Bebé com "três pais" nasce no México mas podia ser em Portugal

Presidente do Conselho Nacional defende que caso seria analisado com toda a abertura e com um objetivo: o nascimento de crianças saudáveis. Há cá médicos para o fazer
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Abrahim, agora com cinco meses, nasceu no México fruto de uma técnica inovadora desenvolvida por norte-americanos. É o primeiro bebé do mundo a ter três progenitores, com um tratamento que recorre ao ADN do casal e de uma terceira pessoa, a dadora. A mãe é portadora de genes de uma doença degenerativa. Este é um procedimento que os médicos portugueses estão preparados para fazer e que seria analisado favoravelmente pelo Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida, apurou o DN.

A mãe do rapaz, de 36 anos, teve quatro abortos e perdeu dois filhos, de seis anos e oito meses, antes desta gravidez. Isto porque, embora sendo saudável, é portadora de genes do Síndrome de Leigh, que ataca o sistema nervoso e a mobilidade e que pode ser fatal. Perante esta situação, ela e o marido, ambos jordanos, decidiram procurar ajuda para ter uma criança saudável e encontraram-na na equipa de John Zhang, de Nova Iorque. Só que a técnica utilizada não é permitida nos EUA, razão pela qual tiveram que ir para o México. E Abrahim nasceu a dia 6 de abril, sendo a sua história só agora divulgada. Este procedimento foi aprovado no Reino Unido o ano passado.

Esta técnica, considerada revolucionária pela New Scientist que ontem lhe dedicou uma reportagem, permite que nasçam crianças saudáveis quando a mãe é portadora de genes associados às mitocôndrias, que geram a energia necessária às funções celulares.

A equipa de Zhang removeu o núcleo de um ovócito da mulher e inseriram-no num de uma dadora com mitocôndrias saudáveis e ao qual tinham tirado o núcleo, depois este foi fertilizado com o esperma do marido e colocado no útero da mulher. Os cientistas criaram cinco embriões, dos quais apenas um se desenvolveu, não tendo havido destruição de embriões à partida, uma exigência do casal.
Não é a primeira vez que nasce uma criança a partir do ADN de três pessoas, só que no caso do bebé do México é utilizado material genético em partes iguais: a mitocôndria do óvulo da dadora, o núcleo do mesmo da mãe e o esperma do pai, podendo-se dizer que é a primeira criança com três progenitores. Houve já casos em que, para evitar doenças congénitas, se introduziu material de uma terceira pessoa no óvulo fecundado, só que este continuava a ser o da mãe, técnica que foi desenvolvida nos anos de 1990.

E em Portugal?

Alberto Barros aprova este procedimento e diz que poderia ser feito no seu centro de procriação medicamente assistida (PMA), no Porto, se existisse uma situação semelhante, mas estes são casos raríssimos. "É uma solução inovadora e claramente desejável para evitar a transmissão de doenças que tem origem no ADN das mitocôndrias, que se transmite ao filho". Transmite-se pela mulher, o que significa que não há o perigo do bebé agora nascido no México vir a transmitir a doença da mãe.

O médico é docente na Faculdade de Medicina do Porto, onde desde há dois anos fala aos alunos da técnica agora divulgada pela New Scientist . Alberto Barros sublinha que há o conhecimento técnico e que este procedimento não está proibido em Portugal, mas entende que deveria ser pedido um parecer ao Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida, a entidade reguladora.

Eurico Reis, o presidente daquele conselho, concorda com a necessidade de uma análise deste órgão, o que ainda não aconteceu em relação à técnica praticada por Zhang, razão pela qual acredita que ainda não foi feita no País. Isto porque diz ser prática dos centros de PMA pedir um parecer sempre que usam uma técnica nova. E, sem querer falar em nome do Conselho, diz: "O Conselho tem uma posição incentivadora do progresso científico, desde que não seja uma orientação claramente proibida pela legislação." Acrescenta que esta será uma das exceções referida no artigo 36. º da Lei n.º 32/2006, que pune "quem transferir para o útero embrião obtido através da técnica de transferência de núcleo, salvo quando essa transferência seja necessária à aplicação das técnicas de PMA".

Sublinha Eurico Reis: "Aguardamos que surja uma situação dessa em Portugal e que analisaremos numa perspetiva aberta e favorecedora do nosso objetivo, que é o nascimento de crianças saudáveis".

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