Bach revisto à maneira do pós-Romantismo
Os Two Pianists, duo constituído pelo português Luís Magalhães (natural de Famalicão) e pela sul-africana Nina Schumann apresenta-se na noite de quarta-feira, dia 1, no Theatro Circo de Braga para um recital intitulado 'Recomposições e Cruzamentos', inserido no ciclo 'Lições de Piano' daquela sala.
Do programa desta noite consta apenas uma obra, mas ela ocupa por si só quase 80 minutos! Trata-se da versão para dois pianos realizada em 1883 pelo compositor lichtensteiniano Josef Rheinberger (1839-1901), conhecido sobretudo pelas suas composições de música sacra e para órgão, das 'Variações Goldberg', de Johann Sebastian Bach (1685-1750), uma obra de 1741 considerada como uma das maiores criações jamais escritas para a música de tecla e um dos cumes absolutos da literatura escrita na forma-variação.
Mas o trabalho de Rheinberger, um compositor conservador dentro da estética romântica, seria revisto três décadas mais tarde por outro conservador pós-romântico, o alemão Max Reger (1873-1916), mas com outro "olho" para as questões ligadas à prática performativa e à receção na sua época da música de Bach. Essa revisão de Reger da versão de Rheinberger seria editada em 1915 e é essa versão que os duos de pianistas geralmente tocam e gravam, por exemplo, o conhecido duo Tal/Groethuysen.
O duo Magalhães/Schumann já gravou esta obra em 2012, tendo o disco sido editado no ano seguinte na editora próprio do duo, a TwoPianists Records.
A versão de Rheinberger é um empreendimento tipicamente romântico pela magnitude das liberdades que toma em relação ao original (de Bach são mais conhecidas as transcrições "românticas" para piano efectuadas por Ferruccio Busoni), transformando grandemente o original (que, não esqueçamos, se destina a um cravo de dois manuais) ao nível das texturas, melodias, harmonias, linhas contrapontísticas, etc. O trabalho de Reger prendeu-se principalmente com marcações/correções ao nível das dinâmicas, do fraseio e da articulação, com o propósito de aproximar o som da obra daquilo que era o seu entendimento do que seria o som de Bach no piano. O engraçado nesta obra é que ela convida os próprios intérpretes a, em cada vez, reeditarem em certa medida o trabalho efectuado por Reger, mas, naturalmente, com os olhos próprios do século exacto que medeia entre o nosso presente e a data da edição da revisão de Reger. Pelo que também será interessante ouvir em que medida as decisões interpretativas de Nina Schumann e Luís Magalhães emprestaram um perfil distinto - bi-pessoal, dir-se-ia - à obra.