Boris Johnson não quer mas o Brexit deve ser mais uma vez adiado
A data para o Brexit permanece desconhecida, após mais uma reviravolta em solo britânico. No chamado SuperSábado, Boris Johnson viu o Parlamento britânico aprovar uma extensão do prazo para a saída do Reino Unido da União Europeia. Contrariado, o primeiro-ministro comunicou ao Conselho Europeu esta decisão, mas fê-lo numa carta em que não colocou a sua assinatura. Mas Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu, recebeu uma segunda carta, já assinada por Boris Johnson, em que este dava conta de que o acordo alcançado com Bruxelas é o ideal e que o dia 31 de outubro devia manter-se para o Brexit. Cabe agora aos restantes 27 Estados da UE decidir se aceitam um adiamento, o que só deverá ser conhecido dentro de uma semana.
O dia devia ser decisivo no Parlamento britânico, depois de os deputados terem sido chamados a debater a um sábado pela primeira vez em 37 anos (a última vez foi por causa da guerra das Falkland, Malvinas). Mas, na última reviravolta para o Brexit, a Câmara dos Comuns impôs mais uma derrota ao primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, que acabou por não pôr a votação o seu acordo de saída da União Europeia.
Os deputados britânicos aprovaram a chamada emenda Letwin, apresentada pelo deputado Oliver Letwin (ex-conservador expulso do partido no mês passado). Esta emenda obriga a adiar a votação significativa sobre o Brexit para depois de ter sido apresentada a legislação que possa garantir a aplicação do acordo, o que na prática obriga o primeiro-ministro a pedir à União Europeia uma nova extensão do prazo de saída. Mas Johnson parece decidido a não ceder e escreveu no sábado à noite aos deputados conservadores, antecipando o que iria comunicar a Bruxelas, garantindo que a sua opinião é aplicar a 31 de outubro a saída do Reino Unido da UE: "Não vou negociar um adiamento com a União Europeia. Vou dizer à UE o que disse aos britânicos durante os 88 dias como primeiro-ministro: mais atrasos não são uma solução."
Na reação ao resultado da votação (322 votos a favor e 306 contra), Johnson começou por dizer de imediato que não iria negociar com Bruxelas e que a lei não o obriga a isso. "Eu não vou negociar um adiamento com a União Europeia e a lei não me obriga a fazê-lo", disse Johnson aos deputados, alegando que o voto significativo "foi esvaziado de sentido" por causa da nova emenda.
Ao final do dia, Boris Johnson falou com Donald Tusk ao telefone e comunicou que enviaria mesmo uma carta a dar conta do resultado da votação no Parlamento Europeu. De forma bizarra, acabou por enviar uma missiva formal, a informar do sucedido no Parlamento, com uma cópia da lei Benn, carta que no final tinha como autor o primeiro-ministro do Reino Unido.
Numa segunda carta, em tom mais informal, Boris Johnson dirigia-se diretamente a Donald Tusk e garantia que não tinha mudado de opinião: o acordo para o Brexit é bom e deve ser cumprido na data prevista. Avisava que um adiamento iria prejudicar os interesses do Reino Unido e da UE. Assim conclui que a UE não deve adiar.
Há ainda uma terceira carta, transmitida por Sir Tim Barrow, representante do Reino Unido em Bruxelas, explicando que a carta inicial enviada [e não assinada por Boris] traduz a posição do Parlamento britânico e não do governo.
Donald Tusk confirmou, no Twitter, ter recebido o pedido de extensão do Reino Unido.
Ao que o DN apurou junto de fontes contactadas em Bruxelas, a União Europeia "não deverá criar entraves", mas também "não daria o primeiro passo" para este adiamento solicitado. A autorização para a extensão do artigo 50.º também "não será imediata", mas o mais tardar "até ao próximo fim de semana" haverá uma decisão em Bruxelas.
Para este domingo está marcada uma reunião da União Europeia a 27, ao nível dos embaixadores, para começar a fazer o trabalho preparatório para uma cimeira de líderes, que deverá acontecer numa data a ser anunciada por Donald Tusk.
Será nesse encontro, que deverá ser agendado para domingo da próxima semana (27 de outubro), que os 27 vão votar a provável extensão do período de permanência do Reino Unido na União Europeia.
O líder da oposição, Jeremy Corbyn, reiterou que Boris Johnson era obrigado por lei a enviar a carta a Bruxelas. Em causa a lei de saída da União Europeia, apelidada de lei Benn, que foi aprovada pelos deputados para tentar impedir Johnson de sair sem acordo. Esta diz que o governo tem de garantir, até 19 de outubro, que um acordo passou no Parlamento ou ter a luz verde dos deputados para sair sem acordo. Se isso não acontecesse, obrigava o primeiro-ministro a escrever à União Europeia a pedir uma extensão no máximo até 31 de janeiro de 2020. Resta saber como o líder dos Trabalhistas irá reagir à forma como Johnson comunicou com Bruxelas.
Quando a emenda foi aprovada, Johnson anunciou que o governo iria apresentar nesta semana a legislação para avançar com o acordo de saída que negociou - pode avançar a partir de terça-feira. Na prática, este não foi rejeitado neste sábado pelos deputados e se todas as leis forem aprovadas até 31 de outubro não há necessidade de qualquer adiamento do Brexit.
Mas o líder do governo na Câmara dos Comuns, Jacob Rees-Mogg, causou confusão ao indicar que o acordo de Brexit seria novamente apresentado a votação já na segunda-feira. Algo que o líder do Parlamento, John Bercow, ainda tem de decidir se aceita ou não.
Não ficou claro se os deputados vão votar o acordo que não votaram neste sábado, com a emenda Letwin ou outro qualquer texto. Só irão descobrir na própria segunda-feira.
O governo espera poder acelerar o processo para aprovar a Proposta de Lei que regula o acordo e põe em prática muitas das disposições previstas no acordo negociado com Bruxelas, nomeadamente os direitos dos cidadãos europeus, a compensação financeira à UE e o protocolo relativo à Irlanda do Norte. Mas o debate na especialidade poderá levar à introdução de emendas que podem atrasar o curso e impedir que esteja concluído até 31 de outubro. .
O debate da proposta de lei sobre o acordo também será uma nova oportunidade para alguns deputados procurarem introduzir uma proposta para um segundo referendo na forma de um "voto confirmativo" ao acordo negociado por Boris Johnson, com a opção de permanecer no Reino Unido. Perante o impasse no parlamento, este cenário volta a ganhar credibilidade. Este sábado, cerca de um milhão de pessoas participaram em Londres numa marcha organizada pela campanha "People's Vote", que defende este caminho.