Branco sobre azul

No Norte do país preferem-no rosa e branco. No Sul, azul e branco. A diferença está no pigmento. Fora isso, o sabão que faz parte dos cheiros da nossa infância está para lavar e durar. E o seu consumo em franco crescimento.
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O sabão azul e branco responde pelo improvável nome técnico de «sabão offenbach», uma espécie de cartão-de-visita para impressionar quem se interessa por nomes sonantes - neste caso, o da cidade alemã homónima onde terá tido origem. À parte isso, é o sabão mais português que existe, com todas as contradições implícitas em tal opção. Visto de fora, é uma amálgama concreta de ingredientes naturais, cujo maior peso provém dos quase cinquenta por cento de matéria gorda que o diferenciam de outros sabões e sabonetes. Não deixa de ser curioso pensar que um produto vocacionado para combater a sujidade - nódoas de gordura, por exemplo - comporte em si mesmo as causas do problema; mas esse é um paradoxo antigo, proveniente de épocas remotas em que o azeite se usava para lavar o corpo. Não consta que alguém tenha sujado as mãos por causa disso. Mais interessante, porém, é o sabão azul e branco quando visto por dentro, após golpe de lâmina certeira. É aí que perde a faculdade de ser apenas concreto e se revela em imprevisíveis nuances e ramificações marmóreas, que tanto lembram os contornos da deriva dos continentes como as formações nebulosas do céu. Esta poética da reconstrução das formas é algo que nenhum detergente em pó consegue reproduzir, por mais sofisticado que seja. Contrariando todos os prognósticos, falta dizer que o sabão azul e branco está para o Sul de Portugal como o seu equivalente rosa e branco está para o Norte; onde, por tradição, regista maior número de adeptos. De um sabão português é lícito esperar todas as contradições.

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