Bruxelas dá à Polónia um mês para recuar na reforma da justiça

Comissão Europeia entende que está em causa a independência política do Supremo Tribunal e ameaça punir Varsóvia
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A Comissão Europeia intensificou ontem a pressão sobre a Polónia, admitindo medidas excecionais e sem precedentes, que podem ir até à perda de poderes do país no principal órgão de decisão da União Europeia. A promessa de veto presidencial a duas leis polémicas, sobre o poder judicial, não convenceu Bruxelas, que dá um mês para que o governo polaco responda às "graves preocupações" da Comissão.

O assunto voltou a estar em destaque na reunião do colégio de comissários. Jean-Claude Juncker garantiu que "a Comissão está decidida a defender o Estado de direito em todos os Estados membros", já que os tratados o definem como "um princípio fundamental sobre o qual a União Europeia é construída".

O presidente da Comissão frisou ainda que "um poder judicial independente é uma condição prévia e essencial para a adesão à União". E, por essa razão, a UE "não pode aceitar um sistema que permita demitir os juízes à vontade", esclareceu Juncker, referindo-se ao polémico pacote legislativo, que Andrzej Duda promete vetar. "Não iremos tolerar chantagens por parte de Bruxelas, principalmente chantagens que não são baseadas em factos", afirmou Rafal Bochenek, porta-voz do governo de Varsóvia em declarações à agência PAP, acrescentando, no entanto, que a Polónia está disponível para conversar.

A decisão do presidente polaco poderá ainda ser revertida no parlamento nacional, bastando uma maioria qualificada. Mas, Bruxelas está preparada para agir, no caso do governo polaco prosseguir com a "destruição da independência do poder judiciário e do Estado de direito na Polónia", prometeu Juncker, asseverando que a Comissão "não terá outra escolha além de desencadear o artigo 7º". Este artigo foi elaborado em 1998 e estabelece o conjunto de procedimentos que deverão ser acionados quando um Estado membro põe em causa o conjunto de valores sobre os quais é fundada a UE, definidos pelo artigo 2.º do Tratado de Lisboa, nomeadamente o do "Estado de direito".

Em caso de violação de algum dos princípios fundamentais, uma "maioria qualificada" dos Estados membros "pode decidir suspender alguns dos direitos decorrentes da aplicação dos Tratados", incluindo o "direito de voto do representante do governo desse Estado membro no Conselho".

É esta a ameaça sem precedentes que pende sobre as autoridades polacas, depois de terem proposto legislação que permitiria a destituição dos magistrados membros do Supremo Tribunal. Na semana passada, os protestos contra esta medida intensificaram-se, forçando o presidente a prometer o chumbo à decisão polémica do governo.

No entanto, ignorando as recomendações de Bruxelas, num processo que se iniciou em 2016, Andrzej Duda aprovou uma lei que permite ao ministro da Justiça mexer nas lideranças de tribunais inferiores. Ontem, o presidente da Comissão fez questão de salientar que "os tribunais independentes são a base da confiança mútua entre os Estados membros e os sistemas judiciais", dando ainda a entender que Bruxelas pode não ter alternativa a não ser propor a retirada de poderes da Polónia, no Conselho Europeu.

"As nossas recomendações às autoridades polacas são claras. É hora de restaurar a independência [dos tribunais] e retirar as leis da reforma do poder judicial ou alinhá-las à Constituição polaca e à política europeia", exigiu o primeiro vice-presidente da Comissão, Frans Timmermans, apelando à "independência judicial", na Polónia.

"Queremos resolver estas questões em conjunto e de forma construtiva. A mão da Comissão continua estendida às autoridades polacas para o diálogo", disse Timmermans, lembrando que a UE conta com os tribunais de "todos os Estados membros" como um "recurso efetivo, no caso de violação da legislação da UE".

Em Bruxelas

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