Bhopal lembra pior acidente industrial da história

Manifestantes desfilaram ontem pela cidade numa homenagem aos mortos do passado e às "vítimas futuras". Todos os anos continuam a nascer bebés com malformações e o número de doenças crónicas é mais elevado que no resto do país.
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Morreram mais de quatro mil pessoas nas 24 horas que se seguiram à fuga para a atmosfera de gases tóxicos da fábrica de pesticidas de Bhopal, na Índia. O vento que soprava nesse 3 de Dezembro de 1984 espalhou os gases sobre toda a cidade e arredores. Estima--se que o total de mortos desses primeiros dias tenha chegado aos oito mil mortos, embora o Governo de Nova Deli só admita três mil.

A substância tóxica em causa era o isocianato de metila, tendo ficado a pairar sobre a cidade e seus arredores, onde se concentra em bairros de lata a população mais pobre, mais de 40 toneladas daquele produto. O isocianato de metila causa uma morte dolorosa a quem o aspirar, atacando as vias respiratórias até à asfixia; reage também violentamente com a humidade da vista, causando cegueira.

As instalações da fábrica na origem daquele que é considerado o pior acidente industrial da história estão hoje em ruínas, mas estas ainda emitem elementos tóxicos para o ar e, segundo ecologistas indianos, contaminam o solo e os cursos subterrâneos de água. As autoridades locais afirmam que é seguro o consumo desta água, mas a BBC recolheu uma amostra para análises. O resultado revelou que o líquido recolhido continha mil vezes o valor máximo recomendado pela Organização Mundial da Saúde de tetraclorido de carbono, substância que ataca o fígado e pode originar cancro, lia-se ontem no site da estação.

Milhares recordaram ontem, em Bhopal, o dia em que os "ventos da morte", como lhes chamou um dos manifestantes, sopraram sobre a cidade, tirando a vida, até hoje, a mais de 15 mil pessoas e afectando a saúde a cerca de 600 mil.

"Julgamento dos responsáveis e remoção das substâncias tóxicas dos terrenos de Bhopal", gritou-se durante a marcha, em que participaram descendentes das vítimas da tragédia de 1984 bem como alguns sobreviventes.

Um organizador da Campanha Internacional Justiça para Bhopal, Syed Irfan, garantiu que as "pessoas continuam a morrer" com problemas de saúde associados à fuga de gases da fábrica, à época propriedade da americana Union Carbide. "Não podemos esquecer as vítimas do passado nem as vítimas do futuro", insistiu Irfan, explicando que todos os anos nasce um número invulgarmente elevado de bebés com malformações ou com problemas de crescimento. Por outro lado, o número de cancros e outras doenças crónicas situa-se acima da média na Índia.

Cinco anos após a tragédia, a Union Carbide, propriedade da Dow Chemicals desde 1999, pagou em indemnizações a Nova Deli o equivalente a 310 milhões de euros, a valores actuais. Nunca se realizou qualquer julgamento dos responsáveis da fábrica.

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