Baixa-Chiado: uma ZER à esquerda
Foi no início de 2020 que Fernando Medina, então à frente dos destinos de Lisboa numa coligação com o Bloco de Esquerda, apresentava aquela que viria a ser conhecida como a ZER da Avenida-Baixa-Chiado.
Propunha-se com esta ZER (Zona de Emissões Reduzidas) a criação de uma zona em Lisboa com inúmeros condicionamentos de acesso automóvel, inclusive para os residentes. Lembram-se seguramente da polémica sobre os 10 convites mensais a que os moradores da ZER teriam direito para receber visitas. As poucas apresentações feitas do projecto causaram apreensão e contestação e, o surgimento da pandemia COVID 19, levou a Câmara a adiar o projecto para depois das autárquicas.
Tal levou a que não fosse feito um debate mais aprofundado sobre a ZER ABC, que permitisse desde logo perceber um engano. O projecto em causa não é uma Zona de Emissões Reduzidas, mas sim uma ZAAC (Zona de Acesso Automóvel Condicionado), e isso muda muita coisa.
Actualmente Lisboa já tem implementada uma ZER, composta por 2 zonas, que cobre o eixo central e a sua envolvente (1/3 da cidade). Nestas zonas só podem circular veículos que respeitem as normas Euro 2 ou 3 em matéria de limites máximos de emissão de poluentes. E são estas as limitações no âmbito da ZER existente, aliás pouco fiscalizadas diga-se de passagem.
O projecto para a Baixa é outro e não tem nada que ver com as ZER. Trata-se, na realidade, de criar uma zona de acesso condicionado, não tão restritiva como aquelas que já existem no Bairro Alto ou em Alfama, mas ainda assim, uma ZAAC. E se dúvidas houvesse, a página internet do projecto é clara: na parte das perguntas frequentes, onde se explica como funciona a ZER a resposta não deixa margem para dúvidas: "o acesso está condicionado aos segmentos autorizados".
Poder-se-ia julgar estarmos perante uma mera questão semântica. Mas não é bem assim.
Enquanto que as ZER são, no Regulamento Geral de Estacionamento e Paragem na Via Pública de Lisboa, apenas um conceito, o mesmo não acontece com as ZAAC. Desde logo, a implementação, extinção ou alteração de uma ZAAC em Lisboa carece, obrigatoriamente, de uma consulta pública, feita nos termos legais, mas também de um parecer vinculativo da Junta de Freguesia territorialmente competente (Artº 17º RGEPVP). Quer isto dizer que, além de se ouvir obrigatoriamente os lisboetas, é essencial o envolvimento e concordância das Juntas de Freguesia abrangidas pela ZAAC, pois no limite uma delas pode bloquear a sua criação, ao não emitir o parecer favorável exigido pelo Regulamento.
Já no que diz respeito às ZER, nenhuma destas condições é obrigatória. Aliás nem estas nem outras pois nada é referido no RGEPVP sobre as ZER tirando a definição do seu conceito. Percebe-se melhor assim o porquê de lhe chamar ZER e não ZAAC. Teria Fernando Medina receio que algum dos Presidentes de Junta lhe bloqueasse o projecto?
Entretanto, nas eleições autárquicas, os lisboetas optaram pela mudança. Mas parece que alguns partidos à esquerda ainda não perceberam isso e querem que o novo executivo de
Carlos Moedas avance com medidas que não prometeu. Pior, nem sequer estão disponíveis para que o projecto seja reavaliado em função da visão da nova Câmara para a Cidade.
Na Iniciativa Liberal não somos contra a redução do trânsito na Baixa. Mas queremos que esse debate seja feito de uma forma séria. Que se designem as coisas como elas são, que se envolva a população numa verdadeira consulta pública e que se respeitem as Juntas de Freguesia e as suas competências.
Deputado da Iniciativa Liberal na Assembleia Municipal de Lisboa.