Brasil às cegas discute causas do apagão

A explicação inicial de que o mau tempo foi responsável por 18 estados terem ficado sem luz não convenceu todos. Governo suspeita  de excesso de produção e sobrecarga do sistema.
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Quem viu pela televisão, na terça-feira, as declarações do ministro das Minas e Energia do Brasil, Edison Lobão, pouco depois de ter sabido que 18 estados estavam em pleno breu, num novo episódio de apagão, viu um homem atrapalhado e inseguro. Por isso, as palavras de que essa "falta de energia" se devia ao "mau tempo" perto da barragem de Itaipu, no rio Paraná, responsável por abastecer o sistema interligado de electricidade do Brasil, não convenceram. Depois, o episódio expôs a fragilidade do sistema eléctrico brasileiro e inaugurou uma crise política.

O ministro do Planeamento, Paulo Bernardo, veio a público desdizer a explicação da "tempestade" de Lobão, seguido de meteorologistas e vários especialistas. Esse "mau tempo" não era capaz de derrubar as linhas de transmissão, alegavam. E, depois, se tivesse derrubado, porque é que o abastecimento foi retomado no dia seguinte?

Apesar de o Presidente Lula da Silva ter desviado as atenções de que "este apagão" era diferente do "outro", referindo-se ao de 2001, na presidência de Fernando Henrique Cardoso (ver caixa), a mensagem ajudou a reforçar a "desconfiança" e a tese de que "essa história de apagão", afinal, estava a ser "mal contada". Até porque, há duas semanas, a chefe da Casa Civil, Dilma Roussef, favorita pelo Partido dos Trabalhadores às eleições de 2010, e ex-ministra das Minas e Energias do primeiro governo Lula, garantira que o país "não sofreria mais apagões". Esta semana ouvimo-la admitir o contrário.

Se o Brasil já vivia, sobretudo, desde 2001 sob o estigma de um novo apagão, agudizado pelo facto 90% da energia eléctrica ser produzida por hidroeléctricas, tornando o sistema dependente da pluviosidade, agora a evidência de um sistema eléctrico "frágil", não deixa dúvidas de que "vai acontecer", de novo. Pior: o Governo está à deriva em disputas políticas, sem nenhuma solução. Dilma e Lobão chegaram mesmo a dar "o caso como encerrado" e que este "não foi um apagão, foi um blackout".

Segundo os especialistas, há outro problema persistente: a falta de investimento e o ritmo acelerado de crescimento do país vão fazer com que a matriz energética derrape seriamente. Resultado: "Apagão." Só que um país como o Brasil, agora com a responsabilidade de ser sede, em 2014, do Mundial de Futebol, e anfitrião dos Jogos Olímpicos, em 2016, não pode desleixar-se num bem essencial, por "falta de investimento" ou "planeamento".

É certo que nos últimos anos tem havido uma "séria discussão" para diversificar a matriz energética. Só que falta o mais importante: legislação. Com o episódio desta semana ficou provado que o sistema de abastecimento de energia está "exposto", conforme afirmou Osmar Pinto Júnior, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Para este especialista em descargas atmosféricas o problema "é técnico".

Os técnicos, por outro lado, dizem que "não houve nenhum problema". Furnas, empresa responsável pelas linhas de transmissão de Itaipu, alegou não ter detectado quaisquer irregularidades. E o director da hidroeléctrica, Jorge Samek, explicou que o apagão "não teve origem na geração de energia". Só que o Governo brasileiro está desconfiado de que tenha havido excesso na produção de energia, gerando sobrecarga no sistema. Por isso, para Lula "o caso não está encerrado".

O emaranhado de contradições fez com que o Ministério Público Federal tenha aberto um processo para determinar as causas e as responsabilidades pelo apagão. O Governo tem até segunda-feira para explicar o que aconteceu. Só que falta resolver o mais importante: como erradicar de vez a palavra "apagão" do futuro do Brasil.

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