Birmânia

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Deixemos o simbolismo e olhemos para a primeira visita de um Presidente norte-americano à Birmânia de um ângulo geopolítico. A vocação asiática que Obama e Clinton querem dar à política externa americana tem um duplo carácter: reativo, findas as duas guerras no Grande Médio Oriente e com independência energética a ganhar força, o que justifica a reorientação para a região económica e militarmente mais atrativa; estratégico, como pivô asiático, o que, não sendo novidade sobre a presença americana, pretende desenhar uma arquitetura de contenção à ascensão da China. Japão, Coreia do Sul, Austrália, Indonésia, Tailândia, Vietname, Taiwan, Singapura, Filipinas, Índia são os pilares dessa arquitetura: uns têm garantido confiabilidade, outros são potencialmente vitais para a ambição norte-americana no Pacífico. É aqui que a Birmânia se encaixa. As alterações internas no país-tampão entre a Índia e a China têm sido notáveis no último ano. Em resposta ao alívio das sanções americanas, europeias e australianas, o regime abriu-se às reformas: libertação de presos políticos, imprensa livre, direito a manifestações, eleições. A negociação entre os "reformistas" militares e a oposição civil liderada por Aung San Suu Kyi lembra a Polónia nos anos 1980, entre o general Jaruzelski e Lech Walesa, com a diferença de que falta acautelar: uma Birmânia multirreligiosa e étnica sem violência. Se o rumo se mantiver, 2015 pode ser para a Birmânia o que 1989 foi para a Polónia: a transição para um regime civilista, plural e aberto ao mundo. Ao "Ocidente" (Japão e Austrália incluídos), mas também à Índia, país com que partilha história mas poucos laços económicos. A fuga à dependência chinesa é o objetivo e a Birmânia pode ser o grande legado da diplomacia de Clinton: um país que altera a sua posição face à China com base em reformas económicas e sociais inspiradas no modelo "ocidental". Um feito.

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