Atentados, eleições, incêndio e brexit: o mês 'horribilis' de May
No final de abril havia sondagens no Reino Unido que diziam que a primeira-ministra Theresa May era mais popular do que Margaret Thatcher ou Tony Blair nos seus melhores anos. Mas uma sucessão de eventos, entre eles uma campanha desastrosa marcada por dois atentados, alterou rapidamente a situação, com a última pesquisa do YouGov a revelar que 63% dos inquiridos têm uma opinião desfavorável da primeira-ministra (29% de favorável). Uma sondagem que não tem ainda em conta a tragédia do incêndio na torre Grenfell, onde se estima que 59 pessoas tenham morrido, havendo quem critique May pela falta de empatia e pela resposta desadequada do governo. Um verdadeiro mensis horribilis (mês horrível) para May, diz a Sky News.
Sobreviventes e residentes na torre Grenfell, que ardeu quase completamente na noite de terça para quarta-feira, assim como voluntários que estão a prestar auxílio aos desalojados e líderes comunitários foram ontem recebidos pela primeira-ministra em Downing Street, durante mais de duas horas. Antes, tinha-se reunido com vários responsáveis, entre os quais o presidente da Câmara de Londres, Sadiq Khan.
Num comunicado, May admitiu que "o apoio no terreno para as famílias que precisavam de ajuda ou informações básicas nas primeiras horas depois deste desastre terrível não foi suficientemente bom". Na véspera, já tinha anunciado um fundo de cinco milhões de libras (5,7 milhões de euros) para auxiliar os sobreviventes, reiterando que todos serão realojados no prazo de três semanas. May ordenou ainda um inquérito público ao incêndio, que reportará diretamente a ela. "Como primeira-ministra, serei responsável pela implementação do que for apurado", indicou.
Após as críticas à resposta do governo, com May a visitar primeiro os bombeiros e só no dia seguinte os sobreviventes, a primeira-ministra teve de ser escoltada para fora do encontro com eles numa igreja, com manifestantes a chamarem--lhe "cobarde". À noite, após uma entrevista à BBC, voltaram as críticas. Questionada repetidamente sobre se tinha feito uma leitura errada da situação e do impacto junto dos cidadãos, May não respondeu diretamente, dizendo que o seu foco estava no apoio às vítimas. "No que estou agora totalmente focada é em garantir que temos o apoio no terreno", disse a primeira-ministra, com muitos telespectadores a dizerem depois nas redes sociais que ela era "desumana" e "fria". O número dois de May, Damian Green, veio em defesa da primeira-ministra, dizendo que ela está "perturbada" com o que aconteceu.
As críticas após o incêndio na torre Grenfell são apenas o último desaire para May, no que a Sky News apelidou de "mensis horribilis" para a primeira-ministra. No espaço de um mês, May teve de lidar com dois atentados terroristas (em Manchester e Londres) e as acusações de que enquanto ministra do Interior tinha cortado no número de polícias. Depois, perdeu a maioria parlamentar que tinha (numas eleições que ela própria antecipou acreditando poder aumentar a sua vantagem), tendo agora de negociar um acordo de governo com os unionistas da Irlanda do Norte - ontem, milhares de pessoas protestaram no centro de Londres contra o eventual acordo. Finalmente, a partir da próxima semana, terá de enfrentar o início das negociações sobre o brexit com Bruxelas, partindo de uma posição de aparente fraqueza.
Numa rara mensagem na data em que se assinala oficialmente o seu aniversário (e que costuma ser de festa no Reino Unido), a rainha Isabel II disse que "em meses recentes o país foi testemunha de uma sucessão de tragédias terríveis". Mas, lembrou, "unidos na nossa tristeza estamos igualmente determinados em apoiar todos os que estão a reconstruir as suas vidas tão horrivelmente afetadas por danos e perdas". Antes da parada de aniversário, a rainha, que na sexta-feira esteve com sobreviventes da torre Grenfell, observou um minuto de silêncio em homenagem às vítimas.
Num novo balanço, o comandante Stuart Cundy, da Polícia Metropolitana, revelou que há 58 pessoas desaparecidas, presumivelmente mortas. "Espero que não aconteça, mas este número pode aumentar", disse, lembrando que podiam estar no local mais pessoas do que as até agora identificadas. Entre as 58 alegadas vítimas estão as 30 pessoas anteriormente dadas como mortas, tendo sido recuperados apenas 16 cadáveres. Outras 19 pessoas estão ainda hospitalizadas, dez em estado crítico.