Programa dos Vistos Gold é ameaça à segurança da UE

A Comissão Europeia considera que os esquemas de venda de cidadania e residência, conhecidos como "vistos gold" constituem uma ameaça à segurança e integridade coletivas da UE. Portugal está entre os países com vários "domínios problemáticos".
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Num relatório divulgado esta quarta-feira em Bruxelas, a Comissão Europeia afirma que os esquemas de venda de cidadania e residência, conhecidos como "vistos gold", são "deliberadamente comercializados" e identifica diversos riscos, considerando que está em causa a segurança, branqueamento de capitais, a evasão fiscal ou transparência e informação.

O relatório aponta a "falta de informações claras sobre as modalidades de funcionamento dos regimes, nomeadamente quanto ao número de pedidos recebidos, deferidos ou indeferidos e o país de origem dos candidatos". Além disso, os Estados-membros "não procedem ao intercâmbio de informações sobre os candidatos a esses regimes, nem se informam mutuamente dos pedidos indeferidos".

Os riscos desta prática, principalmente para os outros países da UE, são mais que muitos, como fez questão de sublinhar a comissária da Justiça, Věra Jourová, durante a apresentação do relatório.

"Adquirir a nacionalidade de um Estado-membro significa também tornar-se um cidadão da UE com todos os direitos correlativos, nomeadamente em matéria de livre circulação e de acesso ao mercado interno", alertou, vincando que "quem obtiver uma nacionalidade da UE deve dispor de um vínculo real com o Estado-membro em causa".

No relatório, a Comissão salienta que "muitas vezes" estes programas são "explicitamente anunciados como uma forma de obtenção da cidadania da UE", com especiais referências à Bulgária, Chipre e Malta. Bruxelas considera que estes países desrespeitam a legislação da União Europeia ao venderem passaportes sem exigir que os requerentes vivam no seu país.

Neste âmbito, a comissária pede "uma maior transparência quanto à forma como a nacionalidade é concedida e uma maior cooperação entre os Estados-membros. Não deve haver qualquer elo fraco na UE, que permita optar pelo regime menos rigoroso".

"Dominios problemáticos" em Portugal

Bruxelas considera que os esquemas de obtenção de residência a favor dos investidores, "também suscitam riscos de segurança para os Estados-membros e para a UE no seu conjunto".

"Qualquer autorização de residência válida confere aos nacionais de um país terceiro não só o direito de residir no Estado-m membro em causa, como também o direito de livre deslocação no espaço Schengen", lê-se no relatório

Portugal encontra-se entre o grupo de 20 Estados-Membros com esquemas de vistos gold, em que também se incluem Bulgária, República Checa, Estónia, Irlanda, Grécia, Espanha, França, Croácia, Itália, Chipre, Letónia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Países Baixos, Polónia, Roménia, Eslováquia e Reino Unido.

Bruxelas considera que, nestes países, a aplicação das normas europeias, para a obtenção de vistos "pauta-se pela falta de informações (...) e os Estados-membros dispõem de poderes discricionários quanto à abordagem por eles adotada em matéria de segurança"

No relatório considera-se ainda que as autorizações de residência "obtidas em virtude de um investimento, que exijam apenas uma presença física limitada ou mesmo nula do investidor no Estado-membro em causa, são suscetíveis de ter um impacto na aplicação do estatuto de residente de longa duração na UE e dos direitos a ele associados, podendo mesmo assegurar um procedimento acelerado para a obtenção da cidadania nacional e, por conseguinte, da cidadania da UE".

O documento realça a "falta de transparência e supervisão destes regimes", nomeadamente "em termos de monitorização, e a ausência de estatísticas sobre o número de pessoas que obtêm uma autorização de residência através dos referidos regimes".

Pouco ambicioso

O relatório é o mais completo feito até hoje pela Comissão Europeia relativamente ao impacto dos esquemas de venda de cidadania e residência, porém os observadores da organização Transparência Internacional e os da Global Witness alertam que o relatório da Comissão "está aquém das medidas urgentes necessárias".

Numa nota divulgada em Bruxelas, a ativista Naomi Hirst saúda o reconhecimento de "riscos inaceitáveis ​​de segurança e corrupção", criados pelos "vistos gold", mas lamenta que o relatório da Comissão "nada diga sobre o que os Estados-membros realmente precisam fazer".

"Agora que eles [a Comissão Europeia] dispararam as campainhas, precisam oferecer soluções ", afirmou Naomi Hirst, considerando que "agora é altura de os Estados-membros assumirem a responsabilidade".

A antecipar-se à divulgação do relatório, o governo búlgaro anunciou ontem que pretende suspender o seu esquema de vistos.

Grupo de especialistas

No relatório afirma-se que a Comissão vai convocar um "grupo de especialistas" de todos os Estados-membros para enfrentar riscos dos programas de "vistos gold" e preparar um conjunto de medidas de segurança até o final de 2019.

Mas os ativistas da Global Witness e da Transparencia International consideram que "as medidas não são adequadas" e pedem "ações mais rigorosas e uma aplicação em toda a UE dessas normas".

Em Bruxelas

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