explicava hoje ao cair da noite Rich, de 43 anos.
Os barbeiros de serviço nos três dias de NOS Alive são Fábio Marques e Salvador Rodrigues, que há cerca de dois meses e meio lançaram a Figaro's Barbershop em Lisboa, na rua do Alecrim, entre o Chiado e o Cais do Sodré. Fábio contou ao DN como, em pequeno, vivia por cima de uma barbearia de Lisboa, onde acompanhava o pai e gostava de brincar: "Isso influenciou-me."
Corta cabelos desde os 15 anos, inicialmente só em casa, a amigos. Depois, foi aprendendo e aperfeiçoando o ofício em várias barbearias de Lisboa e de muitos dos países onde viveu: Holanda, Bélgica, Dinamarca e Estados Unidos. Até há pouco tempo era consultor fiscal. Agora, e pela primeira vez, aquilo que melhor sabe fazer é o seu ganha-pão. A barbearia Figaro's tem sido alvo de algumas críticas que acusam Fábio e Salvador de machismo, por não serem permitidas mulheres dentro do espaço (em horário de trabalho é estritamente proibido, de portas fechadas, a barbearia recebe por vezes jornalistas e curiosas).
Fábio diz que está contido no conceito que guia o projeto que este seja um espaço onde os homens "possam privar sem a presença das mulheres". "Quando cortava cabelos em casa, bastava entrar uma rapariga, fosse a minha irmã, fosse quem fosse, o ambiente mudava completamente. Todos os homens precisam de um momento de privacidade, de estar só entre eles. Quando o homem corta o cabelo, está a mudar a sua imagem, está a desconstruir qualquer coisa e a construir algo novo.", explica ao DN. Quanto à curiosidade que muitas mulheres têm demonstrado ("o fruto proibido é o mais apetecido"), Fábio é imperativo: "Aquilo não é um museu, é uma barbearia."
As idades dos clientes? O espetro é largo. Principia nas crianças, a propósito das quais Fábio logo previne: "As pessoas acham que cortar o cabelo às crianças é muito mais fácil. Não é, é muito mais difícil fazer-lhes um corte perfeito, são muito irrequietas." O limite de idade: "A regra é: desde que eles consigam entrar lá dentro e pedir o que querem..."
Fábio e Salvador fazem cortes que recriam os looks dos anos 20 aos anos 50, ambos dizem já ter um estilo vintage antes de abrirem a barbearia. Quando é lançada a pergunta acerca do revivalismo que involve as práticas da barbearia, Fábio corrige com prontidão: "Renascentista, não revivalista."
Aparentemente, a visita ao passado não deixa incólume a vida daqueles que passam pelo número 39 da rua do Alecrim. "Um advogado ganhou um caso em tribunal e tem a certeza de que o cabelo lhe deu confiança naquele dia. Foi ele que disse", conta o barbeiro ao DN.
"Ser barbeiro é tratar as pessoas. Historicamente, o papel social do barbeiro é muito importante. Antigamente só os médicos, os barbeiros e os alfaiates tinham contato com a intimidade de um homem." Ainda acerca da importância histórica do ofício, Fábio recorda que, de algum modo, os barbeiros foram, durante muito tempo, também enfermeiros: "Arrancavam dentes, cosiam e tiravam pontos."
A lição acerca da história do ofício continua quando Fábio associa tatuadores e barbeiros. Estranho? "Os navegadores levavam sempre barbeiros para arrancar dentes e assim. Quando começaram a ter contacto com as tribos que faziam tatuagens, foram os barbeiros quem as começou a fazer, por causa dos meios de esterilização que tinham." Foi desse modo que os barbeiros foram, durante muito tempo, os principais cúmplices de uma "arte clandestina".
No stand da Figaro's do NOS Alive cortar o cabelo e a "barba a navalha com toalha quente" custa 20 euros. Na própria barbearia são 25 euros.