Aulas no terreno, de Mafra às águas dos Açores
Já passa da uma da tarde. A maioria dos alunos esteve a fazer exames nacionais e ainda ninguém almoçou. Mesmo assim, grande parte da turma da professora Rita Santos, no Colégio Miramar, faz questão de marcar presença e acompanhar a pare passo a entrevista com a vencedora da edição de junho do prémio DN Professor do Ano.
Os alunos, responsáveis pela nomeação desta professora de Biologia e Geologia, não sentem dificuldades para explicar os motivos para acreditarem que merece tudo. Até ganhar o prémio final, quem sabe?
"A professora Rita é amiga, está sempre disponível para ajudar os outros, tanto nos conteúdos da disciplina como com problemas pessoais", conta Luís Policarpo. "É uma pessoa que marca. Se não é a melhor professora que já tive é uma das melhores."
"É uma excelente profissional e consegue chegar a nós de uma maneira que os outros professores não conseguem", concorda Daniela Dias. "Dá muito de si, de uma forma profissional - não mistura as coisas e isso revela-se nos nossos resultados: quando temos dificuldades em algum conteúdo, dá mil e uma voltas até percebermos."
"Consegue chegar a nós de várias maneiras, quer a nível afetivo quer intelectual", acrescenta Maria, que confessa que começou a alimentar o sonho de um dia estudar neurociências desde que viu o tema abordado, num manual do 10.º ano, e decidiu fazer mais perguntas à professora: "Foi uma influência muito positiva."
Num colégio particular, mas com contrato de associação com o Ministério da Educação e Ciência e ensino gratuito, a realidade não é muito diferente de qualquer escola pública: "Temos alunos de todos os estratos sociais, incluindo alunos de famílias com grandes dificuldades", conta Rita Santos ao DN.
Ainda assim, há um aspeto que não é tão comum nas escolas públicas: a continuidade. Rita Santos acompanha alguns daqueles alunos desde o 8.º ano e não tem dúvidas de que o percurso comum ajudou a "criar os laços"visíveis que partilha com os alunos.
Mas há um aspeto talvez ainda mais importante, que pesou decisivamente na escolha do júri do DN: o gosto pelo trabalho de campo, fora dos portões da escola. "O facto de fazermos visitas de estudo permite-nos não só ter conhecimentos que vão para além da matéria mas também perceber melhor o que aprendemos na sala de aula", conta João Vieira, o único para já a assumir a intenção de seguir os passos da professora. "É diferente ver estando no local e isso também nos fez estreitar a ligação com a professora", refere.
Com uma escola localizada numa zona rural da Lagoa, Mafra, o apelo pelo exterior é natural. Desde pequenas incursões pelas imediações a visitas "à praia dos surfistas, Ribeira de Ilhas, ou o Penedo do Lexim - que tem prismas basálticos que só existem aqui, na Madeira, na Irlanda e pouco mais", a professora não sente dificuldades para encontrar na região vários pontos de interesse para os seus alunos.
São sempre incursões bem acolhidas pelos alunos. Mas estão longe de ser (apenas) passeios de lazer. No final de cada saída, a professora faz questão de pedir aos seus estudantes um relatório completo das observações feitas no terreno.
Em 20011/12, a professora pôs os alunos a participar com os seus trabalhos no projeto "Rocha Amiga", promovido pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Um dos trabalhos, precisamente sobre o basalto do Penedo do Lexim, esteve entre os finalistas de um prémio.
Mas as imediações da escola não chegam. Este ano, após meses de preparativos que incluíram a angariação de fundos através de vendas na escola, Rita Santos concretizou o sonho de levar os alunos uma semana aos Açores, à ilha de São Miguel, que classifica como um "laboratório de Ciências da Terra".
"Espetacular", resumem os estudantes. "O que mais gostei foi o Parque Terra Nostra", conta Andreia. "Conseguimos ver muitas espécies, como os fetos polipódios, que tínhamos estudado em aula mas não fazíamos ideia de como eram."
O ponto alto, no mesmo parque, foio mergulho numa piscina com água a40 graus. Mas não faltaram os pontos de interesse: A Lagoa do Fogo e a Lagoa das Sete Cidades, a fábrica de chá Gorreana, a Caldeira Velha e até uma viagem de quatro horas para ver cetáceos: "Vimos uma baleia por pouquíssimo tempo, mas a experiência foi interessante", conta a professora. E no final, claro está, o trabalho de casa: "Um relatório pormenorizado com todas as estações visitadas e pontos de interesse ao nível da Biologia e da Geologia."