Em julho deste ano, Patrícia Rebelo foi despejada da casa em Chelas, Lisboa, que ocupava ilegalmente há cerca de dez meses. Não é caso único. Segundo a associação Habita, há centenas de famílias a ocupar casas vazias na capital..Nem os dois empregos, as 17 horas de trabalho e os 900 euros líquidos para sustentar um filho de 16 anos e uma mãe doente chegavam para garantir uma renda na cidade. Depois de despejada, Patrícia procurou ajuda em entidades superiores, como a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, que lhe ofereceu alojamento temporário numa pensão. Mas há cada vez menos soluções para estes casos. O volume do turismo e a especulação imobiliária têm tornado mais complexa a procura por quartos ou casas livres que servem a resposta urgente da organização..Os casos urgentes são aqueles que "por acontecimento súbito e motivos diversos" se confrontam com a "ausência de alojamento". E o número de situações deste género que chegam até à Santa Casa "tem vindo a crescer exponencialmente", escreve o gabinete de comunicação da instituição, em resposta ao DN. São, por exemplo, famílias como a de Patrícia Rebelo, ocupantes de fogos vazios na cidade, mas também refugiados em Portugal..Em 2018, mais de duas mil pessoas "sem condições económicas para aceder a um outro alojamento condigno ou sem rede de suporte familiar e social" procuraram e receberam o apoio habitacional da Santa Casa, em Lisboa. Nestes casos, a organização procura responder através da concessão de um subsídio para alojamento em quartos, pensões e casas, para onde são encaminhados temporariamente, até que encontrem uma solução..Mas revela sentir cada vez mais dificuldades em encontrar uma solução devido ao volume do turismo na cidade, situação que se tem "agravado exponencialmente nos últimos cinco anos". E ainda que, até agora, tenham sido sempre encontradas respostas para estas situações de urgência, através de "recursos familiares e da comunidade", os próximos tempos avizinham-se mais difíceis..Embora Lisboa seja das cidades do país "com a maior proporção de fogos de habitação municipal no total de alojamentos familiares clássicos", ainda "persistem necessidades" ao nível habitacional. A resposta, diz a Santa Casa, deve passar por "investimentos das políticas públicas nesta área". "É de louvar o que foi feito ao nível da Nova Geração de Políticas de Habitação que vem permitir aumentar em quantidade e qualidade a oferta de habitação pública", mas ainda não é suficiente..Por isso, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa está trabalhar numa solução que garanta a sua autonomia sobre este problema. "Na sequência desta preocupação, já equacionámos a construção de um hotel social", mas para a qual ainda não há um plano ou data. Até lá, lembram, irão promover eventos através dos quais possam nascer ideias e financiamento para soluções. "Iremos promover, nos próximos dias 2 e 3 de dezembro, a iniciativa Hackathon 100% Colaborativo, evento destinado a todos os colaboradores dos diferentes serviços e departamentos da SCML, sendo um dos desafios encontrar novas respostas habitacionais para as famílias que se encontram em alojamento de recurso ou em situação habitacional insegura", escreve a organização.."Centenas" ocupam casas vazias.Contam-se já "centenas" de famílias que ocupam casas vazias em Lisboa por não encontrarem alternativa, garante Rita Silva, dirigente da Habita, embora os números oficiais não sejam conhecidos. Questionado pelo DN, o gabinete da vereadora da Habitação Paula Marques não revela quantas casas em Lisboa estão atualmente a ser ocupadas de forma abusiva. Garantem apenas que "a taxa é muito baixa relativamente às mais de 25 mil casas que existem" na cidade..O que se sabe é que são "sobretudo mulheres, com filhos, sem apoio dos atuais ou ex-companheiros, com baixos salários", garante Rita Silva. São pessoas que, de repente, se veem em situações "muito aflitivas" e ocupam casas abandonadas. Um pouco por todos os bairros lisboetas, da Ajuda a Chelas, "a ocupação decorre de um desespero de quem não consegue encontrar mais nada" a preços válidos para os seus rendimentos..Lisboa continua uma das cidades da Europa onde a disparidade entre o rendimento disponível e os valores das rendas está a aumentar de ano para ano. A conclusão é de um estudo divulgado neste ano pelo Deutsche Bank. Segundo o relatório, o valor dos arrendamentos aumentou 14% desde 2014. E se no início deste período um T2 custava 645 euros, hoje chega aos 917.