Que era um dos tesouros do turismo em Portugal já todos sabiam. Que guarda as primeiras memórias de veraneantes no país também; e que ainda hoje é conhecida como "o bidé das marquesas". Mas se a candidatura for apresentada (primeiro) pela câmara e aprovada (depois) pela UNESCO, a baía de São Martinho do Porto, no concelho de Alcobaça, pode tornar-se também Património Natural e Mundial da Humanidade..A ideia partiu de Rui Alexandre, deputado municipal eleito pelo PS, e foi aprovada - por unanimidade - pela Assembleia Municipal, no final do ano passado.."Eu já andava a pensar nisto há algum tempo, talvez de há um ano para cá. Julgo que seria um incentivo não apenas para o turismo regional como nacional",disse ao DN o autor da proposta. Na fundamentação que entregou à Assembleia Municipal, Rui Alexandre lembra que "Portugal, tal como todos os países membros da Convenção, tem a obrigação de inventariar, proteger, conservar e valorizar os bens culturais e naturais, existentes no seu território, de modo que os mesmos possam ser transmitidos às gerações futuras. É neste contexto que gostaríamos de ver a baía de São Martinho do Porto, baía natural em forma de vieira, de águas calmas e areias brancas e finas, classificada como Património Natural Mundial da Humanidade, da UNESCO"..Depois da unanimidade conseguida no palco político, a proposta está agora nas mãos da câmara. Paulo Inácio, que está a terminar o seu terceiro (e último) mandato enquanto presidente da autarquia, pelo PSD, foi breve na resposta ao DN: "É um assunto que está a ser trabalhado pela Câmara Municipal de Alcobaça mas que ainda está no seu início. Será oportunamente criada uma comissão científica para os devidos efeitos.".Mas Rui Alexandre - que acalenta a esperança de ser o candidato do PS à câmara, decisão que o partido ainda não tomou -, acautela na proposta procedimentos futuros: "Propomos que este processo de candidatura seja liderado pela autarquia de Alcobaça, mas que as necessárias comissões envolvam outros setores da vida local, regional e nacional indispensáveis ao sucesso da candidatura. E contando naturalmente com elementos do Partido Socialista.".Vista do alto, a baía de São Martinho do Porto faz lembrar um postal da Riviera francesa. A praia que tem pergaminhos desde há um século já não é o bidé das marquesas - como ficou conhecida nos meios de veraneio - mas guarda muita da traça desses tempos. Era porto de abrigo para a nobreza e a alta burguesia de Lisboa, desde que no final do século XIX os mais endinheirados foram ganhando o hábito de desfrutar do "ar da praia", como conta Ramalho Ortigão no livro As Praias de Portugal - Guia do Banhista e do Viajante..São Martinho vive, ainda hoje, os resquícios desse tempo: uma boa parte dos proprietários são famílias da classe média-alta de Lisboa, que se resguardam na pacatez da vila do bulício da cidade. A partir da marginal, percebe-se bem a razão de não abdicarem desse tesouro: o mar calmo, ideal para as crianças, meia dúzia de barcos a enfeitar a baía, barraquinhas alinhadas. É assim no verão, quando a vila vive apinhada. Chegado o outono, a terra volta a ser apenas dos menos de três mil habitantes que povoam aquela freguesia do concelho de Alcobaça, já no limite com as Caldas da Rainha..Se a candidatura avançar, a baía de São Martinho do Porto será o segundo local do concelho a figurar no património da UNESCO, juntando-se assim ao Mosteiro de Alcobaça, uma das primeiras fundações monásticas em território português, sob a alçada da Ordem de Cister.."Essa decisão de classificação cabe, em última instância, ao Comité do Património Mundial, criado pelo artigo 8.º da Convenção, que funciona junto da UNESCO", pode ler-se na proposta de Rui Alexandre. O proponente justifica que a articulação entre este comité e os países membros "opera de modo funcional e prático", lembrando a necessidade de serem criadas diversas comissões (uma comissão executiva e uma comissão científica), que tratarão da elaboração do projeto. Cada uma delas contará com a colaboração da Comissão Nacional da UNESCO, a funcionar no âmbito do Ministério dos Negócios Estrangeiros, bem como com a delegação permanente da UNESCO, em Paris, dirigida por Sampaio da Nóvoa, ex-candidato à Presidência da República, em 2016..A baía de São Martinho do Porto apresenta-se de forma elíptica, com cerca de 1800 por 400 metros, e três quilómetros de areal e barra com cerca de 200 metros de abertura. A concha (como é designada) tem cerca de 1200 metros de diâmetro em baixa-mar e a barra não ultrapassa os quatro metros de profundidade, embora a um quarto de légua para o exterior existam fundos de 40 metros. É ali que se apanham limos, as célebres algas vermelhas que estão atualmente a ser utilizadas para a indústria farmacêutica e a cosmética.